Adriano Xavier de Souza, 31 anos, é um autodidata. Artista plástico, poeta, pesquisador e inventor, o baiano diz que aprendeu sozinho tudo que sabe. Foi um dos aprovados no edital Centelha da Fundação de Amparo à Pesquisa da Bahia (Fapesb), que busca apoiar financeiramente ideias inovadoras ao redor do estado. Adriano desenvolveu e quer comercializar um sorvete de algaroba com quipá, fruta e planta nativas da região nordeste.
O sorvete de Adriano está na fase de análises para obter certificação, aprovação e liberação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Apesar do aguardo pela liberação, Adriano já adianta os benefícios do sorvete que é sem conservantes, nem aditivos químicos. Ele ainda garante que não há qualquer substância cancerígena, nem mesmo glúten.
“O sorvete medicinal de algaroba com quipá é único no mundo”
“Principalmente porque o quipá é uma espécie de cacto não estudada no mundo inteiro e essa planta é nativa, só se encontra em alguns lugares do bioma caatinga no nosso sertão e Nordeste brasileiro. Já o quipá está em extinção por não ser uma planta comercializada”, explica.
Os detalhes da fórmula do sorvete Adriano não revela para ninguém.
“É um sorvete com fórmula secreta que eu não revelo para ninguém e só está registrada na minha cabeça”, brinca.
O edital
Natural de Inhambupe, cidade a cerca de 150 km de Salvador, atualmente Adriano mora em Guanambi, no sudoeste da Bahia. Ele não frequenta nenhuma instituição de ensino no momento, mas foi aluno do Instituto Federal Baiano (IF Baiano) nos campi das cidades de Catu e Valença.
A ideia de participar do edital surgiu quando ele estava procurando alternativas para colocar as próprias ideias em prática, sem precisar estar vinculado à uma instituição de ensino.
“Eu pesquisei na internet formas de colocar ideias em prática e acabei chegando no site do Centelha. Quando me inscrevi, já tinha criado o sorvete de algaroba com quipá e outros cinco doces cremosos.
“Eu também já tinha apresentado o sorvete na II Mostra de Novos Produtos Alimentícios durante o SIMEALI promovido pelo Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Minas Gerais Campus Regional de Montes Claros-MG em agosto de 2019”, conta.
Adriano se inscreveu e passou pelas três etapas eliminatórias do Centelha regional. O programa, voltado para inovação e empreendedorismo, é aberto para pessoas físicas da Bahia, que possuam ou não vínculos com alguma empresa privada. Cada ideia submetida foi avaliada por dois especialistas, com formação e experiência em uma ou mais áreas temáticas do programa.
Após as fases de avaliação, os projetos aprovados pelo Centelha estão em fase de contratação, que é quando os aprovados começam a receber recursos e acompanhamento para implementação das ideias, que poderão ser comercializadas.
Doces, arte, poesia e vida
Morando sozinho em Guanambi, desde dezembro de 2019, Adriano revela que reside em um quarto de 1,5 m de largura, onde cabe apenas uma cama, fogão, geladeira e materiais que utiliza para fazer suas invenções e artes. É nesse imóvel que ele diz ter criado a maior parte dos alimentos que são considerados por ele como inovadores.
“Foi nesse lugar que eu criei oito dos meus 14 alimentos inovadores de plantas medicinais, conhecidos pelas pessoas idosas. Aqui eu me sinto seguro”, revela.
Essas invenções e novos alimentos criados pelo autodidata, nem sempre são bem recebidas por todos na cidade onde mora, conforme ele relata. Adriano diz que foi muito criticado quando resolveu utilizar algaroba e quipá como matérias primas para o sorvete.
“Tem gente que diz que eu sou maluco por querer usar esses ingredientes nas minhas receitas. Mas eu não me importo. Muitos se surpreendem depois que provam o sorvete” explica.
Para provar o que diz, Adriano guarda diversos bilhetes de pessoas que já experimentaram e aprovaram seus doces. O jovem conta que já participou de vários eventos gastronômicos, no Brasil e em outros países, onde suas iguarias foram expostas. “Muitas vezes só consigui enviar os doces”, diz.
Apesar de algumas pessoas gostarem dos seus doces, Adriano conta que já sofreu perseguição e chacota por acreditar nas próprias invenções.
“Precisei abandonar meu curso de graduação, por causa das opressões constantes de alguns professores e estudantes, por eu sempre estar trabalhando nas minhas criações e invenções fora do meio acadêmico e pelo desejo de levar alternativas para dentro de sala de aula”, diz.
De origem humilde, Adriano saiu de casa pela primeira vez aos 17 anos e revela dificuldades de manter o contato com a família, em Inhambupe, pois segundo ele, os familiares não apoiam suas ideias.
Ele já morou em vários lugares, sempre em busca de seus sonhos. Depois que saiu de Inhambupe, passou cinco dias na rodoviária de Salvador, por não ter para onde ir. Morou em Valença (BA), Campinas (SP), Governador Valadares (MG), Fortaleza (CE), Rio de Janeiro, Osasco (SP), Extrema (MG), Catu (BA) e no Piauí, trabalhando em diversas atividades para conseguir se sustentar.
“Trabalhei lavando banheiros de bar e restaurante; lavando panelas grandes e todos os utensílios de cozinha; carregando caminhões e descarregando em uma transportadora com mudanças; o restante foi ‘de enxada’ nas roças, ganhando diária”, lembra.
Atualmente, Adriano trabalha como diarista de enxada na roça, ganhando entre R$ 35 a R$ 50 por dia. Além disso, as vezes consegue vender alguma obra de arte por cerca de R$ 300.
Como além de inventor, Adriano também é artista, ele conta que gosta de dar espaço para as pinturas e para escrever poesias. O filme “A Procura da Felicidade” e as passagens bíblicas de David e Moisés são suas maiores fontes de inspiração para as invenções científicas e artísticas, conforme relata.
“Ao sobrepujar as dificuldades que vivencio desde criança, busco deixar minha marca e ser exemplo de superação de vida”, relata. (G1)