Oito meses após o surgimento da Covid-19, quase 20 milhões de pessoas em todo o mundo foram contaminadas pelo novo coronavírus e mais de 11 milhões são consideradas recuperadas da doença. Enquanto pesquisadores e cientistas correm contra o tempo em busca da vacina, médicos estudam possíveis sequelas a médio e longo prazo nos pacientes.
O engenheiro de tecnologia Ricardo Pita, 47 anos, teve a doença no fim de junho, próximo ao período do São João, e ficou internado no Hospital da Bahia para tratamento de uma grave insuficiência respiratória, que comprometeu 50% do pulmão.
“Tive gripe e febre, e o médico que me acompanha mandou eu me afastar do trabalho. Fui fazer o teste e deu positivo (para Covid-19). Estava com febre muito alta e dificuldade respiratória. Minha respiração estava muito ruim e passei a fazer nebulização. Cheguei a comprar um oxímetro para observar a saturação do oxigênio”, conta.
Quase quatro meses depois da contaminação, Ricardo revela as sequelas da doença. “Tenho tremores, não tenho força nos braços e pernas e há indício de comprometimento do sistema neurológico. Vou ser acompanhado por neurologistas”.
A estudante de nutrição Rafaela Rocha, 27 anos, foi diagnosticada com a Covid-19 em maio e apresentou diversos sintomas, como dores, diarreia, vômitos, tosse, fraqueza, visão ruim e alguns dias sem olfato e paladar. “Não precisei ficar internada. Mesmo sendo asmática, tive sintomas respiratórios controlados”.
Hoje, conta ela, está sem conseguir ingerir determinados tipos de alimentos. “Por alteração de sabor, alguns alimentos, como leite e água, são impossíveis de consumir. Alguns estão com sabor amargo ou sem identificar bem o que estou tomando. Sinto fortes dores de cabeça e entrei há duas semanas em um quadro forte demais de crise de asma”, detalha.
Sequelas permanentes
Estudos divulgados nos últimos meses e a observação clínica dos profissionais indicam possíveis sequelas que a doença pode deixar, apesar de ainda não ser possível assegurar se elas são temporárias ou permanentes. Até agora, o que se sabe é que pacientes que tiveram casos mais graves da doença, além de danos nos pulmões, podem ter alterações no coração, rins, intestino, sistema vascular e cérebro.
Um relatório publicado na revista BMJ Case Reports revela que um paciente no Reino Unido, que ficou internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) por um longo período, também desenvolveu problemas na audição.
Comprometimento respiratório
Para o infectologista Antônio Bandeira, os pacientes que tiveram quadro grave da Covid-19 apresentam comprometimento pulmonar extenso, como fibrose pulmonar. “Temos visto pacientes graves que tiveram lesões e sequelas pulmonares. Acompanhei o caso de um paciente jovem que teve miocardite associada à Covid-19. Ele teve, como sequela, insuficiência cardíaca. Tem paciente jovem, com nenhuma comorbidade, entre 30 e 40 anos, que, quatro meses depois da doença, evoluiu para uma síndrome de cansaço crônica, fadiga e mal estar”, explica.
O infectologista diz ainda que há casos de pacientes que, cinco meses depois da contaminação, não recuperaram 100% do olfato. “A depender do grau e do tempo que estas sequelas estão presentes, uma parte volta, outra não. Quem tem fibrose pulmonar e insuficiência cardíaca não recupera”, atesta.
O também infectologista Claudilson Bastos, que atua no Instituto Couto Maia, afirma que as sequelas podem atingir até 29% dos pacientes que tiveram a Covid-19, seguindo referências da Organização Panamericana de Saúde (OPS). “O número é algo que não temos como informar, pois teremos que afastar outras hipóteses diagnósticas. As sequelas de ordem respiratória são cansaço e fadiga devido à fibrose; de ordem cardiovascular, arritmias e disfunção cardíaca; e as sequelas neuropsiquiátricas estão relacionadas a alterações cognitivas, depressão e insônia”, relata. (A Tarde)