Instaurado pelo então presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli de forma atípica e controversa, o inquérito das fake news completa cinco anos nesta quinta-feira (14), tendo acumulado em sua tramitação episódios dos mais diversos.
Entre as determinações que ocorreram nele estão caso de censura à revista Crusoé, busca e apreensão contra o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, bloqueio de perfis do partido PCO e prisão em flagrante do então deputado bolsonarista Daniel Silveira.
Criticado desde o nascedouro, por ter sido aberto sem solicitação do Ministério Público e com base em interpretação alargada do regimento interno da corte, o inquérito ganhou legitimidade conforme as ameaças à corte e à própria democracia cresciam em volume no governo Jair Bolsonaro (PL).
Um dos principais argumentos favoráveis ao seguimento da apuração foi o de que outras instituições, como a PGR (Procuradoria-Geral da República), estariam sendo omissas.
Ainda em 2020, com apenas um voto contrário, o STF validou o inquérito ao apreciar uma ação que questionava sua legalidade -exemplo da mudança de ares é que o partido Rede, autor do questionamento, chegou a solicitar que seu pedido fosse extinto.
Designado relator do inquérito das fake news sem que houvesse sorteio, o ministro Alexandre de Moraes virou alvo preferencial de bolsonaristas e acumulou poder a partir da concentração de relatoria de uma série de apurações, com decisões vistas como duras e, por muitas vezes, controversas.
Passada a gestão Bolsonaro, mesmo os que veem importância na atuação do Supremo para buscar conter atos antidemocráticos avaliam como longa a duração do inquérito. Questionado sobre o tema, em entrevista à Folha em dezembro, Moraes se limitou a responder: “ele vai ser concluído quando terminar”.
Vinícius Assumpção, advogado criminalista e segundo vice-presidente do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), diz que um inquérito durar cinco anos não é o mais adequado, mas que não há ilegalidade por si só.
Um fato que, para ele, depõe contra essa duração é a quantidade variada de situações tratadas no inquérito. “Entendo que a gente tem ali mais um guarda-chuva do que uma apuração”, afirma, acrescentando que dado o sigilo só será possível fazer um escrutínio ao final da apuração.
Oscar Vilhena, que é professor da FGV Direito SP e colunista da Folha, considera que o tempo decorrido de investigação é bastante longo, mas ressalta que, a seu ver, o inquérito buscou suprir a omissão dos órgãos de investigação e com isso contribuir para conter alguns comportamentos ilegais. Adiciona contudo que, “passada a ameaça, não há porque mantê-lo aberto”.
“Vivemos uma situação extraordinária, e o Supremo reagiu à altura e não o fez contra a lei, mas a partir de uma margem legal que lhe foi conferida pelo regimento. Reafirmo, passada a borrasca, o Supremo deve recuar.”
O artigo do regimento que embasa o inquérito diz que “ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal, o presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro ministro”.
Ele foi aberto para apurar notícias fraudulentas, falsas comunicações de crime, denúncias caluniosas, ameaças e demais infrações caluniosas, difamatórias ou injuriosas contra o Supremo e seus ministros.
Também passou a constar como objeto do inquérito: “a verificação da existência de esquemas de financiamento e divulgação em massa nas redes sociais”, contra a independência do Judiciário e o Estado de Direito.
Entre críticos, especialmente no campo bolsonarista, ele foi apelidado de “inquérito do fim do mundo”. (BN)