Os brasileiros sacaram R$ 87,8 bilhões a mais do que depositaram na caderneta de poupança em 2023, informou nesta segunda-feira (8) o Banco Central.
Esse foi o segundo maior resgate líquido de recursos nessa modalidade desde o início da série histórica, em 1995.
O recorde negativo foi registrado em 2022, quando foram retirados R$ 103,2 bilhões a mais do que o dinheiro depositado pelos correntistas em valores absolutos. Corrigido pela inflação a valor presente, o montante seria correspondente a quase R$ 110 bilhões.
O resultado do ano fechado não foi pior porque, em dezembro, a captação líquida (diferença entre entradas e saídas de recursos) foi positiva em R$ 13,77 bilhões. Normalmente, a caderneta de poupança tem resultado positivo no período em razão do pagamento do 13º salário.
No acumulado do ano passado, as retiradas totalizaram R$ 3,92 trilhões, enquanto os depósitos somaram R$ 3,83 trilhões.
Em 2023, foram registrados resultados negativos na caderneta de poupança em quase todo o ano, exceto em dezembro e junho ?naquele mês houve entrada líquida de R$ 2,6 bilhões. O pior desempenho do ano ocorreu em janeiro, com a saída líquida de R$ 33,6 bilhões.
O fluxo de recursos na poupança passou a acumular retiradas significativas desde 2021, quando o poder de compra do brasileiro caiu diante de uma inflação de dois dígitos e de um intenso choque de juros.
O cenário hoje ainda é de juros elevados, apesar da redução da taxa básica (Selic), fixada em 11,75% ao ano depois da redução de 2 pontos percentuais no acumulado em quatro quedas consecutivas.
Atualmente, a caderneta de poupança rende 0,50% ao mês (ou 6,17% ao ano), mais a TR (taxa referencial), o que deixa a remuneração mais baixa do que outros investimentos de renda fixa. O indicador é calculado pelo BC com base nas taxas de juros das Letras do Tesouro Nacional e tem flutuação diária.
A regra da poupança mudou em dezembro de 2021 com a elevação da Selic acima de 8,5% ao ano. Quando a taxa de juros está menor ou igual a 8,5% ao ano, o investimento é limitado a 70% da taxa, acrescida da TR.
Em dezembro, o estoque (volume total aplicado) ficou em R$ 983 bilhões, ante R$ 963,9 bilhões no mês anterior.
O economista Mauro Rochlin, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas), considera que a atratividade de outros investimentos frente ao rendimento da poupança é um fator determinante para explicar o resultado da caderneta em 2023.
“O que tem maior peso nesse movimento é o diferencial de taxa de juros entre o que a poupança oferece e o que os produtos concorrentes oferecem. A gente ainda viu uma taxa de juros para títulos do governo, por exemplo, muito mais elevada do que uma aplicação em caderneta de poupança”, afirma.
O economista ressalta que o superendividamento elevado da população também pode ter contribuído para esse cenário. Nesse sentido, aponta que o programa Desenrola Brasil, prorrogado pelo governo Lula (PT) até março deste ano, pode ter algum impacto positivo sobre a poupança e sobre o crédito, de forma geral.
Para ele, essa tendência de saque líquido na poupança pode ser mantida neste ano, apesar do ciclo de queda de juros. Rochlin pondera que a expectativa dos economistas para a Selic ao término de 2024 é de 9% ao ano, conforme o último boletim Focus divulgado pelo BC.
“A mudança só acontece quando a Selic cai abaixo de 8,5%. Até 8,5%, o rendimento da poupança é de 70% da Selic, o que ?mesmo considerando a incidência de Imposto de Renda? torna outras aplicações mais atraentes e rentáveis do que a poupança”, diz.
Uma alteração de cenário, segundo o especialista, pode se concretizar a partir de 2025.
Michael Burt, economista da LCA Consultores, acrescenta que instrumentos de renda fixa alternativos compensaram a desidratação do SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo), que tem por finalidade promover o financiamento imobiliário em geral.
“No passado, quando a gente via volume alto de resgate de recursos do SBPE, o financiamento imobiliário também secava muito. O que aconteceu nesse ciclo de alta taxa de juros é que a falta de recursos via SBPE foi compensada por CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários) e LCI (Letra de Crédito Imobiliário)”, diz.
Essa migração, segundo ele, colaborou para que as concessões tenham diminuído em um ritmo menor do que o esperado enquanto a Selic estava estacionada no patamar de 13,75% ao ano até meados de 2023.
(BNews)