Nesta semana, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) retomou a realização de sessões de julgamento virtuais para prolação de resultados de votações antecipadas. Se em todo o país o que chamou a atenção foi a observação da liturgia com relação às vestimentas , na Bahia, o que se observou foi uma sessão da 1ª Turma da 2ª Câmara Criminal marcada por uma discussão entre dois desembargadores diante de uma possível nulidade processual.
A sessão foi realizada na manhã da última quinta-feira (16), através de um sistema de videoconferência. Logo na abertura dos trabalhos, o desembargador Júlio Travessa afirmou que, por força da Constituição Federal, pela maior norma do ordenamento jurídico do país, os julgamentos de processo criminal, sem a devida publicidade, sem ampla defesa e sem o contraditório podem incorrer em nulidades por não constar a intimação do advogado. A medida seria, segundo ele, para garantir aos causídicos o direito de pedir ou não um julgamento presencial, com sustentação oral. Desta forma, por não haver intimação dos advogados de processos julgados fora da pauta publicada previamente, pode se tornar nulo o julgamento. A explanação do desembargador ocorreu em um pedido de questão de ordem, para que tais previsões legais fossem observadas.
Assim que se manifestou, a desembargadora Soraya Moradillo, que presidiu a sessão, questionou se o desembargador teria mais alguma declaração a fazer. Este, por sua vez, declarou que só faria manifestação a depender da resposta dos pares, por “não ter bola de cristal para prever o futuro”. A magistrada asseverou que o decreto Judiciário que disciplina a realização de sessões por videoconferência estabelece que os julgamentos serão realizados com votação antecipada, e que não prevê discussões jurídicas e manifestação de partes interessadas.
A desembargadora ainda declarou que os processos com pedido de vista e do sistema SAJ serão julgados no dia 7 de maio e deverão ser julgados antecipadamente, ainda que o voto vista solicitado pelo desembargador Travessa não esteja lançado. Segundo Soraya, não é preciso intimar os advogados em caso de julgamento de Habeas Corpus por ser uma ação sumaríssima, que requer celeridade, e “não pode ficar a mercê de procedimentos burocráticos”. Salientou que o regimento do TJ prevê que o relator poderá ou não colocar os HCs em julgamento, amparando ainda a declaração em uma Súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) e em uma consulta ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de que não há nulidades nestes casos. Sinalizou que a medida não traz prejuízos para ninguém, sendo, ao contrário, uma medida que beneficia os julgamentos, diante da extensa pauta de processos.
A desembargadora Ivete Caldas salientou que, no caso, a turma não estava julgando recursos, e sim habeas corpus, e que pautas deste tipo de processo não são publicadas previamente diante da necessidade de celeridade. O pedido de sustentação, segundo alertou, não depende de publicação antecipada em casos de habeas corpus. Reafirmou que o presidente da turma tem o direito de pautar os processos para julgamento e que o desembargador relator tem o direito de pedir retirada de pauta, como fez o desembargado Júlio Travessa na sessão. O desembargador Jefferson Alves concordou com o posicionamento de Ivete Caldas, assim como o juiz substituto do 2º Grau Antônio Carlos Símaro. A desembargadora Soraya Moradillo sinalizou que a situação que o TJ-BA atravessa é sui generis, diante do impedimento da realização das sessões físicas, e disse que o desembargador Travessa pediu vista de alguns habeas corpus que foram concedidos para não prejudicar os pacientes.
Logo depois das manifestações, na sessão que durou pouco mais de 30 minutos, a procuradora de Justiça, Eny Magalhães, reclamou que sua presença não foi mencionada na abertura dos trabalhos. Soraya afirmou que todos os desembargadores já a estavam vendo na tela, onde constava informação que ela era representante do Ministério Público da Bahia (MP-BA). A procuradora afirmou que “seria interessante” que ela fosse cumprimentada em cada início de sessão, já que estão começando o trabalho em uma “nova etapa”. “A senhora cumprimentou os desembargadores e eu fiquei aguardando”, declarou. Soraya disse que cumprimentou todos como “colegas”, pois vê todos como colegas, independentes se são da magistratura ou do Ministério Público, e deu as boas-vindas já no término do trabalho.
Já nos minutos finais da sessão, a presidente da turma e o desembargador Júlio Travessa começaram a discutir. Travessa tentou dizer que, quando Soraya o admoestava sobre os processos com pedido de vista, que atua com celeridade, e que seu acervo conta com poucas ações pendente de julgamento. A desembargadora chegou a cassar a palavra de Travessa, cortando o áudio do microfone e encerrando abruptamente a sessão. Confira a discussão no vídeo abaixo:
Nesta semana, um grupo de mais de 100 advogados se manifestou contra as sessões virtuais no STF por não serem públicas e não contarem com a participação de advogados. Segundo eles, a tecnologia deve ser utilizada a favor da celeridade processual, mas não pode ignorar os princípios da ampla defesa, do devido processo legal, do contraditório e da publicidade. “Um julgamento que não pode ser acompanhado pelo advogado enquanto se realiza; que não admite a interferência do advogado, seja para realizar sustentação oral ao vivo, seja para pedir a palavra para realizar esclarecimentos sobre matéria de fato, certamente não atende, data venia, aos princípios citados, nem prestigia o artigo 133 mencionado”, diz a carta.(Bahia Notícias)