Duas cientistas brasileiras tiveram papel essencial no sequenciamento do novo coronavírus, que teve primeiro caso na América Latina confirmado em 26 de fevereiro. Publicado em uma rapidez surpreendente – apenas dois dias após a verificação do primeiro paciente com a doença no Brasil –, o estudo que elas conduziram ao lado de outros pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz (IAL), da Universidade de Oxford e do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (IMT-USP) ajudará epidemiologistas, virologistas e especialistas em saúde pública a desenvolverem vacinas e testes diagnósticos.
Uma das pesquisadoras envolvidas no estudo é Ester Sabino, diretora do Instituto de Medicina Tropical (IMT) da USP e coordenadora do Centro Conjunto Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus (CADDE), que é apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de S. Paulo (Fapesp) e pelos britânicos Medical Research Council e Fundo Newton. A intenção do CADDE é reunir cientistas para realizar estudos em tempo real de epidemias de arboviroses, como é o caso da zika e da dengue. “A proposta é realmente ajudar os serviços de saúde e não apenas publicar as informações meses depois que o problema ocorreu”, explicou Sabino à Agência FAPESP.
Jaqueline Goes de Jesus, pós-doutoranda na Faculdade de Medicina da USP e bolsista da FAPESP, por sua vez, liderou a equipe que fez o sequenciamento do genoma viral ao lado de Claudio Tavares Sacchi, responsável pelo Laboratório Estratégico do Instituto Adolfo Lutz. A cientista desenvolve pesquisas na área de arboviroses emergentes e faz parte do ZiBRA Project – Zika in Brazil Real Time Analysis, um projeto itinerante de mapeamento genômico do vírus Zika no Brasil. Durante seu doutorado, ela contribuiu para o aprimoramento de protocolos de sequenciamento de genomas completos pela tecnologia de nanoporos dos vírus Zika e HIV.
A pesquisa sobre o novo coronavírus de que Sabino e Goes de Jesus participaram determinou a sequência completa do genoma viral encontrado no Brasil, que foi chamado de SARS-CoV-2. Ela foi divulgada no fórum de discussão Virological.org. “Ao sequenciar o genoma do vírus, ficamos mais perto de saber a origem da epidemia”, aponta Sabino.
Embora outros países tenham levado cerca de duas semanas para fazer o sequenciamento do coronavírus, a pesquisa brasileira foi concluída em dois dias; os cientistas já previam que, cedo ou tarde, a doença chegaria aqui.
A sequência analisada no Brasil apresenta diferenças em relação ao genoma identificado em Wuhan, o epicentro da epidemia na China. Porém, ela se aproxima das amostras do coronavírus observadas na Alemanha no final de janeiro deste ano. “Esse é um vírus que sofre poucas mutações: em média uma por mês. Por esse motivo, não adianta sequenciar trecho pequenos do genoma. Para entender como está ocorrendo a disseminação e como o vírus está evoluindo, é preciso mapear o genoma completo”, explicou Sabino à Agência Fapesp.
Em entrevista ao site G1, Goes de Jesus também observou: “Alguns vírus são mais estáveis e outros, como os respiratórios, acabam mutando muito. É o que acontece com o vírus da gripe: todo ano a gente tem uma vacina nova, porque há muitas mutações”. (Ascom)