Bebês Reborn custa cerca de R$ 1.500 em Salvador: Entre o afeto, a arte e a polêmica

Trata-se dos bonecos hiper-realistas, conhecidos também como “bebês reborn”.

Foto: Valter Campanato / Agência Brasil

O que antes era visto como uma simples brincadeira de “pai” e “mãe” ganhou contornos mais profundos e complexos. A prática infantil de simular a vida adulta com bonecas e bonecos ultrapassou a infância e hoje movimenta um mercado voltado para todas as idades: o dos bebês reborn.

Esses bonecos hiper-realistas, produzidos com riqueza de detalhes que imitam o peso, a textura, os traços e até o cheiro de recém-nascidos reais, viraram objeto de desejo de colecionadores, artistas e pessoas em busca de conforto emocional. No entanto, a popularidade dos reborns também despertou controvérsias — e, mais recentemente, até propostas legislativas.

Quando a Brincadeira Ganha Novos Significados

O fenômeno voltou ao centro das atenções após uma jovem baiana de 25 anos procurar atendimento médico de urgência para seu bebê reborn. O caso, ocorrido em uma UPA, gerou debate nas redes sociais e reacendeu discussões sobre os limites do afeto e da saúde mental no uso dos bonecos. Segundo familiares, a jovem teria adquirido o boneco pela internet por R$ 2.800.

Em resposta a situações como essa, um projeto de lei protocolado na Assembleia Legislativa da Bahia propõe proibir atendimentos médicos a bonecos reborn em unidades públicas de saúde, além de aplicar multas e impedir o uso desses objetos para obtenção de benefícios voltados a crianças de colo.

Uma Arte em Crescimento

Para quem produz os bebês reborn, no entanto, a prática está longe de ser apenas uma brincadeira. A artesã Rosana Mascarenhas, da Maternidade Zana Reborn, explica que o trabalho é artesanal, meticuloso e pode levar de 15 a 30 dias para ser concluído.

“Trata-se de uma arte. Cada fio de cabelo é implantado manualmente, os olhos podem ser de vidro ou acrílico, e o realismo é o principal diferencial. Os preços começam em R$ 1.500, mas variam conforme os materiais”, afirma Rosana.

Segundo dados do Sebrae, o setor de brinquedos — que inclui os bebês reborn — tem crescido na Bahia. Em Salvador, 24 empresas atuam no ramo, com destaque para microempreendedores individuais.

O Lado Psicológico: Conforto ou Alerta?

A psicóloga Amanda Sacramento, do Conselho Regional de Psicologia (CRP-BA), vê o fenômeno como multifacetado. Ela destaca o conceito de “estranho familiar”, de Freud, para explicar o desconforto que os bonecos podem causar.

“Uma boneca normalmente remete ao lúdico, mas quando se parece demais com um bebê real, pode gerar angústia. Isso mexe com o nosso inconsciente coletivo”, explica Amanda. Para ela, os reborns também podem representar formas de elaborar perdas, preencher vazios afetivos ou simbolizar o desejo pela maternidade.

Amanda alerta ainda para a forma como o tema tem sido tratado nas redes sociais. “A dor virou espetáculo. A mulher com a boneca vira meme, vídeo de deboche. Isso é violência simbólica. Precisamos olhar para essas histórias com mais empatia e envolver outras áreas do conhecimento, como o Serviço Social e a Medicina”, defende.

Limites Jurídicos: Quando o Afeto Encontra a Lei

Mesmo com o valor simbólico e emocional atribuído aos bebês reborn, a legislação brasileira não os reconhece como sujeitos de direito. Casos envolvendo disputas judiciais pela “guarda” de bonecos têm surgido, mas não têm respaldo legal.

“Os bebês reborn não possuem registro civil, não podem ser incluídos como dependentes em planos de saúde, nem gerar direitos como licença-maternidade ou pensão por morte”, explica a advogada Carina Gomes.

Segundo ela, o afeto que une uma pessoa a um reborn pode ser real, mas não tem efeito jurídico. “Não há vínculo legal reconhecido. O limite é o próprio conceito de fato jurídico.”

Um Tema que Pede Reflexão

Os bebês reborn escancaram fronteiras entre o real e o simbólico, entre a saúde mental e o afeto, entre a arte e a necessidade de conforto. Para alguns, são apenas brinquedos sofisticados; para outros, representam laços, histórias e afetos que não encontram espaço em outros lugares.

O debate, que já chegou ao campo político e jurídico, ainda está longe de um consenso — mas levanta questões importantes sobre como a sociedade lida com o luto, a solidão e a subjetividade do afeto.

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