Moradores da localidade rural da Pindoba no município de Laje, entraram em contato com a redação do Voz da Bahia para reclamar de um som alto na comunidade.
Segundo o residente, as pessoas que residem na região, não conseguiram dormir devido a poluição sonora. “Não conseguimos dormir. Temos pessoas de idade e crianças que moram aqui. Passamos a noite em claro. As autoridades precisam tomar providência”, desabafou o denunciante que não quis se identifica.
Ainda conforme relatos, há um bar nessa localidade que estaria servindo como ponto de drogas, mas não se sabe ao certo se o barulho era desse estabelecimento.
Causar poluição sonora é crime
A legislação brasileira fornece diversos instrumentos de prevenção à ocorrência da degradação ambiental em estudo, ferramentas integrantes da política urbana, tais como o plano diretor, o zoneamento, o estudo prévio de impacto ambiental, o estudo prévio de impacto de vizinhança, entre outros, previstos na Lei 10.257/01, o Estatuto da Cidade.
Há, ainda, meios processuais coletivos para a contenção das atividades poluidoras, tais como a Ação Popular e a Ação Civil Pública. Esta última podendo ser proposta também por órgãos destinados à defesa dos direitos difusos, tais como a Delegacia do Meio Ambiente (artigo 82, inciso III, do CDC c/c artigo 21 da LACP).
Contudo, nosso objetivo aqui é chamar a atenção para um dispositivo pouco utilizado na repressão a um ilícito penal tão devastador, tipo penal previsto na Lei dos Crimes Ambientais, Lei 9.605/98.
Como ultima ratio, o Direito Penal foi chamado a agir. Não tendo a efetividade necessária, as normas de política urbana e ações coletivas chamam a força da sanção penal para apoiá-las.
Assim, o legislador criou o artigo 54 da Lei 9.605/98 com a seguinte redação:
Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora: Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Como a maior parte dos tipos penais ambientais, trata-se de uma norma incompleta, norma penal em branco e possuidora de elementos normativos, necessitando então ser completada.
O tipo penal sob análise tem ainda a previsão de crime culposo no parágrafo primeiro, previsão do crime qualificado no parágrafo segundo e ampliação da aplicação do tipo na hipótese do parágrafo terceiro.
Contudo, nossa atenção fica restrita à previsão do caput.
Inicialmente, observamos que se trata de tipo penal de maior potencial ofensivo, dando ensejo à prisão em flagrante do criminoso.
A primeira parte da previsão do caput é a que nos interessa, sendo que exige, para a configuração do crime, que a poluição, de qualquer natureza, seja em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana.
A Lei 6.938/81 criou o CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente – e delegou a este o estabelecimento de critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente.
Por sua vez, o CONAMA, por meio da Resolução 01/90, estabeleceu os padrões que completam o tipo penal estudado.
O Conselho considera prejudiciais à saúde os ruídos com níveis superiores aos considerados aceitáveis pela norma NBR 10.152, da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT.
Logo, para enquadramento na norma penal, o agente público ou perito, de posse de um medidor de pressão sonora, comumente chamado de decibelímetro, medirá o nível de emissão de ruídos.
Estando superior aos níveis previstos na NBR 10.152, conforme local e horário, apresentará a situação à Autoridade Policial que, sendo situação flagrancial, deverá determinar a prisão daquele que causou a degradação ao meio ambiente.
Muito importante observar que o autor perderá os instrumentos da infração, mesmo que sejam objetos lícitos, conforme artigo 25 da Lei 9.605/98, diferentemente do disposto no artigo 91 do Código Penal. Por evidente, devem ser apreendidos.
Veja que pode ser um proprietário de um automóvel que esteja com o som em alto volume, uma igreja, uma indústria, uma festa familiar ou comercial. O responsável pela emissão de som acima da regulada deve ser preso, a pessoa jurídica indiciada e posteriormente condenada.
Os agentes públicos devem efetuar a prisão em qualquer hora e local, arrombando obstáculos, se necessário, pois a ação penal é pública incondicionada.
Já houve polêmica se o tipo penal seria aplicado à poluição sonora, o que não ocorre mais, haja vista jurisprudência existente e posição da doutrina, como a de Paulo Affonso Leme Machado, Luiz Flávio Gomes, Sílvio Maciel, Celso Antônio Pacheco Fiorillo, entre outros.
Contudo, percebe-se certo permissionismo das autoridades públicas no trato com este tipo de infração.
A repressão é impopular, tendo como entrave ainda a necessidade da prova técnica, a necessitar de aparelho de medição sonora.
Com isto, seja por falta de conhecimento, ou permissividade, ou ainda pela falta de estrutura no fornecimento aos agentes públicos do aparelho de medição, costuma-se aplicar ao fato a contravenção penal do artigo 42 da Lei de Contravenções Penais, um erro.
Esta é de aplicação subsidiária, quando os níveis de poluição não atingirem os indicados pelo CONAMA como prejudiciais à saúde humana.
Com um simples olhar sobre o tema, percebe-se que as dificuldades são facilmente contornadas. A nossa população merece um meio ambiente equilibrado e tem direito à saúde, conforme determinação constitucional.
Assim, se não forem utilizados de forma efetiva os instrumentos da política urbana, cabe às autoridades conhecer a norma ambiental e aplicá-la. A sociedade agradece.
Redação Voz da Bahia