Bots e respostas automatizadas produzidas pelo ChatGPT circulam sem restrição no X, uma vez que Elon Musk desmontou a equipe de moderação de conteúdo da rede social e desmantelou as ferramentas de verificação usadas por jornalistas e pesquisadores, desde que comprou a plataforma em outubro de 2022.
A administração de Musk completou 22 meses três dias antes de a plataforma ser bloqueada no Brasil, durante madrugada de sábado (31). Uma das promessas do bilionário, durante o processo de aquisição, foi de acabar com a farra de robôs que, na avaliação dele, empesteava o antigo Twitter.
Bots que respondem autoridades públicas com indícios de uso de inteligência artificial (IA) são um exemplo da crise atual. Os perfis, verificados, têm preferência no algoritmo da rede e aparecem no topo da lista de respostas às publicações de chefes de Estado.
A reportagem encontrou 20 contas que faziam milhares de postagens em diversos idiomas. Em algumas delas, apareciam frases comuns em respostas do ChatGPT, como “até a data limite do meu conhecimento” e “como um modelo de linguagem de IA”.
Um desses perfis, o do israelense Tomer Rozenberg, em um só dia fala francês com o premier canadense Justin Trudeau, comenta em português feitos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e conversa em alemão com o diretor-geral da OMS (Organização Mundial da Saúde), Tedros Adhanom.
Rozenberg afirmou à Folha de S.Paulo que produz respostas a autoridades de todo o mundo com o ChatGPT. Com a tática, o escritor de autoajuda conseguiu 20 milhões de visualizações e 3.700 seguidores em três meses. Ele espera usar esses ativos para divulgar seu trabalho.
O perfil do presidente Lula é um dos preferidos pelas contas automatizadas. Dos 163 tweets que o petista fez nos 23 primeiros dias de julho, 97 tinham respostas de perfis estrangeiros auxiliados pelo ChatGPT.
Entre as 18 contas que interagem com Lula usando IA encontradas pela Folha de S.Paulo, havia indianos, sauditas, um argentino, um americano e o israelense Rozenberg.
Responder contas de grande projeção, seja de forma automática ou manual, é um método conhecido para atrair atenção para o próprio perfil, segundo Guilherme Felitti, fundador da empresa de análise de dados NoveloData.
“Sempre que alguém abrir um post de qualquer celebridade, as respostas dos verificados estarão lá e uma nação de desconhecidos poderá vê-las”, afirma.
“Alguém cria scripts para ler o post original e gerar uma versão repaginada da mesma publicação”.
A reportagem acompanhou por três dias a peregrinação do robô “TopDastan”, que vagava pelo X distribuindo respostas automáticas em inglês e árabe. A conta frequentemente repetia “como um modelo de linguagem de IA” e “Olá, em que eu posso te ajudar?”
No período entre 20 e 22 de julho, o bot respondeu a 991 publicações de 293 perfis do Twitter e abordou assuntos como esportes, política, notícias, saúde, bem-estar, religião, cultura e tecnologia. A tática rendeu à conta cerca de 1,7 milhão de impressões em 72 horas.
Outras contas falsas distribuem mensagens privadas na rede social de Musk. Ao passar dois meses com a caixa de entrada aberta, a Folha de S.Paulo recebeu 13 contatos de perfis com fotos femininas, cujo objetivo era divulgar conteúdo sexual explícito, NFTs (artigo digital hoje depreciado) e jogos de apostas.