“Codesal, Iphan e Ipac são muito mais lentos do que a ação do tempo”, reclama Hewilky Ângelo sobre os casarões com alto risco de desabar no Centro Histórico de Salvador.
Há 16 anos, o médico sem fronteiras denuncia a degradação de um sobrado do século 19 que fica ao lado de sua casa, na Rua Direita do Santo Antônio. Agora, a Defesa Civil de Salvador (Codesal) confirma o risco de desabamento do lugar, que compromete parte da casa de Hewilky e ameaça os transeuntes. A orientação do órgão é de uma demolição controlada, para evitar um desmoronamento total.
Atrás da fachada colonial, com grafites, pichações e uma vegetação saindo pelas janelas, a cobertura já desabou. Resta inseguro o casario com as quatro portas que dão para a sacada ao lado da Fundação Aleixo Belov, em frente a um bar na Rua Direita. A área é tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), e faz parte do conjunto arquitetônico do Centro Histórico.
Há 12 anos, no entanto, este mesmo Jornal da Metropole advertiu em reportagem de capa: “O intuito de resguardar o patrimônio histórico não funciona, a menos que o objetivo seja preservar escombros”. A matéria de Ive Dionísio falava sobre as mais de 200 casas com valor histórico e arquitetônico que estavam em ruínas no centro já tombado pelo Iphan.
Os dados mais recentes do Projeto Casarões, da Codesal, divulgados no último dia 21, mostram que neste ano há 381 construções em alto ou altíssimo risco de desabamento no Centro Histórico. Em risco médio, são 1.249 casas. Das 2.232 construções vistoriadas, apenas 121 não apresentam qualquer risco de cair.
Na Rua Direita, próximo ao sobrado que preocupa Hewilky Ângelo, duas outras construções coloniais passaram por desmoronamentos. Em outubro de 2021, um edifício chegou a ter a cobertura derrubada pelo próprio Iphan, como meio de proteger a população de um desabamento maior.
“Meu ponto de indignação é que estão esperando o tombamento virar o tombamento literal”, protesta Hewilky sobre o edifício ao lado de sua casa. “A ação do tempo é impiedosa e não segue burocracia”.
Procurado, o Iphan respondeu que realiza vistorias periódicas e encaminha para a Justiça casos de imóveis em degradação, caso não haja resposta do proprietário.
Entregue ao tempo
No início da gestão do ex-prefeito Acm Neto, foi analisado um projeto de aumentos progressivos do IPTU para proprietários de imóveis abandonados. Conforme o arquiteto Nivaldo Andrade, essa seria uma forma de obrigar os responsáveis a cuidar das construções ou vendê-las. A medida, entretanto, não foi posta em prática.
Segundo o especialista, em Salvador as medidas são pontuais, abandonando os imóveis à ação do tempo e indo contra o que já é feito em outros estados.
“Ouro Preto é exemplo — teve como prefeito por muitos anos Angelo Oswaldo (PV), que foi presidente do Iphan. O Rio de Janeiro também já teve várias ações, desde 1970, recuperou vários imóveis. Tem o Porto Digital no Recife, polo de indústria criativa digital, ocupando imóveis abandonados na área portuária. Aqui na Bahia, fizeram um novo lugar na Paralela […]”, afirma.