Após retorno aos palcos, Daniel contou que não percebeu manifestações políticas em seus shows
De Ludmilla a Rosalía, manifestações políticas da plateia parecem ter se tornado obrigatórias durante os shows ao redor do país neste ano eleitoral. Mas, para artistas como o cantor Daniel, o palco não é o local de demonstrar preferência por um ou outro candidato.
“Não sei até que ponto é interessante quando há uma manifestação o artista se manifestar também. Tem que ter um certo cuidado em relação a isso para não piorar ainda mais as coisas”, disse o cantor sertanejo, durante o Festival de Inverno de Bonito, no Mato Grosso do Sul, do qual foi uma das atrações principais –o evento segue até este domingo, dia 28, com shows de Vanessa da Mata, Rincon Sapiência e Ira!.
Depois de seu retorno pós-pandêmico aos palcos, Daniel diz que não viu acontecerem manifestações políticas em seus shows, mas que já presenciou brigas em apresentações passadas. “Eu mando um recadinho na boa, cantando sem parar, para a pessoa entender que a gente está ali para cantar, para trazer paz. O contexto é outro, o propósito é outro.”
“O Brasil passa por uma transformação. É hora de analisar o que realmente é bom, o que a gente acha que é interessante para o país. O Brasil já poderia ter dado muitos passos em relação a isso, mas infelizmente ainda existem muitas coisas fora do lugar”, comenta o cantor, que completa 40 anos de carreira.
Entre as coisas fora do lugar, o ano foi marcado pela “CPI do sertanejo”, como passou a ser chamada uma série de investigações do Ministério Público sobre pagamentos de cachês em shows e festivais bancados por prefeituras país afora.
Daniel não está na lista de artistas com shows investigados, que incluem Gusttavo Lima, Bruno e Marrone e outros nomes do gênero. “Não sei se é da forma que pintam, a gente nunca sabe. A gente vê o noticiário e às vezes são até amigos envolvidos. Acho que o artista não tem muito a ver, porque o cara é contratado”, diz.
“Mas precisa haver um consenso de valores. O artista tem o seu valor, mas tem que entender que às vezes o lugar não compete para fazer um espetáculo. Então, de repente, não vai lá fazer o show.”
Ao lado de nomes como Chitãozinho e Xororó e de seu antigo parceiro de palco, João Paulo, Daniel foi um dos artistas que ajudaram a modernizar e a popularizar a música sertaneja no país.
O cantor acredita que essa virada do estilo, hoje o mais ouvido do Brasil, é importante, mas que atualmente os artistas são projetados apenas para fazer sucesso.
“A gente começava sem saber ao certo o que ia acontecer. Íamos muito naturalmente cantando dentro de casa, e aquilo se propagava para a rua, para um boteco, e assim as coisas iam acontecendo. Hoje não, parece que existe até um projeto, parece que a pessoa já vem com um esquema pronto”, ele diz.
Afirma, ainda, que falta certa qualidade na produção recente. “Muita gente que chegou hoje chegou para ficar, porque tem potencial. Mas precisa ter mais cuidado nessa questão de qualidade de letra, porque tudo é muito instantâneo. Se não tiver esse cuidado com letras que realmente tocam profundamente, que tenham possibilidade de se eternizar, a música evapora. O artista não se pode deixar levar por uma certa grandiosidade.” A repórter viajou a convite do festival.