Pesquisa aponta queda de 19% nos pequenos negócios comandados por mulheres na Bahia

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Uma pesquisa recém divulgada pelo Sebrae aponta que a pandemia interrompeu um ciclo de crescimento da participação das mulheres no empreendedorismo desde 2006, na Bahia. Hoje, atuam cerca de 850 mil empreendedores, dos quais 31% são do sexo feminino, mas esse percentual já foi de 50%.

A situação no estado reflete um cenário nacional. O estudo aponta que, em 2020, havia cerca de 25,6 milhões de donos de negócio no Brasil. Desses, aproximadamente de 8,6 milhões eram mulheres (33,6%) e 17 milhões, homens (66,4%). Em 2019, a força feminina correspondia a 34,5% do total de empreendedores – o que representou uma perda de 1,3 milhão de mulheres à frente de negócios. As baianas representam 6% do total das empreendedoras do país.

“Esse é um debate que pertence a todos nós, enquanto sociedade. Para muitas, ter o próprio negócio representa a conquista da independência financeira. No entanto, ainda precisamos avançar em muitos aspectos para alcançarmos a igualdade de gênero no mundo dos negócios”, diz Jorge Khoury, superintendente do Sebrae Bahia.

Para ele, os dados indicam claramente a necessidade de um olhar mais atento à situação das mulheres, que foram bastante impactadas pela pandemia. Mais de 82% das empreendedoras baianas ganham até um salário mínimo, sendo que 57% são o sustento da família. Isso significa que muitas famílias estão enfrentando grave situação financeira há um ano, alerta.

Além desse cenário, outra questão preocupante é o número de mulheres que perderam postos de trabalho no ano passado. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a taxa de desemprego na Bahia em novembro do ano passado chegou a 19,8% e mais da metade dessas pessoas é do sexo feminino.

‘Donas da Zorra Toda’

Uma das muitas mulheres dispensadas dos seus empregos por causa da pandemia foi Monique Sousa. Ela era gerente de um restaurante no bairro de Aphaville, em Salvador, e foi desligada em março do ano passado. Contrariando as estatísticas, Monique investiu em um negócio próprio. “Trabalho de carteira assinada eu não ia conseguir, porque o cenário era e ainda é complicado, mas precisava continuar pagando meus boletos e resolvi me jogar”.

Monique Sousa, da empresa Donas da Zorra Toda  — Foto: Arquivo Pessoal
Monique Sousa, da empresa Donas da Zorra Toda — Foto: Arquivo Pessoal

Em julho, ela criou a “Donas da Zorra Toda”, que presta serviços de elétrica, hidráulica, instalações, manutenção residencial e montagens em geral, com foco em mulheres e na população LGBTQIA+. Os atendimentos são feitos por uma equipe composta por duas mulheres e três homens trans. “Todos são pessoas que conhecem bem as dificuldades de se conseguir emprego formal, ainda mais durante a pandemia. Então, além de atender, também contrato esse público”, detalha.

Monique notou um nicho de mercado na dificuldade de mulheres e homossexuais receberem em casas homens cisgênero para a prestação de serviços diversos e resolveu trabalhar com isso. “Já havia empresas dessas voltadas para mulheres em Salvador, a novidade é que nós atendemos também o público gay, que se sente igualmente desconfortável com esse tipo de visita”.

De acordo a empreendedora, com as pessoas passando mais tempo em casa em virtude das medidas de isolamento social, elas passaram a notar o que precisava ser melhorado nas residências e isso atraiu mais clientes para a empresa.

Apesar da instabilidade de quem não tem salário fixo, Monique celebra os resultados obtidos, até então. “Se eu estivesse procurando emprego, certamente estaria passando grandes dificuldades agora, então criar minha empresa foi a melhor decisão que tomei”.

Assim como a empresa de Monique, 19% dos pequenos negócios chefiados por mulheres na Bahia tem menos de dois anos de atividade, conforme o Sebrae. A Junta Comercial do Estado da Bahia (Juceb), órgão vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, registrou, em janeiro deste ano, a abertura de 2.624 novas empresas.

O número de constituições foi o maior se comparado aos janeiros dos últimos dois anos, 2.011 (2020) e 1.995 (2019). A Juceb contabiliza que 2020 encerrou com um total 27.030 empresas abertas. O segmento do Comércio encabeçou o ranking e foi responsável por 42% do total de aberturas de empreendimentos na Bahia ano passado. Ainda de acordo com o Sebrae, mais de 70% das empreendedoras baianas atuam nos setores de comércio e serviços.

Internet e redes sociais

A internet tem sido uma ferramenta cada vez mais importante na divulgação e venda de produtos. Um levantamento feito pela Fundação Getúlio Vargas em janeiro deste ano aponta que sete em cada dez empresas atuam nas redes sociais, aplicativos ou internet para impulsionar as vendas. No mesmo período de 2020, este percentual era de 59%.

Ainda de segundo a pesquisa, uso da internet, drive-thru, delivery e atendimento domiciliar foram as principais formas encontradas por empresárias e empresários para manterem negócios funcionando em meio à crise provocada pelo vírus.

Foi o que fez Tatiane Sampaio, proprietária da ‘D’Ourata’, que produz joias personalizadas. “A pandemia dificultou muito o nosso andamento, principalmente por sermos novos no mercado. É difícil se adaptar quando seu negócio é muito segmentado. Decisão acertada hoje é focar na divulgação nas redes sociais, o que não é nem mais novidade, é necessidade”.

Tatiane Sampaio Saturnino, dona de uma empresa de joias personalizadas — Foto: Arquivo Pessoal
Tatiane Sampaio Saturnino, dona de uma empresa de joias personalizadas — Foto: Arquivo Pessoal

De acordo com Tatiana, as poucas empresas de joias personalizadas que existem em Salvador quase não fazem divulgação na internet, e ela tem adotado essa estratégia como um diferencial no mercado.

Para Isabel Ribeiro, especialista em Gestão Estratégica do Sebrae, a adaptação de negócios ao meio digital foi quase obrigatória para que as empresas garantissem a sobrevivência, em muitos casos.

“Em 2020 houve uma inclusão praticamente forçada das empresas no digital. Mas elas se inseriram sobretudo nas coisas que já conhecem: WhatsApp, Facebook e Instagram, sem necessariamente avaliar o que é melhor para o seu modelo de negócio. Eles ainda precisam apreender e se profissionalizar para não ficarem apenas nas redes sociais e chegar no que é de fato o ‘e-commerce’.”

Ainda de acordo com a pesquisa da FGV a plataforma WhatsApp é a preferida pelos empreendedores que inseriram o virtual nas suas vendas, com 84% de adeptos. Instagram e Facebook são as próximas opções, com 54% e 51%, respectivamente. Apenas 23% vendem por sites próprios.

Para a especialista, algumas dicas são fundamentais para quem está começando um novo negócio e pretende investir na internet: especialização na área; conhecimento de mercado; atualização permanentemente; capacitação para o meio eletrônico; gostar do que vai fazer.

Luz Marina Sampaio, com as peças voltadas para pets  — Foto: Arquivo Pessoal
Luz Marina Sampaio, com as peças voltadas para pets — Foto: Arquivo Pessoal

E foi justamente o amor pela cachorrinha de estimação que inspirou Luz Marina Sampaio a empreender. Ao perceber que não havia um perfil especializado para venda de acessórios para animais em Feira de Santana, ela e a irmã, Sanni Raíssa, aproveitaram o isolamento para abrir um novo negócio em plena pandemia, a ‘ôBixim’ .

“Estávamos as duas vivendo o isolamento social e enquanto isso, fizemos algumas pesquisas sobre o mercado da nossa cidade. Paralelo a isso, nos distraíamos diariamente com aquela que acabou sendo nossa fonte de inspiração: Akira, nossa ‘doguinha’. Sempre que a levávamos ao banho, eu dizia que faria os acessórios dela”, conta.

De acordo com Luz Marina, foi preciso enfrentar vários empecilhos, como a compra e recebimento de matéria-prima, que estava escassa no mercado por causa da pandemia, mas não desistiram da ideia.

“O fechamento do comércio dificultou a escolha de tecidos e dos diversos materiais que utilizamos e os preços sofreram um aumento significativo. A entrega de encomendas para outras cidades também foi um desafio, devido ao custo do frete, o que fez com que tivéssemos que buscar portadores para facilitar a entrega”, enumera.

A maior parte das vendas da ÔBixim é feita para para empresas, como clínicas e pet shops. A conta no Instagram, contudo, funciona como uma espécie de vitrine e acaba atraindo novos clientes.

Luz Marina e Sanni Raíssa investiram em uma marca de artigos para pets  — Foto: Arquivo Pessoal
Luz Marina e Sanni Raíssa investiram em uma marca de artigos para pets — Foto: Arquivo Pessoal

Luana Almeida, fundadora do Studio Malagueta, empresa que presta serviços de gerenciamento de redes sociais, consultoria e identidade visual para novos negócios, essas ferramentas, quando usada para vendas, equivalentes às vitrines das lojas.

Outro detalhe é que nem sempre os perfis existem para vender. Muitos negócios podem estar na internet apenas para divulgação de marcas, produtos, além de reforçar credibilidade. “Muita gente, depois de receber recomendação de um profissional vai olhar os perfis dele na internet”, exemplifica.

Especialista em comunicação e marketing, Luana, que trabalha exclusivamente com o público feminino, observa que muita gente está utilizando as redes sociais nos negócios, porém, ainda são cometidos erros básicos no relacionamento com os clientes, como não responder aos clientes e deixar o perfil atualizado, por exemplo.

Luana também reforça que não é necessário marcar presença em todas as redes socais. “Antes de mais nada, o empreendedor precisa saber qual cliente ele deseja alcançar e então se inserir na rede social mais adequada. É mais importante analisar o que faz sentido para o negócio”.

Luana Almeida, especialista em comunicação e marketing — Foto: Arquivo Pessoal
Luana Almeida, especialista em comunicação e marketing — Foto: Arquivo Pessoal

Dicas para empreender na internet ?:

  • Na hora de escolher um seguimento, escolha uma área que você goste muito;
  • Se especialize tanto no segmento do seu negócio quanto em ferramentas de gestão, divulgação e vendas pela internet;
  • Conheça o mercado onde está tentando se inserir; veja como se comportam outras empresas com o mesmo perfil e qual pode ser o seu diferencial;
  • Mesmo depois que o negócio já está funcionando, nunca deixe de acompanhar as novas ferramentas de gestão e vendas; esteja sempre atualizado;
  • Tenha perfis nas redes sociais que fazem mais sentido com o perfil dos seus clientes, não em todas;
  • Cuide sempre da estética do perfil, ele é sua vitrine na Internet;
  • Utilize imagens profissionais sempre que possível ou tente seguir alguma dicas de fotografia;
  • Ao utilizar bancos de imagens, busque sempre modelos que se parecem com seu público; Não adianta usar somente pessoas brancas e porque isso não representa toda a população brasileira, principalmente baiana;
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