Mulher faz tratamento para produzir leite e ajudar a amamentar gêmeos gerados pela esposa

Foto: Deborah Ghelman

Os gêmeos Joaquim e João nasceram na quinta-feira (2), no Recife. Na casa deles, tudo é feito em dobro, desde a compra da primeira roupinha ao registro no cartório, realizado nesta terça-feira (7). Para as duas mães, o sentimento de compartilhamento é ainda maior. Patrícia Luna estimulou a produção de leite para ajudar a mulher, e Lilianne Dantas, que gestou os bebês, a amamentar as crianças.

Joaquim foi o primeiro a nascer, com 2,3 quilos. João veio logo em seguida, com 2,1 quilos. O parto precisou ser antecipado para 35 semanas, porque o primeiro bebê estava tendo uma redução de líquido amniótico. Eles saíram da maternidade três dias depois, com quatro peitos para se alimentar.

Patrícia, que é fisioterapeuta, estimulou a lactação por meio de remédios e de uma bomba de sucção, que simula a amamentação. Segundo ela, foram razões, inicialmente, mais práticas do que sentimentais.

A arquiteta Lilianne, que gestou os bebês, precisou passar por uma cesariana e deixar de lado a vontade de ter o parto normal, já que a redução de líquido poderia colocar a gravidez em risco.

“Pelo fato de não gestar, você não tem aquela vontade de amamentar. Mas aí vai entrando na gravidez, vai estudando, participando de rodas de parto. Quando começamos, era mais pela parte prática, por serem dois bebês, para facilitar a rotina. Mas com a estimulação, mesmo sendo uma bomba, algo mecânico, você começa a imaginar e a desejar esse momento que hoje estou tendo”, declarou Patrícia.

Patrícia (à direita) estimulou lactação para amamentar junto com a esposa Lilianne (à esquerda) — Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press
Patrícia (à direita) estimulou lactação para amamentar junto com a esposa Lilianne (à esquerda) — Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press

As duas novas mães estão juntas há nove anos e se casaram oficialmente em 2017. No início do ano seguinte, começaram os preparativos para a concepção dos dois bebês.

O casal disse que, desde o início da fertilização, procurou não ter grandes expectativas, mas foi surpreendido por uma sucessão de notícias boas que acompanharam todo o processo, desde o início da gestação.

Ao todo, foram preparados oito embriões, que são organismos no estágio inicial de desenvolvimento, com o material genético de um doador masculino, escolhido de um banco de sêmen localizado em São Paulo. Dois dos embriões, um de cada mãe, foram implantados no útero de Lilianne.

A ideia das duas era que, caso apenas um deles “vingasse”, elas não soubessem de quem teria sido o óvulo fecundado. Entretanto, na primeira tentativa, ambos os embriões tiveram sucesso. Eles se tornaram João e Joaquim. Os outros embriões foram doados para outras mães que quiserem engravidar.

“Costumo dizer que foi uma gravidez de elefante, de doze meses, contando todo o processo, desde a estimulação dos óvulos. Tudo foi muito natural, não tivemos muito debate sobre quem gestaria, os nomes ou coisas assim. Até pelo vínculo empregatício de Lilianne, sabíamos que seria mais fácil ela gerar os meninos”, declarou Patrícia.

Lilianne (à esquerda) e Patrícia (à direita) tiveram João e Joaquim — Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press
Lilianne (à esquerda) e Patrícia (à direita) tiveram João e Joaquim — Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press

Ato de amor

A “gravidez de doze meses” citada por Patrícia começou no fim de 2017 com uma enxurrada de modificações para a família. A partir do contato com a clínica de fertilização, elas começaram um processo para estimular a ovulação para, enfim, retirar a fecundar os óvulos.

A ovulação é induzida por meio de medicamentos, que as duas tomaram. Depois disso, os óvulos são fecundados e, só então, implantados no útero. Nessa etapa, o casal começou a compartilhar a própria história no Instagram, num perfil intitulado @duasmaesdedois, onde informam detalhes do processo de fertilização in vitro.

“Ela enjoou comigo, teve o mesmo tipo de sono que eu estava tendo, foi tudo com muito companheirismo. Quando ela começou a tomar a medicação para induzir a produção de leite, foi só para o corpo dela entender mesmo, mas acho que mesmo sem isso, por estar tão envolvida na gravidez, ela amamentaria”, afirmou Lilianne.

As duas mães contam, desde o início da gestação, com o apoio da doula e consultora de amamentação Vivienne Pires, que acompanhou o processo de estimulação da produção de leite de Patrícia. Depois do parto, ela também passou a ajudar Lilianne.

“Existem alguns protocolos para estimular a lactação. No caso das meninas. fizemos um acelerado, com estímulo mecânico com a bomba nas mamas, estimulantes naturais e medicamentos e hormônios prescritos pela médica delas. O leite de Patrícia igualmente saudável, porque leite materno é leite materno e tem as calorias e nutrientes necessários para os bebês”, explicou a doula.

Ainda segundo a consultora de amamentação, o processo de estimulação da lactação é utilizado, também, em casos de mães adotivas que querem amamentar, por exemplo.

Parceria

Por fazer o processo de ordenha há mais tempo, Patrícia se habituou à amamentação mais rápido que a esposa.

“Para mim amamentar ainda está sendo complicado, porque Paty já tinha feito estimulação, mas comigo ainda é preciso ter cuidado para a pega ser perfeita, para não ferir o bico do peito, mas está sendo muito bacana e está doendo cada vez menos. Quando a coisa aperta, eu dou de mamar um pouco e Patrícia termina. Fazemos um rodízio de peitos para que ninguém se vicie em ninguém. Uma noite eu fico responsável por um bebê e na outra, pelo outro”, afirmou Lilianne.

Nos primeiros dias de vida, as mães, agora, brincam de perceber nos filhos características das duas. “Eles têm algumas características parecidas entre si e com cada uma de nós. Não sabemos qual foi do óvulo de quem, mas ficamos comparando e vendo as semelhanças com outros membros da família”, declarou Lilianne.

Mães amamentam juntas filhos gêmeos no Recife — Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press
Mães amamentam juntas filhos gêmeos no Recife — Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press

“Uma escolha dessas não é nada mais, nada menos que amor. Primeiro, por mim, depois, por nossa família. É uma ajuda e tanto, já parei algumas vezes para pensar e, se não fosse Patrícia, não sei o que seria. Ela fez muito por mim, por vontade de ajudar”, afirmou Lilianne.

Para continuar produzindo leite, Patrícia precisa fazer a estimulação com a bomba de sucção a cada três horas. Segundo ela, foi preciso se adaptar a esse processo.

“Eu trabalho muito em reuniões, viajando, e era sempre com a bolsinha de ordenha do lado e uma extensão de energia elétrica, todo mundo estranhava eu entrando no banheiro com a extensão. Às vezes, era em banheiro de shopping ou de hotel. Também era muito estranho desperdiçar o leite”, declarou a fisioterapeuta.

Segundo Patrícia, além da experiência de se tornar mãe com a mulher que ama, o nascimento dos dois bebês ensinou as duas a terem ainda mais companheirismo.

“Uma mulher se reconhece muito na outra, eu sei o que ela está sentindo de cansaço, dor, e por mais que participativo que seja o homem, ele não pode dar de mamar, por exemplo. Fico ainda mais solidária para com as mulheres que não têm rede de apoio, são mães solo ou não têm outra mulher do lado nessa caminhada”, afirmou Patrícia. (G1)

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