Pacientes com Covid-19 grave podem desenvolver trombose e anticorpos ligados a doenças autoimunes, diz estudo

Outros sintomas heterogêneos, como fadiga, disfunção vascular, síndromes de dor, manifestações neurológicas e síndromes neuropsiquiátricas também podem acontecer por conta do quadro da doença

Foto: Rovena Rosa /Agência Brasil

Um estudo publicado na revista NPJ Aging, do grupo Nature, mostrou na última quinta-feira (24), que a infecção causada pelo vírus SARS-CoV2 pode disseminar as moléculas autoanticorpos, responsáveis pelas às doenças autoimunes. A pesquisa mostra que os idosos estão mais propícios a serem contaminados pelo Covid-19 e os motivos da doença acontecer de forma tão grave estarem relacionados com distúrbios de coagulação sanguínea, a exemplo da trombose.

Segundo o coordenador do estudo e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Otávio Cabral Marques, o estudo descobriu que uma série de patologias podem acontecer por conta do Covid-19, desde a trombose de maior dimensão até a perda de memória.

“A descoberta abre caminho para entendermos uma série de eventos patológicos decorrentes da COVID-19, que vão desde a perda de memória até a morte súbita por trombose de maior dimensão. A hiperinflamação característica da COVID-19 grave e o aumento dos autoanticorpos geram o trombo e, por consequência, a necessidade de reconstruir tecido e de recrutar uma cascata de coagulação. Trombose e inflamação são dois eventos imunológicos intimamente ligados e o nosso estudo é mais um a confirmar essa importante relação”, explicou o especialista.

Outra questão destacada na pesquisa é que a elevação dos níveis de autoanticorpos em pacientes com Covid-19 grave pode valer para outras patologias eventualmente.

“Não se trata de uma exclusividade do SARS-CoV-2, outros patógenos também podem elevar os níveis de autoanticorpos. Isso faz com que essas moléculas se tornem marcadores ou alvos terapêuticos relevantes para salvar vidas de pacientes que estejam com sepse, por exemplo, em um estágio quase terminal”, explica Otávio.

A constatação dos pesquisadores chegaram após a análise de dados referentes a autoanticorpos de 159 pacientes com COVID-19 que apresentavam diferentes graus de gravidade. Desses pacientes, 71 tinham doença leve, 61 moderada e 27 grave. Ainda foram analisadas amostras de 73 indivíduos saudáveis, que serviram como controle.

“Ao cruzar os dados por meio de técnicas de inteligência artificial, descobrimos dois autoanticorpos principais que estavam exacerbados nos pacientes com sintomas graves. São justamente os autoanticorpos associados à formação de trombos e trombocitopenia [número reduzido de plaquetas no sangue, condição que aumenta o risco de hemorragia]”, conta o coautor do artigo, Dennyson Leandro Fonseca a Agência da Universidade de São Paulo (USP).

Os altos níveis de autoanticorpos podem fazer com que o próprio organismo gere o dano tecidual a partir de trombos, conforme explica Leandro.

“Dividimos os dados entre jovens e idosos e, com isso, observamos que, embora esse mecanismo também possa acontecer entre pessoas com menos de 50 anos, ele torna o idoso mais suscetível ao agravo da doença. Isso justifica o fato de a idade ser um dos principais fatores de risco para a COVID-19”, observou o pesquisador.

Pacientes com Covid-19 em casos graves desenvolvem danos profundos nos órgãos devido a uma combinação dessas respostas autoimunes. O processo pode resultar a condição de miopatia, vasculite, artrite (articulações), síndrome antifosfolipídica associada a trombose venosa profunda, embolia pulmonar e acidente vascular cerebral, além de lesões nos rins e no sistema neurológico.

Outros sintomas heterogêneos, como fadiga, disfunção vascular, síndromes de dor, manifestações neurológicas e síndromes neuropsiquiátricas também podem acontecer por conta do quadro da doença.

“Isso abre caminho para a validação dos mecanismos de ação dos autoanticorpos e amplia o conjunto de alvos, fornecendo uma imagem mais abrangente da fisiopatologia e da progressão da COVID-19 em relação ao envelhecimento avançado. Isso permite direcionar melhor as intervenções necessárias”, indica Cabral-Marques. (BN)

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