Divórcio pela Lei Maria da Penha: Entenda quem pode pedir e como funciona

Especialista esclarece diferenças entre trâmites utilizados nos tipos de divórcio realizados no Brasil

Com o objetivo de proteger e zelar pela vida das mulheres vítimas de violência doméstica, a Lei Maria da Penha foi criada no Brasil em 2006. Desde então, diversas medidas judiciais, que buscam fortalecer o sistema de proteção às mulheres, foram instauradas no país. Dentre elas, está uma que poucos conhecem: o divórcio, separação ou dissolução de união estável pela Vara de Violência Doméstica com base na Lei Maria da Penha.

O divórcio surgiu no Brasil em 1977, após uma emenda à Constituição. Antes disso, os casamentos no país eram indissolúveis em vida. Exatamente 42 anos depois, em 2019, os processos de divórcio e dissolução de união estável passaram a poder ser feitos através da Lei Maria da Penha, opção solicitada pela apresentadora Ana Hickmann na última semana, após prestar um Boletim de Ocorrência contra o marido Alexandre Correa.

Mais agilidade 

De acordo com a advogada especialista em Direito Família e Sucessões, Fernanda Barretto, o processo de divórcio pode ser feito pela via judicial ou extrajudicial, sendo que o último precisa haver acordo entre o casal. Há ainda o divórcio com base na lei Maria da Penha, esse sempre de maneira judicial.

“Pelo cartório [extrajudicial], o divórcio tem que ser consensual e não pode, em regra, ter filhos menores. Já o divórcio judicial, acontece na Justiça, em regra, quando existem divergências entre o ex-casal, ou filhos que não sejam maiores de idade, pois a guarda e os alimentos dos filhos precisam ser regulados judicialmente. Então, não pode ser em cartório, pois não tem juiz. Às vezes, as partes estão em consenso com tudo, mas têm filhos menores de idade. Dessa forma, precisa ser com base na Justiça. Já o litigioso é quando essas divergências, que geralmente envolvem guarda, convivência, alimentos ou partilha, existem. E, mesmo que uma parte não queira, o divórcio vai ser decretado através da Justiça, basta apenas uma parte não querer mais estar casada”, explicou a especialista, em entrevista ao Metro1. 

Fernanda Barreto ressaltou que o divórcio, por meio da Lei Maria da Penha, tem como principal benefício a agilidade. 

“A mulher vítima de violência doméstica tem a opção de propor ação de divórcio no próprio juizado de violência doméstica e familiar. Ele só pode ser requisitado pela mulher vítima de violência. Em geral, essas vítimas já estão pedindo algo no juizado de violência, como medidas protetivas, e aí já pode também propor o divórcio, embora as duas coisas não estejam atreladas. A vantagem é justamente ser mais célere, sem precisar encaminhar a mulher para uma [vara] especializada de família. O objetivo da lei é mais uma garantia para que essa mulher possa resolver sua questão jurídica mais rápido, possa dissolver esse vínculo com o agressor de forma mais eficaz, porque infelizmente o processo judiciário no Brasil costuma funcionar de maneira lenta”, esclareceu. 

O caso Ana Hickmann

A especialista explicou ainda a decisão do juiz da 1ª Vara Criminal e de Violência Doméstica e Familiar de São Paulo de negar o pedido de divórcio de Ana Hickmann com base na Lei Maria da Penha. De acordo com Fernanda Barreto, segundo o que foi divulgado, a decisão se deve a controvérsias em relação ao patrimônio do casal.  

“O parágrafo primeiro do artigo 14 – letra A, da Lei Maria da Penha, é claro em dizer que os juizados especializados em violência doméstica contra a mulher não têm competência para decidir partilha de bens […] No caso Ana Hickmann, foi indeferido pela Maria da Penha, o juiz disse que não era competente e mandou remeter à Vara de Família, com o entendimento de que o caso tem uma complexidade grande, sobretudo, porque envolve uma questão patrimonial que não é simples, com acusação de golpe e fraude”, pontuou. 

A recusa do pedido de divórcio, com base na Lei Maria da Penha, não significa que o agressor deixará de responder por violência doméstica, nem a revogação de medidas protetivas. A decisão judicial se refere apenas ao divórcio. 

Mudanças na Maria da Penha

A alteração feita na legislação em 2019 prevê outras garantias de direitos para mulheres, como medida protetiva para filhos dos agressores e auxílio durante a denúncia nas delegacias. 

Confira abaixo:

  • O delegado de polícia deve explicar à vítima de violência doméstica todos esses direitos e orientar sobre como acessá-los, o que consta ter sido feito no caso da apresentadora Ana Hickmann; 
  • O filho tem direito à medida protetiva e afastamento de pais agressores, caso seja solicitado; 
  • Assistência judiciária para que a vítima possa se desvincular formalmente do agressor através de ação judicial própria; 
  • Se o agressor não for afastado da vítima, fica determinado que uma pessoa pode intermediar as visitas entre o agressor e o filho, a fim de impedir o contato entre a vítima e o agressor.

Canais de denúncia

Para casos emergenciais, a polícia pode ser acionada pelo 190. Em situações não emergenciais, ou seja, não está havendo uma agressão no momento, a ligação pode ser feita para o 180, ou para o Disque 100. Além da ligação, as denúncias também podem ser feitas através do aplicativo Telegram – digite na busca “DireitosHumanosBrasil” e mande mensagem para a equipe da Central de Atendimento à Mulher.

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