A Justiça Federal decidiu que os acusados de serem responsáveis pela tragédia de Mariana (MG) não poderão ser julgados por homicídio e por lesão corporal. A ação movida em 2016 pelo Ministério Público Federal (MPF) deve prosseguir considerando apenas os crimes ambientais de desabamento e de inundação, que também são previstos no Código Penal. Fica descartada a possibilidade de júri popular, que só pode ocorrer quando são julgados crimes contra a vida.
Na tragédia de Mariana, ocorrida em novembro de 2015, 19 pessoas morreram após o rompimento de uma barragem da mineradora Samarco, joint-venture da Vale e da anglo-australiana BHP Billiton. Nenhuma prisão, nem de caráter temporário, foi realizada.
Em nota divulgada nessa sexta-feira (26), o MPF disse respeitar a determinação judicial, mas lamentou que ela tenha sido tomada em um julgamento de habeas corpus, pois tal instrumento não se destinaria à análise de provas. O trancamento de todo o processo para os crimes de homicídio e de lesão corporal foi decidido de forma unânime, na terça-feira (23), por três desembargadores da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).
A decisão foi tomada durante o julgamento de dois pedidos de habeas corpus apresentados por Sérgio Consoli e Guilherme Ferreira, executivos da BHP Billiton que figuram como réus. O voto do relator Olindo Menezes foi acompanhado pelos desembargadores Cândido Artur Medeiros Ribeiro Filho e Néviton Guedes. Eles entenderam que o MPF narra na ação o crime de inundação sem apontar elementos para configurar homicídio.
“As mortes e as lesões corporais são descritas na denúncia como resultado do crime de inundação, crime de perigo comum, ao reconhecer a peça que o fato (ou a conduta) teve caráter indeterminado e sem destinatário específico, o que desautoriza (tecnicamente) a imputação autônoma de homicídio (concurso formal), que imprescindiria da demonstração de que o (suposto) crime de inundar teve por objetivo final a morte de determinado indivíduo”, diz a decisão.
O MPF afirma que a acusação de homicídio tinha amplo respaldo nas provas dos autos. Em nota, a entidade afirma que as mortes, assim como o desmoronamento da barragem e a inundação, foram previstas pelas mineradoras, mas os riscos teriam sido ignorados num contexto em que prevaleceram outros fatores, como aumento dos lucros.
“Todos os resultados – desmoronamento, inundação, danos socioambientais e mortes – foram cabalmente previstos pelas empresas, tendo sido registrados em relatórios e atas de reuniões, conforme inclusive prova um documento em especial: relatório interno da Samarco previa, em caso de rompimento da barragem, a possibilidade de causação de até 20 mortes. Essa previsão mostrou-se assustadoramente correta, já que 19 pessoas perderam a vida em decorrência do rompimento”, registra o texto.