O sítio em Atibaia (SP) que era frequentado pelo ex-presidente Lula ficará livre de confisco se, nesta quarta-feira (27), o TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) anular a sentença que condenou o petista em primeira instância por corrupção e lavagem de dinheiro em decorrência de reformas bancadas por empreiteiras na propriedade.
Sem o confisco judicial, a eventual venda do imóvel poderá resultar em um lucro de quase R$ 900 mil ao seu dono formal, um amigo da família de Lula.
Nesta quarta-feira, o TRF-4 vai julgar os recursos das partes do processo que condenou Lula pelo caso do sítio na 13ª Vara Federal de Curitiba. Um ponto fundamental a ser decidido é se o processo deve ou não voltar à primeira instância para correção da ordem de apresentação das alegações finais, conforme recentes decisões do STF (Supremo Tribunal Federal).
O Supremo anulou duas condenações da Lava Jato e determinou que esses processos retornassem à fase de alegações finais por não ter sido respeitado o princípio de que as defesas devem se manifestar por último nos processos —ou seja, que réus delatores falem antes dos acusados que não são colaboradores.
No caso do sítio, o ex-presidente apresentou suas alegações finais no mesmo prazo de seus delatores, o que abre brecha para a anulação de sua condenação a 12 anos e 11 meses de prisão em primeira instância.
O sítio em Atibaia foi comprado em outubro de 2010 por R$ 500 mil, o que corresponde a R$ 830 mil em valor atualizado pela inflação (IPCA). Segundo o Ministério Público Federal, a propriedade rural teve reformas financiadas pelo pecuarista José Carlos Bumlai e pelas empreiteiras Odebrecht e OAS.
Uma avaliação judicial realizada em meados deste ano por determinação da 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pelo processo, indicou que o sítio vale hoje R$ 1,7 milhão, uma diferença de R$ 870 mil em relação ao valor pago.
A Justiça autorizou a venda da propriedade rural, mas determinou que parte do valor eventualmente obtido seja depositado em uma conta judicial e fique bloqueado até o julgamento do caso pelas instâncias superiores.
Porém, se a sentença de primeira instância for anulada pelo TRF-4, o dono poderá ficar com o valor total do negócio, já que a decretação de confisco do imóvel também seria cancelada pelo tribunal.
Em nome de empresário
A área onde está a casa, o lago e outras benfeitorias do local está registrada em nome do empresário Fernando Bittar, filho de Jacó Bittar, amigo de Lula que atuou na fundação do PT.
A sentença de primeira instância, de autoria da juíza federal Gabriela Hardt, considerou que houve corrupção e lavagem de dinheiro no caso.
Na decisão, a magistrada ressaltou que não entrou na discussão sobre a propriedade formal do sítio, uma vez que a denúncia do Ministério Público Federal teve como foco a reforma e decoração de instalações e benfeitorias realizadas em favor de Lula e sua família.
“Sendo proprietário ou não do imóvel, é fato incontroverso que foram efetuadas reformas e comprados objetos para atender interesses de Luiz Inácio Lula da Silva e de sua família”, escreveu Hardt.
Para a juíza, Bittar cometeu o crime de lavagem de dinheiro em relação às obras da cozinha do sítio, pagas pela OAS, uma vez que as notas fiscais quanto a estas benfeitorias foram emitidas em nome do empresário, e ele assinou os projetos da obra.
Com base nesse entendimento, a magistrada condenou Bittar a três anos de reclusão, mas substituiu a punição pela pena de prestação de serviços à comunidade e pagamento de dez salários mínimos.
A defesa do empresário, conduzida pelos advogados Alberto Toron e Luiza Oliver, nega que ele tenha cometido esse crime.
Segundo a decisão judicial, de fevereiro passado, as benfeitorias resultantes das reformas no sítio constituíram “o proveito do crime de lavagem” e tiveram custo de aproximadamente R$ 1 milhão.
Hardt decretou então o confisco do imóvel e determinou que, em caso de venda judicial, Bittar só ficasse com a “diferença entre o valor das benfeitorias objeto dos crimes” e o valor pago pelo imóvel em 2010.
Em abril, a defesa de Bittar apresentou petição com pedido de autorização para negociar o imóvel no mercado convencional. De acordo com a defesa, “a venda de imóveis por meio de leilão judicial tende a resultar em significante deságio”, o que poderia prejudicar Bittar e “os próprios interesses da Justiça”.
“Realmente e conforme é notório, na hipótese de o imóvel ser submetido à denominada ‘2ª praça’, seu arremate pode dar-se por valor de até 50% menor do constante do laudo de avaliação”, argumentaram os advogados.
A defesa acrescentou que Bittar não frequenta mais o sítio e que um eventual leilão judicial do imóvel só ocorreria após o julgamento pelas instâncias superiores. Pediu, então, para fazer a venda convencional do bem após a realização de uma avaliação judicial do imóvel.
Os advogados informaram que, em caso de autorização, o pagamento do negócio seria feito por meio de depósito em conta judicial indicada pela vara federal.
O Ministério Público Federal concordou com o requerimento dos advogados de Bittar e, em maio, a Justiça determinou a realização da avaliação judicial do imóvel. O perito indicado pela Justiça emitiu um laudo que estimou em R$ 1,7 milhão o valor da propriedade rural.
Procurada pela Folha, a advogada de Bittar Luiza Oliver afirmou que mesmo em caso de anulação do confisco por decisão do TRF-4, a defesa não adotará medidas para vender a propriedade rural sem antes comunicar a Justiça Federal. Disse ainda que pedirá autorização para concretizar qualquer transação.