Há quase três meses sem aulas por causa da pandemia do coronavírus, estudantes e profissionais de educação ainda não sabem quando voltarão a frequentar as escolas.
Diferentemente de estados que começaram a planejar o retorno das atividades escolares, o governo baiano ainda não se pronunciou sobre o assunto. No início deste mês, o governador Rui Costa prorrogou o decreto que suspende as aulas em todo o estado até o dia 21 de junho.
Um levantamento feito pelo G1 mostrou que, dentre as 26 capitais brasileiras e o Distrito Federal, três planejam o retorno para julho: Fortaleza, Manaus e Rio de Janeiro. A previsão de retorno para o próximo mês em alguns estados ligou o sinal de alerta para os profissionais baianos, que enxergam a medida com preocupação.
Coordenador-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado (APLB-BA), Rui Oliveira afirma que tem escutado rumores sobre um possível retorno na Bahia e rechaçou a possibilidade.
“Nós estamos acompanhando com muita perplexidade, porque temos, por princípio, o que o governo do estado também está adotando, salvar vidas. Então, se existe uma atividade que deve ser a última a voltar, deve ser a educação. Escola pública principalmente”, disse.
“É impossível. Isso é pressão de donos de escolas particulares. Nós não podemos expor vidas. Não tem preço. O mercado não vai impor essa realidade”, afirmou.
Procurada pela reportagem, a Secretaria Estadual de Educação afirmou que ainda não há nenhuma informação sobre volta às aulas. Disse ainda que nada será feito sem diálogo com os diversos segmentos da educação.
O governo do estado trabalha em um protocolo de retorno às aulas. Até o momento, houve duas reuniões com o sindicato. Uma terceira está programada para a próxima semana.
A preocupação dos profissionais de saúde se justifica pela curva de contaminação no país, que continua a crescer. O Brasil registra quase 700 mil casos de coronavírus confirmados, com mais de 36,4 mil mortes.
Na Bahia, são mais de 28 mil casos e quase 900 mortes. Diante desse cenário, Rui Oliveira considera inviável que o retorno às aulas aconteça no mês de julho como nos outros estados.
“Já pensou o que é voltar as aulas com 800 mil alunos só da rede estadual? Esses meninos pegando transporte público, se contaminando e contaminando todo mundo? Vai ser a segunda onda de Covid-19 na Bahia e no Brasil. É inadmissível isso”, disse Rui Oliveira.
O coordenador-geral não descarta a possibilidade de greve, caso os professores não se sintam seguram em retornar às salas de aula quando a medida for anunciada.
“Fizemos uma consulta a 10 mil professores da rede pública. A posição da APLB é que, enquanto tiver qualquer período de contágio, nós não voltaremos a frequentar as escolas de forma normal”, disse.
“Iremos fazer uma campanha e ninguém vai dar aula. Vai ter greve pela vida”, garantiu.
A Bahia tem mais de 800 mil alunos matriculados na rede pública de ensino. A realidade da professora Magali Menezes, que leciona Educação Física em um colégio localizado em Plataforma, Subúrbio Ferroviário de Salvador, é de um ambiente propício à aglomeração de pessoas.
“Eu trabalho em uma escola em que tenho 45 alunos por sala e não consigo arrastar minha carteira para sentar, não tem ventilação, apenas um ventilador de teto, que às vezes funciona, às vezes não”, disse.
“Eu trabalho em uma escola em que, há cinco anos, nós pedimos uma porta para que a intervenção no corredor não dificulte o trabalho do professor dentro da sala, e não conseguimos”, contou.
Em entrevista no mês de maio concedida ao G1, o secretário de educação, Jerônimo Rodrigues, adiantou que estudava a implementação de um rodízio de alunos no momento em que fosse anunciada a retomada das aulas, com alguma prioridade para os alunos do 3º ano, em razão do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Embora tenha deixado claro que não havia uma previsão, o retorno poderia acontecer em julho ou agosto.
Para a professora Magali Menezes, até mesmo o esquema de rodízio será difícil de ser implantado em algumas escolas.
“Como a gente vai conseguir fazer um rodízio de 40 turmas até o ano acabar? O rodízio continuaria e a gente não conseguiria atender à demanda de todos os alunos. O ano acabaria e entraríamos pelo outro, que provavelmente é o que vai acontecer. Vamos ter que enxugar 2020 junto com 2021 e fazer um ano só”, disse.
“Como a gente vai conseguir organizar uma escola com 2 mil alunos funcionando em rodízio? A prioridade seria o 3º ano, porque eles teriam o Enem pela frente. Mas e os outros?”, questiona Magali.
A professora de Educação Física também se preocupa com a qualidade do ensino ofertado diante de um calendário tão apertado.
“Vai ser prejudicial, porque teremos que deixar de dar conteúdo para suprimir o tempo perdido. Como vou conseguir dar todo o meu conteúdo em 30 dias? O mais provável é que não vai ter férias e teremos que emendar um ano no outro”, afirmou. (G1)