Sony deixará de produzir PlayStation 4 no Brasil; preço do console cai no país

PlayStation 4 Foto: Patrick Fallon / Bloomberg
PlayStation 4 Foto: Patrick Fallon / Bloomberg

A última semana foi dura para os entusiastas dos jogos eletrônicos brasileiros. Quinta-feira passada, a Sony anunciou que o seu próximo videogame de última geração, o Playstation 4 (PS4), chegará ao país no dia 29 de novembro ao exorbitante preço de R$ 3.999 — lá fora, o console será vendido em seu lançamento, também em novembro, por US$ 400, cerca de R$ 871,36 (considerando-se o dólar a R$ 2,18). Alto mesmo para a expectativa dos fãs brasileiros de videogames, já acostumados a pagar preços mais elevados em jogos e consoles, o anúncio gerou revolta e piadas nas redes sociais.

Diante das reclamações, a Sony Brasil atribuiu o alto preço do produto à incidência de impostos e taxas de importação. Especialistas em tributação e no mercado de jogos eletrônicos reconhecem o peso da carga tributária brasileira, mas a justificativa não é suficiente para convencer os fãs de videogames.

A guerra da nova geração de consoles começa no mês que vem com o lançamento do PS4 e do Xbox One, da Microsoft. Nos EUA, os dois videogames serão concorrentes diretos não só tecnologicamente, com a promessa de agregar recursos on-line e qualidade gráfica inédita aos jogos, mas também no preço: o Xbox One será lançado em seu modelo mais básico pelo preço de  US$ 500, US$ 100 mais caro que o PS4. No entanto, após o anúncio da Sony, a guerra por aqui será desequilibrada, já que a Microsoft venderá o seu console por R$ 2,2 mil, quase metade do PS4, devido ao fato de fabricá-lo no país.

Para o usuário brasileiro que quiser o PS4, mas se recusar a pagar os R$ 3.999 cobrados pela Sony, resta a possibilidade de comprar o console em outro país ou mesmo importá-lo de sites estrangeiros. De acordo com levantamento do site G1, por exemplo, pelo preço cobrado no PS4 no Brasil é possível viajar para o Chile, se hospedar por três dias em um albergue, comprar o console (que por lá custa cerca de R$ 1.620) e voltar, gastando um total de R$ 2.700 com toda a viagem. Nas redes sociais, usuários sinalizam ainda a possibilidade dos consumidores fazerem a importação direta do site americano da Amazon, pagando o preço do console americano, todas as taxas devidas, e ainda assim pagar menos que o preço nacional. No momento, no entanto, o console encontra-se esgotado no site.

 Diante das críticas ao elevado preço do console, Mark Stanley, vice-presidente e gerente-geral da marca Playstation para a América Latina, divulgou hoje no blog oficial da empresa os fatores que estão por trás dos R$ 3.999 do PS4 brasileiro. De acordo com o executivo, a transferência do preço do console de fora para ser vendido aqui fica em R$ 858 (21,5% do preço de venda brasileiro). A isso somam-se os impostos e as taxas para trazer o produto ao país e que correspondem a R$ 2.524 (63% do valor de venda): taxa de importação, ICMS-ST e impostos de MVA, ICMS Estadual, Cofins, PIS e IPI. Há ainda as margens de lucro do varejista e do distribuidor (a Sony Brasil) e que corresponderiam a R$ 875  (25% do total). Assim, o preço final do console no país ficaria em R$ 4.257 e, de acordo com Stanley, a empresa ainda “devolveria para o negócio” R$ 258 (6,5% do produto), tendo prejuízo em sua venda para fechá-lo ao preço de R$ 3.999.

“Queremos enfatizar que não é de interesse da Sony Computer Entertainment America vender o PS4 com um alto preço de varejo, uma vez que não é bom para os nossos consumidores, e não é bom para a marca PlayStation”, afirmou Stanley no post em que explica o preço do Playstation.

Em entrevista ao jornal “Valor Econômico”, o executivo ainda declarou que a única alternativa da empresa para um preço melhor do console seria a sua fabricação local, já que aumentar o nível de subsídio “não seria uma opção sustentável a longo prazo”. No entanto, ele não soube precisar quanto tempo pode demorar que a produção nacional do PS4 seja iniciada, nem quanto o seu valor pode cair. Hoje, o console é fabricado somente na China.

Após analisar as declarações do executivo da Sony, a advogada tributarista Alice Gontijo, sócia do escritório Sacha Calmon-Misabel Derzi Consultores e Advogados, explica que a satisfação dada pela empresa é coerente e que, de fato, o preço do console é elevado devido à grande carga tributária nacional que incide sobre ele, em mais de uma etapa da operação e em cascata (ou seja, sobre outros tributos). 
 

— À primeira vista, o preço do console pode parecer elevado. E de fato é. Mas há uma justificativa para isso, que é o excesso de tributos para trazer o console e vendê-lo aqui. A maioria desses tributos, como o IPI, o PIS e o Cofins incidem mais de uma vez em diferentes etapas da operação, para o importador, para o distribuidor e para o varejista. Além disso, em algumas etapas, incidem em cascata, ou seja, sobre valores já submetidos a outras tarifas e taxas. Diante disso, a taxa de importação em si, ou seja, para trazer o console, acaba sendo o menor dos problemas. Tirando a taxa de importação, boa parte das demais taxas também recairiam sobre o produto se ele fosse produzido aqui — explica Alice.

Para advogada, o caso do Playstation 4 é emblemático para ilustrar o grande problema que é o excesso de taxas e impostos brasileiros e como essa questão precisa ser revista pelo governo. No entanto, Alice não tem dúvida de que, em alguns casos, a justificativa dos altos impostos é utilizada indevidamente por empresas para lucrar sobre os consumidores.

— Até falando como consumidora, a gente percebe que no Brasil existe uma classe média e alta que tem poder aquisitivo e um desejo crescente de consumo, o que a deixa disposta a pagar por produtos mesmo que seus preços sejam abusivos. Isso acaba sendo explorado pelas empresas — acredita ela. 
Presidente da Acigames, associação que visa a representação e regulamentação da indústria e comércio de jogos eletrônicos no Brasil, Moacyr Alves Júnior vê na grande quantidade de impostos que incidem sobre os consoles e jogos eletrônicos um problema para o desenvolvimento do mercado nacional. 
 

— Esse tipo de coisa é algo que acaba incentivando o crescimento do mercado cinza e pirata. É muito prejudicial. No caso do Playstation, por exemplo, o que vai acontecer é que muita gente vai para Miami comprar um console ou pedir que alguém traga, o que não beneficia nem o governo brasileiro, nem o nosso mercado. Se não fossem os impostos, estaríamos entre os primeiros no ranking mundial do mercado de games. A redução de impostos é uma batalha constante que temos, mas que está longe de uma solução — afirma Moacyr, explicando que jogos eletrônicos, ao contrário do que poderia se esperar, não se beneficiam das isenções de impostos de softwares e computadores.

O escritor Affonso Solano, de 31 anos, é um dos que se surpreendeu e lamentou o elevado preço do PS4 no Brasil. Antes do anúncio, ele estava certo de que iria adquirir o console devido a sua proposta de ser um videogame voltado para os jogadores. Agora, no entanto, ele diz que vai esperar um pouco mais para comprar o PS4.

— Fiquei tão revoltado com o preço alto que acabei preferindo gastar R$ 3 mil em um computador para jogos. Eu ainda tenho vontade de ter o PS4, mas não por esse preço ridículo. Preciso confessar que planejo comprar lá fora e trazer o videogame para cá, daqui a uns 6 meses, talvez 1 ano. Agora, é uma pena porque nem todos os fãs de jogos eletrônicos podem fazer isso. Na verdade, é uma minoria que pode — afirma Solano.

Apesar da justificativa da Sony, o escritor diz ver com ressalvas a explicação dada pela empresa para o preço do console. 
— A maioria dos jogadores hoje não é mais molecada e tem um poder aquisitivo decente. Há toda uma geração de jogadores que procura se informar, vê a conta dos tributos e ainda assim, algo lhes parece estranho. O valor é tão absurdo que sempre há a sensação de que, para além dos impostos, muito do preço do console é margem de lucro da empresa — diz ele.

Para a designer Larissa Herbst, de 27 anos e também fã de videogames, a polêmica em torno do preço do PS4 deve servir de lição para que a Sony procure atuar de outras formas no país.


— Não acho que a repercussão negativa vai fazer com que a Sony volte atrás no preço, porque isso pode queimar ainda mais o filme da marca no mercado e afetar outros produtos seus. Espero que ao menos essa situação sirva de incentivo para que ela passe a atuar de outras formas no Brasil, como a Microsoft vem fazendo com o seu Xbox, que é fabricado por aqui — afirma ela. (O Globo)

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