Nudez: Como deve este assunto ser abordado pelos pais?

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A nudez é ainda um tema tabu para muitos pais. Por isso mesmo, a psicóloga clínica Marta Martins explica ao site Crescer como é que esta questão deve ser abordada e dá a conhecer as diferentes etapas da curiosidade pelo corpo humano. Já diz o velho ditado que “de pequenino é que se torce o pepino” e é também de pequenino que começam as grandes curiosidades sobre diferentes questões. E o corpo humano é uma delas. Muitos pais ficam “encavacados” ou chegam mesmo a desconversar quando o tema “foge” para o cariz mais íntimo, como é exemplo a nudez.

Quando começam as difíceis questões

Segundo a psicóloga clínica Marta Martins é a partir de tenra idade que tudo começa a espoletar. «A partir dos três anos, as crianças vão percebendo que existem diferenças entre meninas e meninos, o que leva a perguntas embaraçosas, mas também à exploração do corpo do outro. Os rapazes, por norma, questionam: “Por que é que a mana não tem pilinha?”. Já as garotas tendem a ficar intrigadas a observar aquele órgão pendurado no corpo do pai, ou do irmão, procurando tocar e perguntar se também vão ter um igual».

A estas perguntas, muitas vezes “incômodas” e que pai e mãe “empurram” um para o outro, «há que responder de forma aberta, sincera, tranquila, mas resumida ao essencial.» «As crianças contentam-se com explicações simples, se sentirem que há detalhes omitidos no meio do nervosismo. Aí vão querer continuar a exploração. Caso não obtenham resposta às suas questões, é possível que venham a procurá-la noutros contextos, sem que os pais tenham controlo do que se passa», explica a especialista.

A entrada nos quatro/cinco anos…

Entre os quatro e os seis anos surgem as brincadeiras de médicos, em que as crianças se examinam mutuamente. «Trata-se de um comportamento de descoberta, sem conotação sexual, devendo haver preocupação dos pais apenas se estiverem envolvidos adultos ou crianças mais velhas. Também nesta fase surgem alguns constrangimentos para os adultos, sobretudo com meninos, quando começam a testar o alcance da urina. Tendem a ter outras brincadeiras, como o baixar as calças espreitando os pênis dos colegas. Aqui os educadores têm um papel fundamental na gestão destes comportamentos, evitando ridicularizar ou castigar as crianças», realça.

Mas há algo a realçar! Aos quatro anos é a altura de ensinar, de forma clara, que mais ninguém pode tocar-lhes nos genitais, exceto os pais ou outro adulto de confiança nas rotinas de higiene. E que se alguém o fizer, devem contar aos pais. «De salientar, que em qualquer idade, a ansiedade e a proibição por parte dos pais tendem apenas a reforçar o fascínio e a curiosidade. Do mesmo modo que se a criança se sentir envergonhada ou culpada, irá reprimir as suas questões, comprometendo um diálogo saudável e preventivo», adianta.

A exposição ao nu adulto:

De um modo geral, todos os assuntos devem ser encarados com naturalidade, sendo que a nudez não é, de todo, uma exceção. «Alguns pais encaram a questão da nudez diante da criança com muita naturalidade, outros optam por preservar a sua intimidade, não se colocando nus à frente dos filhos. Enquanto a criança for bem pequenina, estar vestido ou não, na sua presença, não faz qualquer diferença. Porém, à medida que ela for crescendo e se começar a interessar pelo corpo do adulto, lançando olhares, perguntas e mãos curiosas, o que era quotidiano, pode começar a causar incômodo e dúvidas nos pais» salienta.

Se para os pais, a sua própria nudez está isenta de qualquer inibição ou prazer, para a criança, estar perante um corpo adulto a descoberto, provoca sensações e sentimentos que ela não é capaz de nomear, como a excitação ou a identificação com o corpo do adulto. «Isto é-lhe bastante confuso. Por este motivo, a exposição gratuita ao nu adulto (incluindo publicidade, telenovelas, filmes, entre outros) deve ser evitada dos 3-4 anos até à adolescência. Fase em que adquirem um corpo semelhante ao do pai ou da mãe». 

No entanto, embora devam ser evitadas, há situações em que não há como fugir da nudez adulta perante a criança, como por exemplo num balneário de natação. «São situações esporádicas. No dia-a-dia devem privilegiar-se espaços privados para a intimidade de cada membro da família. Quando estes espaços privados são bem definidos e respeitados, a criança aprende que há coisas que são só suas e outras que podem ser partilhadas». Desta forma, «conhecendo os seus limites, a criança aprende a respeitar o próprio corpo e consequentemente o corpo do outro, evitando a confusão de sentimentos, a erotização precoce e situações de vulnerabilidade.»

Conversas abertas entre pais e filhos

Na nossa cultura, onde o nu é restrito a ambientes privados e até tabu, a nudez pode causar confusão quanto ao que pode ser benéfico ou não para a criança nas relações familiares e sociais. A criança vai-se deparar com a nudez nos mais diversos contextos: em casa quando a mãe ou o pai trocam de roupa, na televisão, na creche, na praia, em obras de arte, em templos religiosos, entre outros.

O que vai fazer toda a diferença é a forma como os adultos vão orientar a criança nesta questão. Independentemente da forma como encare a nudez «é muito importante que converse com a criança sobre o corpo, as diferenças anatómicas entre meninos e meninas e os limites relativamente ao toque no seu corpo. Sempre que haja oportunidade deve-se dedicar tempo a ensinar e orientar as crianças neste sentido. Esta educação sexual deve acontecer desde cedo e de forma contínua para que seja eficaz.»

Falar sobre nudez é saudável, educativo e necessário.

Existem alguns tópicos que não devem ser esquecidos e que a psicóloga clínica Marta Martins dá a conhecer:

– Ensinar à criança quais são as regras da sua família em relação à nudez e aos espaços em que isso pode acontecer;
– Deixar bem claro quem é que pode ajudar a criança nas questões de higiene e saúde;
– Relembre sempre o que são zonas íntimas, zonas nas quais ninguém pode tocá-la;
– Mostre-se sempre disponível para ouvir e para responder a perguntas. Valorize o diálogo e o tempo de qualidade com os mais novos.

É importante que os pais analisem as suas próprias crenças e valores para uma melhor orientação dos mais novos.

«Hoje em dia, as crianças são expostas a todo o tipo de informação, por isso mesmo, é importante que os pais tratem de temas mais sensíveis de forma natural. A forma como os pais tratam os assuntos durante a infância será a forma como o futuro adulto vai encarar as situações», finaliza a especialista.

(por Andreia Costinha de Miranda – Crescer Contigo)

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