E se toda história de uma vida de lutas e conquistas fosse relegada a um amontoado de papéis esquecidos por décadas? Essa poderia ser mais uma história sobre o descaso com o passado, mas vai além. É uma história sobre como por anos, o pioneirismo da luta por independência do Brasil no recôncavo da Bahia foi esquecido.
Neste domingo, 25 de junho completam 201 anos do anúncio da consulta feita junto ao povo de Cachoeira que concordava que se proclamasse dom Pedro de Alcântara como regente constitucional e defensor perpétuo do Brasil.
A decisão popular é um marco histórico nas lutas por independência, oficializada em 7 de setembro daquele ano, mas que na Bahia se estenderia até 2 de julho de 1823.
O documento histórico que atesta a decisão pioneira na luta por liberdade era um entre tantos outros esquecidos por anos, até pouco tempo, quando foi recuperado pelo Arquivo Público da cidade, que tem feito o mesmo com outros documentos históricos.
O acervo cachoeirano passou a ser reunido em 1960, pelo antropólogos Pedro Agostinho, Maria de Lourdes Ribeiro e Roberto Pinto, no entanto, por volta de 1965, com uma mudança de gestão municipal, o arquivo foi deixado de lado.
Em 1992, ele foi legalmente criado, mas somente nos últimos anos passou a ter um trabalho efetivo de recuperação de documentação.
“Praticamente toda documentação histórica dos 10 mil quilômetros quadrados do recôncavo da Bahia, com sua zona açucareira e fumageira, está aqui em Cachoeira. Nossas buscas encontraram documentos de 1790. Estamos em processo de recuperação, e digitalização desses documentos”, conta Cacau Nascimento, um dos historiadores contratados para cuidar do acervo.
Localizado atualmente em uma casa pertencente ao Iphan, na Rua Benjamim Constant, antiga ladeira dos Carmelitas, o arquivo tem sido fonte para pesquisas de historiadores e acadêmicos de todo país e até de outros países
“Estamos falando de documentos históricos que não tinha a menor importância. Estou falando de preservação da memória e que a gente precisa dar esse real valor. Como você vai apresentar a nossa história a gerações futuras? Como algum pesquisador poderá ter acesso a esse acervo se você hoje não valorizou e deixou se perdendo no tempo? Então isso que estamos fazendo hoje é importante porque é estar reconhecendo, valorizando e preservando sobre tudo da nossa história”, disse ao g1 a prefeita da cidade, Eliana Gonzaga.
Capital da Bahia, pioneira do Brasil
À primeira vista, Cachoeira engana. Ela parece mais uma entre tantas cidades baianas construída às margens de imponentes rios. Talvez tenha sido esse ar interiorano, ainda que pouco bucólico, tenha enganado os portugueses naquele começo de século 19.
Como capital, Salvador colhe os louros do papel determinante na Independência do Brasil na Bahia, mas o fato é que sem o espírito revoltoso do povo cachoeirano não existiria a sonhada independência do Brasil. E esse orgulho é visto nas ruas, nas sacadas, no boteco à margem do Paraguaçu. Cachoeira sabe do seu papel grandioso e não tem vergonha de mostrar.
“Cachoeira é o berço da nossa independência porque tudo se iniciou aqui a partir da data magna que é 25 de junho, com o inicio das primeiras lutas. As primeiras batalhas foram foram iniciadas aqui em solo cachoeirano”, destaca a prefeita da cidade.
Foi quase três meses antes do grito do Ypiranga, que uma reunidos na Câmara Municipal de Cachoeira, políticos locais anunciaram que a consulta popular feita junto ao povo da cidade decidiu que dom Pedro de Alcântara seria regente constitucional e defensor perpétuo do Brasil.
Nem mesmo uma embarcação portuguesa às margens do Rio Paraguaçu foi suficiente para aterrorizar o povo cachoeirano que instituiu uma Junta Conciliatória e de Defesa para o governo da cidade.
Após a decisão, a tomada da embarcação foi a primeira batalha e durou três dias, até 28 de junho. Cachoeira mostrava que a Bahia estava pronta para ser território brasileiro, livre do domínio português.
Na Bahia, uma lei estadual de 2007, estabelece que em 25 de junho a sede do governo seja transferida para Cachoeira por conta do marco das lutas. O projeto do então governador Jaques Wagner transfere toda estrutura do governo para a cidade.
Neste ano, o governador Jerônimo Rodrigues reunirá todo secretariado na cidade para uma série de eventos, ações e serviços, nas áreas da cultura e educação. Neste ano, o governo baiano prepara comemorações especiais pelos 200 anos da Independência do Brasil na Bahia, celebrada no 2 de Julho. (G1)