90 milhões de medicamentos e produtos herdados de Bolsonaro estão prestes a vencer na Saúde

com validade curta, esse estoque inclui remédios para HIV, vacinas, contraceptivos e medicamentos do chamado “kit intubação”.

Fachada do Ministério da Saúde na Esplanada dos Ministérios

O Ministério da Saúde guarda cerca de 90 milhões de itens que vencem até o fim de julho. Herdados do governo Jair Bolsonaro (PL) com validade curta, esse estoque inclui remédios para HIV, vacinas, contraceptivos e medicamentos do chamado “kit intubação”.

A equipe da ministra Nísia Trindade negocia com a indústria a troca de parte dos produtos. A lista completa de itens do SUS armazenados na central de distribuição da Saúde em Guarulhos (SP) está sob sigilo desde 2018 e foi mantida dessa forma pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A Folha obteve a relação dos produtos que estavam registrados no estoque da pasta em meados de abril. Esses dados mostram que o ministério armazenava 4,5 milhões de comprimidos de darunavir 600 mg com validade até o fim de maio, produto usado no tratamento de HIV e entregue em caixas de 60 unidades.

Avaliado em R$ 26 milhões, esse lote de darunavir representa cerca de 20% do total de uma compra feita em 2020. A Saúde afirma que já pediu a reposição de 3,7 milhões de comprimidos do produto.

A equipe da ministra da Saúde culpa a gestão Bolsonaro pelo acúmulo de produtos com validade curta. Integrantes da pasta dizem que diversas compras foram feitas sem planejamento e não houve esforço em entregá-las dentro do prazo.

O governo Lula ainda está com dificuldade para repassar esses insumos com prazo menor de validade a estados, municípios e outros países.

O ministério afirma que recebeu da gestão passada cerca de 160 milhões de itens com validade expirando de janeiro a julho. Os produtos valem R$ 981,8 milhões, segundo a pasta.

O ex-ministro da Saúde Marcelo Queiroga disse à Folha que as áreas técnicas eram responsáveis pelas compras e negou ter faltado empenho para a entrega de vacinas e produtos como anticoncepcionais.

O ministério ainda guarda cerca de 7,1 milhões de frascos de imunizantes de diversas doenças com validade até o fim de julho, sendo 4 milhões da vacina meningocócica, que protege crianças contra a meningite. Cerca de 900 mil frascos de vacinas da Covid, com cinco doses cada, estão no mesmo estoque.

Também vencem nesse período 10 milhões de unidades de sedativos e outras drogas usadas na intubação de pacientes.

Em nota, a Saúde afirma que já conseguiu evitar a perda de 775,3 mil unidades desses produtos com doações ou entregas a entes vinculados ao SUS. Essas drogas foram adquiridas em larga escala, mas com atraso, quando o SUS ficou desabastecido do chamado “kit intubação” na pandemia.

Parte dos gestores do SUS dizem que é insuficiente a divulgação feita pela Saúde sobre os produtos prestes a vencer, além da mobilização para entrega dos lotes.

Em nota, o Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde) afirma que não teve acesso aos dados do estoque.

“Somente tomamos conhecimento de medicamentos com validade próxima ao vencimento quando somos acionados pelo Ministério da Saúde para apoiar na divulgação e disseminação dos itens disponíveis para doação por parte do Ministério”, diz a entidade.

Há cerca de 1,4 bilhão de itens no estoque da Saúde. Esse número considera também os produtos de validade mais longa. Agulhas e seringas, além de preservativos masculinos, representam mais da metade dos itens estocados.

Os dados do centro de distribuição contam os insumos em diferentes unidades, como frascos e comprimidos. A tabela obtida pela reportagem considera um item o frasco de vacina que contém dez doses, por exemplo.

A mesma base de dados afirma que 56 milhões de pílulas anticoncepcionais venceram até março. Esse produto poderia ser contado como cerca de 2,6 milhões de cartelas.

Outros 60 milhões de comprimidos de contraceptivos expiram até junho. Em nota, a Saúde diz que conseguiu trocar 31,5 milhões de unidades desse anticoncepcional por lotes com prazo maior de validade.

Parte dos insumos do SUS vencidos nos últimos anos já foi incinerada e está fora dos dados do estoque atual. Como revelou a Folha, cerca de R$ 2,2 bilhões em vacinas, medicamentos de doenças raras, testes e outros produtos foram para o lixo desde 2019.

Representante da RNP+ Brasil (Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids) em comissão de atenção à saúde de pessoas com patologia do CNS (Conselho Nacional de Saúde), Moysés Toniolo afirma que pediu ao novo governo acesso a dados de estoque de medicamentos, mas não foi atendido.

Outro reflexo da pandemia é o estoque de mais de 20 milhões de luvas, roupas de proteção e máscaras já vencidas. Parte desse produto foi interditada por ser considerada fora dos padrões sanitários.

O sigilo do estoque virou alvo do Congresso. Tramita na Câmara um projeto de lei, já aprovado no Senado, para determinar que os dados sobre estoque do SUS sejam apresentados na internet.

As informações sigilosas sobre o estoque ainda revelam a perda de medicamentos usados cotidianamente em postos de Saúde. O governo Bolsonaro deixou vencer 95 mil comprimidos de paracetamol 500 mg em setembro de 2022, remédio que chegou a ficar escasso no mercado no mesmo período. (Política Livre)

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