“Pele Negra, Máscaras Brancas”, peça inspirada no livro de mesmo nome do autor Frantz Fanon, representa um marco simbólico na Bahia: é o primeiro espetáculo da Companhia de Teatro da Universidade Federal da Bahia (UFBA) dirigido por uma mulher negra. A peça estreou no dia 18 de março, no Teatro Martim Gonçalves, e no domingo (14) em duas sessões lotadas, na sala principal do prestigioso Teatro Casto Alves (TCA). O espetáculo tem um elenco predominantemente negro. Dentre eles, está o santoantoniense Iago Gonçalves, 27 anos, prestes a iniciar o sexto semestre do curso de Licenciatura em Teatro da UFBA.
“Esta é uma experiência grandiosa para a minha carreira profissional. Esse espetáculo está falando da subjetividade negra e como o negro é exposto e vivencia a sociedade”, comenta. Iago reside em Salvador desde 2014, ano em que se aventurou na carreira artística na capital, realizando cursos livres de teatro, antes mesmo de cursar o ensino superior.
Para o ator, estar inserido no espetáculo e contribuir com esta adaptação é importante para a carreira, mas também pessoalmente. “Quando estudei Fanon e me reuni com o grupo para falar sobre as subjetividades negras, fui tocado sobre como a dor do outro era igual à minha”, confidencia. “Falar para os meus irmãos de cor e movimentar toda essa população, mostrar que o teatro negro tem público, sim, é muito importante”, acrescenta.
Gonçalves sempre frequentou a escola pública e seus familiares residem na Urbis 4, em Santo Antônio de Jesus. Ainda no ensino médio, o jovem se destacou ao lado do artista visual e amigo Marcos Borges ao vencer o projeto Tempos de Arte Literária (TAL), no estado. Antes de se mudar para Salvador, Iago participou ativamente do Grupo de Teatro La Barraca, da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) campus, e no qual ainda colabora eventualmente.
Espetáculo
No dia em que foi exibida no TCA, a fila para “Pele Negra, Máscaras Brancas” já era grande às 7h da manhã – a peça começaria às 11 horas. O “Domingo no TCA”, com ingresso a R$1, precisou realizar uma sessão extra porque no horário previsto a maioria das pessoas que aguardava não caberia na sala principal com capacidade para 1554 pessoas. Uma terceira sessão só não aconteceu porque a programação do teatro já estava completa.
No domingo, Iago Gonçalves acordou às 5 horas da manhã com “frio na barriga”. Enquanto caminhava, botou a playlist para tocar e ouviu “Levanta e Anda”, do cantor Emicida. Os versos “Quem costuma vir de onde eu sou/ Às vezes não tem motivos pra seguir”, desta vez, não ecoaram tão forte quanto o refrão: “(…) o sonho te traz/ Coisas que te faz prosseguir”.
“Esse espetáculo foi montado por Onisajé de uma forma que cada um tem o seu momento, a sua forma de se expressar, o que traz um protagonismo a todos na peça”, salienta Gonçalves. “Isso é teatro preto: é enaltecer o trabalho do outro. A gente não teria outra oportunidade, a não ser num trabalho subalterno, que reforçasse os estereótipos do negro”, ressalta.
O espetáculo “Pele negra, Máscaras Brancas” aborda os impactos do racismo pessoal, interpessoal e institucional nas vidas e mentes de pessoas negras. A peça tem a primeira mulher negra, Onisajé (Fernanda Júlia), natural de Alagoinhas, como diretora pela Companhia de Teatro da UFBA, fundada em 1981. De modo semelhante a outras obras da dramaturga, “Pele Negra” traz o aprendizado dos mitos e deuses africanos.
Ficha técnica:
Direção: Onisajé (Fernanda Júlia)
Texto: Aldri Anunciação
Elenco: Iago Gonçalves, Igor Nascimento, Juliette Nascimento, Manu Moraes, Matheus Cardoso, Matheuzza, Rafaella Tuxá, Thallia Figueiredo, Victor Edvani, Wellington Lima
Co-direção: Licko Turle
Assistência de direção: Fabíola Nansurê
Orientação de pesquisa: Alexandra Dumas e Licko Turle
Colaboração em Pesquisa: Cássia Maciel, Edson César e Lucas Silva
Estudantes-pesquisadores: Camila Loyasican, Juliana Bispo, Juliana Luz, Juliana Roriz
Trilha sonora: Luciano Salvador Bahia
Preparação Vocal: Joana Boccanera
Coreografia e Preparação Corporal: Edileusa Santos
Cenografia, Figurino e Maquiagem: Thiago Romero e Tina Melo
Desenho de luz: Nando Zâmbia
Produção: DA GENTE Produções
Direção de produção: Luiz Antônio Sena Jr
Produção executiva: Anderson Danttas e Bergson Nunes
Assistência de produção: Eric Lopes
Assessoria de Imprensa: Theatre Comunicação
Design Gráfico: Diego Moreno
Registro Fotográfico: Andréa Magnoni
Realização: Escola de Teatro – PROEXT – UFBA
Texto: Edvan Lessa