Após explosão de fogos em 1998, governo recebe ideias de políticas públicas para S. A. de Jesus

Criação de plataforma online permite que cidadãos de Santo Antônio de Jesus e região possam apresentar ideias e propostas para a construção de políticas públicas que reparem os danos causados a toda a sociedade com a maior tragédia trabalhista da história do estado.

A explosão da fábrica de fogos que matou 64 pessoas, a maioria mulheres e crianças, ainda tem cicatrizes profundas na maior cidade do recôncavo baiano. O caso chegou à Corte Iteramericana de Direitos Humanos, que determinou a criação de políticas reparadoras por parte do estado.

Depois de duas audiências públicas promovidas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Justiça do Trabalho, chegou a vez de construir a política estadual de reparação. Para isso, o governo do estado promoveu na semana passada a Escuta Popular, evento de dois dias com a participação de representantes de diversas instituições e aberto à população em geral. Presencialmente, equipes da Secretaria do Planejamento do governo estadual, que promove a ação junto com a Secretaria da Justiça e Direitos Humanos (SJDH), colheram ideias, sugestões e propostas, que seguem sendo cadastradas pela plataforma escutasaj.ba.gov.br/.

Para o procurador André Pessoa, “é fundamental que a escuta seja efetiva, inclusiva e que os interesses da população de Santo Antônio de Jesus sejam de fato considerados para a definição do Programa de Desenvolvimento Socioeconômico de Santo Antônio de Jesus. Ações compensatórias e de definição de novos rumos socioeconômicos precisam ser definidas com a participação da comunidade. Colher das pessoas as propostas, as prioridades, as necessidades mais urgentes e relevantes é sem dúvida parte do caminho para a reparação às vítimas e a toda a sociedade do recôncavo pela tragédia com a fábrica ilegal de fogos de artifício.” Durante os dois dias de atividades, técnicos da Seplan e especialistas de diferentes secretarias do estado atuaram como facilitadores, ouvindo as necessidades da comunidade e elaborando propostas para avançar no plano de reparação com foco no desenvolvimento social da região.

A construção de creches em tempo integral; a ampliação do número de Centro de Referência de Assistência Social (Cras); o incentivo à produção agroecológica; a formalização das mulheres empreendedoras e a ampliação da fiscalização sobre a fabricação e a comercialização de fogos são algumas das ideias registradas na fase presencial da escuta. Parte dessas ações já vem sendo implementadas por meio da mobilização de diversos órgãos e sociedade civil. A prefeitura local já tem um termo de ajuste de conduta firmado com o MPT em julho de 2023 e recentemente entrou com uma ação judicial que já determinou por liminar a suspensão da produção e venda de fogos pelo maior grupo clandestino que atuava na região.

Luta incansável – A presidente do Instituto 11 de Dezembro, Rosa Rocha, representando o movimento criado pelos familiares das vítimas da explosão da fábrica de fogos, esteve presente e ressaltou a importância do momento. Segundo ela, a escuta social não é apenas uma formalidade, mas uma consequência da condenação. “É uma luta incansável de quase 26 anos. Essa escuta social não está acontecendo por acaso; é um cumprimento de sentença. Será um programa de desenvolvimento para Santo Antônio de Jesus e para toda a região. A gente não consegue mensurar a grandeza da responsabilidade que é esse plano”, afirmou.

Para fornecer um panorama sobre a situação socioeconômica do município e da região, a equipe da Superintendência de Planejamento Estratégico da Seplan apresentou um diagnóstico, destacando que 53,4% da população é composta por mulheres negras, com faixa etária entre 35 e 39 anos. Considerada uma cidade de porte médio e a 18ª mais populosa da Bahia, segundo dados do Censo 2022 do IBGE, Santo Antônio de Jesus enfrenta desafios que exigem atenção especial em áreas como inclusão, educação, saúde e emprego, principalmente para mulheres e jovens.

Oportunidades – A juíza Viviane Martins, representante do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (TRT5), também pontuou as condições de vulnerabilidade e a desigualdade enfrentadas pelos moradores do município. Ela destacou a importância de uma resposta articulada que integre as vítimas e proponha alternativas de subsistência fora das atividades de alto risco, como a fabricação de fogos. “A sentença prevê a elaboração de um plano que conecte essas situações e ofereça alternativas, incluindo oportunidades nas áreas de comércio agropecuário, informática, combate à evasão escolar e outros setores, para evitar que as pessoas voltem a ser exploradas em atividades perigosas”, afirmou Martins.

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