Quase metade (44,28%) dos filiados aos partidos brasileiros são mulheres, mas elas ocupam apenas 21% dos cargos nas suas executivas nacionais. E a maioria tem consciência dessa distância. Setenta por cento das filiadas acham que não estão representadas de forma equilibrada nos principais postos de tomada de decisão de suas legendas. Os dados estão na pesquisa “As prefeitas brasileiras e os partidos políticos”, do Instituto Alziras, organização não-governamental que estuda a participação das mulheres na política.
Entre as maiores dificuldades para a ascensão das mulheres nos partidos estão a falta de apoio da própria legenda, as dificuldades de financiamento de campanhas e a dupla jornada. O trabalho em dobro (no emprego e em casa) prende as filiadas às tarefas domésticas por muito mais tempo.
As pesquisadoras entrevistaram 40% das mulheres que atualmente são prefeitas. São menos de 700, em contraste com quase 5 mil homens. O objetivo foi identificar a percepção dessas governantes sobre as práticas adotadas por seus partidos para ampliar a participação feminina.
A maioria das prefeitas (86%) considera importante a decisão que obrigou os partidos a destinar pelo menos 30% dos recursos de campanha para as mulheres – a regra vale para cargos do Legislativo. No entanto, menos de um terço das entrevistadas (31%) disse que seu partido tomou iniciativas para preparar candidatas no ano anterior às eleições deste domingo.
A maioria (52%) do eleitorado brasileiro é feminino. Mas só 34% das candidaturas neste pleito municipal são de mulheres.
“Apesar de a maior parte dos partidos políticos brasileiros apresentar um discurso favorável às mulheres em seus programas, plataformas eleitorais e nos pronunciamentos de seus dirigentes, as ações conduzidas por essas estruturas para promover a participação efetiva das mulheres têm sido insuficientes, particularmente quando se trata da representação eleitoral”, afirmou a diretora do Instituto Alziras, Marina Barros. Ela também é pesquisadora do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV.
De acordo com a pesquisa, para 49% das prefeitas o maior obstáculo para suas carreiras políticas era o financiamento de campanha, considerado um elemento chave para competitividade. Mas esta não é a única barreira para a ascensão das mulheres na política.
“Pesquisas mostram que as mulheres dedicam duas vezes mais tempo do que os homens às tarefas domésticas”, disse Marina Barros. Ela lembrou que, por isso, falta tempo para eventuais contatos políticos importantes. “Além disso, falta de apoio dentro do próprio partido e menos espaço na propaganda partidária também dificultam as candidaturas de mulheres.”
Todos esses problemas foram enfrentados pela prefeita Daniela de Cássia Santos Brito, de 41 anos. Ela está concluindo seu segundo mandato à frente da prefeitura de Monteiro Lobato (SP). Daniela contou que chegou a trocar de partido em busca de mais voz e mais apoio. Deixou o PSB e foi para o DEM, mas nada adiantou.
“Sempre tive muita dificuldade de atuação e até mesmo de ser aceita nos partidos”, contou Daniela. “Quase não consegui viabilizar minha primeira campanha, fui boicotada regionalmente por coronéis alinhados ao meu próprio partido.”
Tampouco houve apoio financeiro. “Mesmo sendo já uma liderança regional destacada, tenho que mendigar o tempo todo; 70% dos salários que eu recebi neste segundo mandato foram para pagar a minha própria campanha da reeleição.”
Efeitos da pandemia
A pandemia da covid-19 agravou a situação das mulheres. Fechadas em casa pela quarentena, elas passaram a se dedicar ainda mais horas às tarefas domésticas e aos cuidados com os filhos e os idosos.
“Eu acordo todos os dias às 4h da manhã para ter uma hora e meio só para mim; porque tem filho, tem neto, tem que fazer o almoço, fazer reunião, lavar roupa; estou trabalhando de 12 a 15 horas por dia”, enumerou Daniela. “Meu marido sempre me apoiou, mas é muito difícil; há oito anos ele não tem uma esposa.”
A situação se agrava ainda mais quando se trata de mulheres negras. Elas são menos de um terço das prefeitas. Representam somente 3% das mulheres em postos de poder dentro das estruturas partidárias.
“Os partidos políticos são instituições-chave para a democracia brasileira e, na medida em que consigam avançar nessas diferentes dimensões, poderão ter conquistas significativas, produzindo e afirmando novos sentidos para a ideia de democracia representativa”, afirmou Marina Barros, do Alziras. “O mundo corporativo assimilou bem essa questão, já entendeu que precisa ter representatividade nos cargos de poder e tomada de decisão, mas os partidos políticos estão muito atrasados nisso. Eles precisam ser os protagonistas dessa mudança, até para que recuperem a credibilidade perdida.” (G1)