Metas do Ideb em Santo Antônio de Jesus estão fora do alcance

Foto: Ag. A tarde

Vem da zona rural de Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo Baiano, a pior nota no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) da cidade em 2017: 2,5 nos anos finais do Ensino Fundamental. Dona deste desempenho, a escola Ademario Francisco dos Santos, no povoado de Mina do Sapé, revela algumas das dificuldades do município em melhorar a qualidade de sua educação.

A unidade de ensino não atinge suas metas no Ideb desde 2009, na etapa final do Fundamental, mesmo caso da cidade – em 2017, a nota geral foi de 3,6. Em relação aos primeiros anos (1º ao 5º ano), a educação municipal não atinge o estimado desde 2011 – o índice foi de 4,8 em 2017.

Estar na zona rural é um complicador para a melhora dos resultados da unidade escolar, que, desde aquele ano, está estagnada nos números. A região tem demandas específicas para o ensino, ao mesmo tempo em que o município não parece preparado para lidar com elas.

Escola Ademario Francisco dos Santos revela dificuldades em melhorar qualidade
Escola Ademario Francisco dos Santos revela dificuldades em melhorar qualidade

Coordenadora pedagógica da Ademario, Rita Neves ensina em unidades da zona rural há mais de 20 anos. Ela avalia que um dos principais problemas da educação na localidade não está relacionado diretamente a questões ligadas à sala de aula, e sim à autoestima dos alunos.

“Eles têm, em geral, uma autoestima muito baixa. Eles não se reconhecem como pessoas do campo, da roça, mas também não são da cidade. Falta uma sensação de pertencimento”, conta Rita, para quem isso faz com que os estudantes tenham dificuldade de se identificar e se relacionar com o ambiente escolar.

Outra questão que também afeta negativamente a qualidade do ensino na região, na visão dela, é a divisão do discente em dois papéis desempenhados concomitantemente: os de aluno e trabalhador rural.

“O aluno da zona rural geralmente trabalha em um turno e, depois, pega o ônibus para ir à escola. E, para eles, a escola é um shopping center. Eles vão ali para passear, namorar, ter lazer. A escola não tem o papel que deveria”, lamenta.

O incentivo aos educandos vem de iniciativas que conseguem apresentar a escola como algo diferente de um espaço de lazer. Recentemente, alunos do 8º ano apresentaram, em uma feira de ciências de uma escola particular da cidade, uma pesquisa sobre como a manipueira, líquido extraído da mandioca no processo de fabricação da farinha, poderia ajudar o povoado.”

Tenho trabalhado com jogos, realizado atividades lúdicas para despertar o interesse dos estudantesEmanuel Menezes, professor de Matemática

Ganharam uma credencial para apresentar o estudo em outra feira de ciências, mas no Recife. O bom resultado se refletiu dentro da sala de aula. “Depois desse processo, a turma avançou em todas as disciplinas e todos foram aprovados, sem precisar de empurrão no conselho de classe”, comemora.

Professor de Matemática da escola, Emanuel Menezes diz que tenta aproximar a disciplina dos alunos. “Tenho trabalhado com jogos, realizado atividades lúdicas para despertar o interesse dos estudantes. Busco trabalhar com eles questões que já foram usadas nas avaliações externas, como a Prova Brasil. É um jeito de construir com eles uma familiaridade com esses tipos de prova”, explica.

Professor Emanuel Menezes trabalha com jogos e atividades lúdicas para despertar o interesse
Professor Emanuel Menezes trabalha com jogos e atividades lúdicas para despertar o interesse

Para a coordenadora, algumas ações municipais, como valorização da autoestima do homem do campo e aumento no número de equipes de profissionais para lidar com deficiências de aprendizagem dos alunos são importantes para a melhorar a qualidade da educação no campo. No entanto, ela pondera que tem visto iniciativas do tipo na atual gestão. “Eu trabalho há mais de 20 anos no campo e vejo como a escola do campo hoje é bem-vinda. Há pessoas sensíveis ao tema dentro da secretaria [de educação].

Deficiências

Na contramão da situação encontrada na Ademário Francisco dos Santos, a Escola Municipal Luís Eduardo Maron de Magalhães, no Centro da cidade, teve a melhor nota do Ideb (5,9 nos anos iniciais) em Santo Antônio em 2017. Maior unidade de ensino municipal, com cerca de 1,2 mil alunos matriculados, ela é alvo de cobiça. As filas grandes formadas pelos pais na época da matrícula já são conhecidas pelos moradores.

Maior unidade de ensino municipal, Escola Municipal Luís Eduardo Maron de Magalhães é alvo de cobiça
Maior unidade de ensino municipal, Escola Municipal Luís Eduardo Maron de Magalhães é alvo de cobiça

O desafio para professores, coordenadores e professores vai aumentar agora, no entanto. A escola não atende mais alunos do 1º ao 5º ano do Fundamental, só do 6º ao 9º ano. Nesta última etapa, a nota do Ideb cai para 3,5, sem atingir de 5,2 projetada para aquele ano. Para este ano, a estimativa é chegar a 5,5.

Para Patrícia Pimenta, coordenadora pedagógica da escola, entre os obstáculos para o crescimento nos indicadores, estão a falta de formação continuada para professores no ensino médio e a rotatividade dos professores que não concursados. A falta da formação continuada também contribui para o mau desempenho nas avaliações externas, e a rotatividade prejudica o processo pedagógico da escola”, critica.

Para Patrícia Pimenta, falta de formação continuada para professores é um dos obstáculos
Para Patrícia Pimenta, falta de formação continuada para professores é um dos obstáculos

O outro lado

Em nota, a prefeitura informou que tem buscado investir “fortemente” na busca da qualidade da educação, com ampliação do transporte escolar, incremento da merenda, reconstrução de escolas, atividades complementares em turno oposto e pagamento do plano de cargos e salários aos professores. A prefeitura ainda negou que não haja formação continuada de docentes no município e assegurou que todos os gestores e professores estão tendo essa oportunidade.

SÓ 10% DAS ESCOLAS TÊM LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA

Arielle Matos Porto precisava fazer uma pesquisa na internet para uma atividade que a professora estava desenvolvendo em sala de aula, mas a Escola Municipal Deputado Luis Eduardo Maron de Magalhães não tem laboratório de informática. A aluna do 9º ano solicitou o computador da Coordenação Pedagógica para realizar a tarefa escolar.

“É preciso investir em mais recursos como computadores. Estamos precisando de um laboratório na escola”, disse Arielle.

Arielle solicitou o computador da coordenação para realizar tarefa
Arielle solicitou o computador da coordenação para realizar tarefa

A Escola Municipal Ademário Francisco dos Santos, localizada na zona rural, também não dispõe de um laboratório de informática. “Seria um sonho termos um laboratório aqui”, destacou Oade Batista, vice-diretora da escola. “

É preciso investir em mais recursos como computadoresArielle Matos Porto, estudante

De acordo com os dados da plataforma QEdu, que reúne estatísticas sobre educação no Brasil, apenas cinco escolas, das 50 da rede municipal de ensino de Santo Antônio de Jesus, têm laboratório de informática.

Para a professora Tânia Lúcia, o laboratório de informática é um equipamento importante para o processo ensino-aprendizagem, mas tem se tornado um artigo de luxo.

“A escola precisa acompanhar os tempos atuais e fazer uso da tecnologia a favor da educação. Hoje o aluno não está mais interessado no velho modelo de aula exposição do professor-quadro negro-livro. Não podemos exigir dos alunos algo que a escola não fornece, exigir muito de quem só tem o lápis, a caneta e o caderno”, defendeu a professora.

Infraestrutura

Os problemas estruturais das escolas municipais de Santo Antônio de Jesus não se resumem à falta de laboratório de informática nas escolas. Dados do QEdu revelam que apenas sete escolas têm biblioteca. O mesmo número são as escolas que dispõem de quadra esportiva e sala de leitura. Nenhuma escola municipal tem laboratório de ciências.

“Somos a maior escola da rede municipal, com cerca de 1.200 alunos matriculados e sofremos com problemas de infraestrutura. Não temos quadra esportiva e nem biblioteca. Temos uma sala de leitura, mas os livros já estão um pouco defasados”, destacou Patricia Pimenta, coordenadora pedagógica da Escola Municipal Deputado Luis Eduardo Maron de Magalhães.

Procurada pela equipe de reportagem de A TARDE, a secretária municipal de Educação Cinthia Barreto declarou que “a atual gestão recebeu todas as escolas públicas do município em total abandono no que se refere à estrutura física”. Ela ressaltou que já foram reformadas ou reconstruídas 21 unidades escolares.

Sobre a ausência de laboratórios de ciências nas escolas municipais, Cinthia Barreto destacou que a prefeitura “já iniciou a luta para transformar essa realidade” e que a falta de laboratórios não foi impeditivo para investir em iniciação científica. Ela citou como exemplo a realização da Feira de Iniciação Científica de Santo Antônio de Jesus, com a segunda edição realizada este ano.

Quanto ao reduzido número de laboratórios de informática, a secretária falou que medidas emergenciais foram adotadas e que o projeto é informatizar todas as escolas da rede municipal.

(A Tarde)

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