Com fim do auxílio, país deve perder mais de R$ 60 bi de massa salarial

Fila para recebimento do auxílio: fim do benefício deverá provocar redução da massa salarial (Bruna Prado/Getty Images)

O auxílio emergencial, pago a mais de 66 milhões de brasileiros no ano passado, representou uma massa salarial ampliada em 326 bilhões de reais, segundo um estudo inédito do banco Santander.

O Benefício Emergencial para Preservação do Emprego e da Renda (BEM), que permitiu a redução da jornada de trabalho e do salário com o objetivo de preservar empregos, também contribuiu para esse resultado. De acordo com o Ministério da Economia, o BEM atendeu 10 milhões de trabalhadores e 1,5 milhão de empresas.

Não fossem os programas de auxílio à população e às empresas, a perda de massa salarial ampliada, que inclui todas as fontes de renda dos trabalhadores, teria sofrido uma queda de 6,6% em 2020, de acordo com o levantamento do Santander. Com o pagamento dos benefícios, houve um aumento de 2,8% da massa salarial no ano passado, que somou 916,25 bilhões de reais.

Com o fim dos benefícios, a previsão para este ano é de uma queda de mais de 60 bilhões de reais da massa salarial ampliada. “A retirada dos programas já era prevista, por se tratar de uma questão emergencial de 2020, e sinaliza uma vontade do governo de arrumar a questão fiscal, mas não deixa de ter um impacto no cenário macroecônomico”, analisa Lucas Maynard, economista do Santander.

Ainda assim, a expectativa é de uma alta no consumo das famílias de 2,1%, ante uma queda de 4,3% no ano passado, de acordo com o Santander. As projeções, no entanto, dependem de uma série de fatores, entre eles a intensidade da segunda onda de covid no país, o início do calendário de vacinação e a questão fiscal. O desemprego também deve entrar nessa equação.

“Muitas pessoas que não procuraram trabalho em 2020, em razão do fechamento da economia e do recebimento do auxílio, devem fazer isso em 2021, engrossando a taxa de desemprego”, diz Lucas Maynard, economista do Santander.

O aumento no número de casos do coronavírus é outro fator de preocupação. Caso o crescimento de internações hospitalares em razão da pandemia atinja níveis semelhantes aos observados nos Estados Unidos, na Europa, no Japão e em outros países, é possível que estados e munícipios tenham de restringir a circulação de pessoas e o funcionamento de determinadas atividades.

Nas regiões do país mais atingidas pela segunda onda da covid, esse temor já vem se tornando uma realidade. O governo do Amazonas decretou nesta segunda-feira, dia 4, o fechamento de todos os serviços não essenciais — a medida é válida por 15 dias.

“A tendência é que mais medidas restritivas sejam tomadas com o novo avanço da pandemia no Brasil, como já aconteceu em outras partes do mundo”, avalia Christopher Garman, diretor para as Américas da consultoria Eurasia. “O impacto da retirada do auxílio emergencial e o tamanho da segunda onda no Brasil são os principais fatores que devem impactar a economia e a política no país neste ano”, afirma.

Há ainda outros motivos de incerteza, como a pressão inflacionária e os reajustes que deverão ser praticados pelo setor de educação, represados no ano passado. A intenção de investimento das empresas também está em pauta.

Nas próximas semanas, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) deverá lançar o levantamento do apetite por inversões das empresas do setor previstos para este ano. “Com dados como esses em mãos, será possível ter uma noção mais clara sobre o comportamento da economia em 2021”, diz Renato da Fonseca, gerente executivo de economia da CNI.

Em um cenário positivo, a continuidade da recuperação econômica e o bom encaminhamento da questão fiscal, com uma possível atração de investimentos, devem compensar a retirada do auxílio. “A aprovação da reforma administrativa e tributária também deverá acrescentar elementos estruturantes à macroeconomia”, afirma Fonseca.

Do lado negativo, não há mais espaço para gastos com medidas extraordinárias para fazer frente a um eventual novo impacto do coronavírus sobre a economia. “O Brasil gastou mais do que outros países emergentes e a conta socioeconômica e política provavelmente será paga neste ano”, diz Garman. (Exame)

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