Pé de valsa aos 87 anos, a professora aposentada Margarida Veiga não perde um baile com o marido, que é 24 anos mais novo. Ela e Álvaro de Macêdo, 63, funcionário aposentado dos Correios, se conheceram em um clube de dança há 19 anos, quando seu então marido estava internado no hospital.
Neste dia, uma amiga arrastou Margarida do sofrimento que estava vivendo com o homem com quem fora casada por 54 anos antes dele falecer.
“Foi na velhice que eu vivi a mocidade”, garante Margarida, que se junta ao número cada vez maior de mulheres que passam a experimentar uma nova juventude depois dos 60 anos. No seu caso, foi precisamente aos 68, quando aceitou o chamado da amiga. “Ela disse: ‘Você não vai ficar aí, não. Vai sair comigo pra dançar em Itapuã’. Aí botei uma bermuda azul e uma blusa cheia de margaridinhas”, lembra, sorrindo.
Proibida de dançar com outros homens desde pequena (só podia com o irmão), Margarida recebeu naquele 4 de novembro de 2001 um convite tentador. “Quando entrei no salão, Álvaro bateu o olho em mim, eu no dele, e perguntou: ‘Quer dançar comigo?’”, conta, com os olhos brilhando. “Aí pensei: ‘Ah, vou viver o que não vivi’. Brinquei bastante, descontei minha mocidade toda”, gargalha Margarida.
Farra
Naquela época, a professora pegava ônibus de sapato alto, “saltava no Teatro Castro Alves, pegava outro e saltava perto da festa”. “Tinha 68 anos. Foi tanta farra, de chegar 4h da manhã!”, lembra, rindo. Dez anos depois, já com 78 e namorando com Álvaro, frequentava clubes de dança com ele e “todas as meninas com 40, 50 anos” não acreditavam que ela tinha 78.
Quando chegou aos 80, Margarida pensou: “Vou me casar com esse cara”. E casou, de noiva e tudo. “Uma sobrinha minha me botou toda elegante, me botou mais jovem”, lembra a professora, que casou de novo com 81 anos. Hoje, ela e o marido dançam todos os domingos no Lugar Comum, bar da Avenida Sete, e não negam farra no meio da semana.
No dia do Bonfim, por exemplo, o espaço fez um baile para celebrar a data e o casal dançou até cansar. “Me sinto feliz e realizada”, resume Margarida, que não sente a idade que tem. Álvaro também não. Por isso, ela diz: “Continuo me sentindo jovem. A idade da gente está na cabeça, no modo que vivemos a vida”.
‘Velhinha gagá’
Outra que não sente a idade que tem é a também professora Sandra Ferraz, 66. Ela pensava que quando chegasse aos 60 anos “estaria velhinha gagá”, confessa rindo, até que percebeu que ultrapassar essa faixa etária não significava perder a juventude. “Me sinto com 40 anos. Trabalho, faço pilates, danço. Meus alunos até brincam comigo nas redes sociais, quando posto fotos: ‘professora, você está em todas, hein?’”, gargalha.
Já a médica Rita Carvalho, mulher de 60 anos que se casou no ano passado, prefere curtir a fase com o marido, que sempre diz: “Somos jovens, meu amor. Estamos fazendo nossa juventude”. Isso significa não ter “ciúmes bobos e inseguranças juvenis”. Médica de família e comunidade da Escola de Medicina e Saúde Pública (Bahiana), Rita diz que tem visto no ambulatório onde trabalha pessoas mais velhas com cada vez mais ânimo, vivendo e reformulando seus hábitos de vida.
“Não é que essas pessoas não se sintam velhas, mas elas reformulam esse momento da vida. Existe uma maneira de estar vivendo sem precisar se sentir velho. Se dança, se passeia, se namora. É uma nova juventude, uma juventude com experiência”, resume.
No caso de Margarida, que abre esse texto, a “mocidade”, como chama, foi uma forma de viver o que não podia quando era mais nova. Afinal, “a vida era diferente”. “Eu queria ser bailarina, andar pelo mundo, mas meus pais não deixavam porque ‘era feio’. Só podia uma festinha com os irmãos e voltar. Se separasse do marido, era condenada. Hoje, as mulheres evoluíram muito”, comemora a pé de valsa. “Mas estou achando elas muito ousadas”, finaliza, gargalhando.
(Correio)