É comum imaginar que ao comprar ou vender um veículo a pessoa possa ser vítima de um golpe, afinal nunca se sabe quem está do outro lado da tela. Mas ao ir à uma concessionária, a última coisa que se passa na cabeça é que naquele local você pode ser lesado. Mas foi isso que aconteceu com pelo menos seis pessoas que fizeram negócios na Motopema, localizada na Avenida Heitor Dias, na região de Brotas, em Salvador.
O professor Érico Castro foi uma dessas vítimas. Ele já era cliente antigo da loja e, ao levar sua motocicleta, modelo CB 500, ano 2020, para fazer uma revisão, em agosto desse ano, foi convencido por uma funcionária, de prenome Camila, a levar para casa a versão mais recente do veículo, ano 2023, pagando uma diferença de R$ 8.690. E assim ele fez, dividindo o valor em quatro vezes. As parcelas já foram quitadas, mas a motocicleta, que deveria chegar em 45 dias, nunca foi enviada e nem será.
A descoberta do golpe veio após diversas idas à concessionária, com questionamentos sobre os prazos dados, que sempre foram respondidos com desculpas plausíveis, a exemplo da demora na confecção das motocicletas, por causa da pandemia (as montadoras ficaram fechadas por um tempo, depois sofreram com a falta de insumos e posteriormente com o aumento de demanda no setor, provocando um fila de espera).
“Nas últimas semanas eu insisti indo à loja quase todos os dias. Não conseguia falar com a Camila, tentava falar com a gerência, mas não conseguia. Até quando chegou no dia 20 e um funcionário, já com pena de mim, disse que eles estavam ‘tendo um problema sério com Camila’, mas que era uma situação que estava sendo tratada em sigilo’, foi então que imaginei o que estava acontecendo e disse que só sairia de lá quando alguém me atendesse”, explicou Erico.
Foi então que o gerente apareceu e disse: “Eita, foi com você?”. Nesse momento, ele olhou o sistema e verificou que a moto nunca foi pedida. Entretanto, o veículo que era dele e ficou na concessionária já havia sido vendido para uma terceira pessoa há meses. O prejuízo, somando-se o valor do veículo e as parcelas pagas, giram em torno de R$ 50 mil.
Quem viveu uma situação parecida foi o cliente do advogado Leonardo Rodrigues. Ele vendeu uma motocicleta nesta mesma concessionária com a mesma vendedora, que acordou um pagamento de R$ 9 mil pelo veículo, que deveria ser feito em até 72 horas, mas já se passaram 15 dias e o depósito não foi feito, entretanto, a motocicleta já tem um novo dono. Ao ir à concessionária, foi informado do mesmo problema com a vendedora.
Tanto Erico, quanto o cliente de Leonardo, questionaram sobre o seu respectivo prejuízo junto à concessionária, mas a gerência e o setor jurídico da loja apenas os orientaram a registrar um Boletim de Ocorrência contra a funcionária na 6ª Delegacia Territorial (DT/Brotas), pois eles seriam tão vítimas quanto os clientes e não tinham responsabilidade de arcar com o valor ou bem perdido.
Ao BNews, o delegado Marcelo Tannus, titular da 6ª DT/Brotas, afirmou que seis ou sete ocorrências dessa situação já foram registradas na unidade policial, sendo que a própria Motopema também deve ir, na próxima segunda-feira (02), registrar uma queixa contra a funcionária em questão. “Nós já ouvimos as vítimas e estamos investigando. Duas motocicletas já foram recuperadas até o momento”, contou Tannus.
Questionada, a empresa disse, em nota enviada a reportagem, que “a funcionária foi desligada” no momento em que tomaram ciência da situação e que eles estão trabalhando para que tudo seja resolvido o mais rápido possível. A Motopema também afirmou que os clientes estão sendo atendidos individualmente. Estamos “dando todo o apoio necessário para resolução e agindo com o rigor ético que nos é padrão, sempre em respeito às leis brasileiras e ao Código de Defesa do Consumidor”.
Entretanto, sobre o ressarcimento, a empresa faz questão de ressaltar que é “vítima tanto quanto as pessoas que foram lesadas pela suposta culpada”, afirmando ainda que após analisar caso a caso, “com muita atenção e com maior brevidade” deve “adotar as medidas cabíveis”.
Já que, segundo os denunciantes, a empresa alegou que não tem responsabilidade sobre esse prejuízo, a reportagem do BNews procurou Iratan Vilas Boas, que é advogado, especialista em direito do consumidor e diretor do Procon/BA para esclarecer a situação. Segundo ele, a empresa é sim responsável pelo prejuízo dos clientes, ainda que também tenham sido enganados, já que o fornecedor é responsável pelos atos dos seus prepostos.
“O código de defesa do consumidor fala, expressamente, que o fornecedor é responsável pelos atos dos seus prepostos. A empresa responde independentemente da existência de culpa pelos danos causados aos consumidores. Faz parte do risco do negócio. O consumidor é a parte vulnerável”, explicou Vilas Boas.
Ainda segundo o advogado, o consumidor que passar por esse tipo de situação deve procurar a Delegacia do Consumidor, o Procon ou o juizado especial, se o valor perdido for abaixo de 40 salários mínimos, ou a Justiça comum, caso o valor seja maior.
A Motopema também afirmou que está atendendo aos clientes que foram lesados na unidade de Brotas. “As pessoas que se sentirem lesadas devem procurar a loja, pois, conforme dito anteriormente, seguimos atendendo e buscando entender caso a caso, bem como tomando todas as atitudes que uma empresa séria e que segue a lei deve tomar”. (BNews)