A popularização de bancos digitais aumentou o acesso ao sistema financeiro por uma parcela da população que antes não usufruía de produtos e serviços bancários, e em muitos casos sequer possuía conta-corrente. Segundo pesquisa do Instituto Locomotiva, cerca de um em cada cinco brasileiros têm conta em bancos digitais e 30% estão nas classes D e E. Esse crescimento foi acelerado pela necessidade de distanciamento social decorrente da pandemia e muito bem aproveitado pelas inúmeras fintechs (empresas que oferecem serviços financeiros), que prometem significativa redução ou isenção de taxas, além de facilidades de acesso aos serviços sem burocracia. O lançamento do sistema Pix como meio de pagamento, no final de 2020, facilitou ainda mais as transações bancárias e foi um sucesso de adesão desde sua criação. Contudo, a inclusão da população no sistema financeiro e a diminuição das burocracias abriram espaço para novas oportunidades de fraudes, baseadas em engenharia social, isto é, em ganhar a confiança da vítima para em seguida aplicar golpes.
Um golpe ficou famoso com o nome de “Robô do Pix” e chegou a ser promovido por subcelebridades e influenciadores digitais. Prometia-se retorno garantido de 100% de lucro após a vítima transferir determinada quantia via Pix. Via de regra, a vítima começa transferindo quantias pequenas e o fraudador de fato envia de volta o valor em dobro prometido. Assim que a vítima ganha confiança e transfere um valor mais alto, o fraudador deixa de retornar e bloqueia toda forma de contato. Outro golpe conhecido como “Bug do Pix” foi divulgado nas redes sociais, afirmando que existe uma falha no sistema PIX que permite às pessoas receberem um prêmio em dinheiro se transferirem qualquer quantia para uma chave específica. Obviamente, o dinheiro vai direto para a conta do golpista e jamais é recuperado.
Mais uma forma de golpe foi divulgada com o nome de “Urubu do Pix”, realizada durante transmissões piratas de jogos ou reality shows, em que o golpista organiza uma espécie de leilão e incentiva as pessoas a realizarem transferências para uma determinada chave, prometendo que quem fizer o maior pagamento leva o total do valor arrecadado. É comum que a transmissão caia inesperadamente, levando todo o dinheiro junto, e mais comum ainda que o suposto ganhador seja o próprio golpista. Para além do uso do Pix, recentemente houve um aumento das notícias do chamado “Golpe do Entregador” ou “Golpe do Presente”. O fraudador aborda a vítima em sua residência se passando por entregador de aplicativo, alegando que deve entregar uma encomenda ou um presente. Em seguida, pede que seja feito pagamento de um valor simbólico na máquina de cartão de crédito, apenas para cobrir o frete. Aproveitando-se da distração da vítima, faz com que seja passada quantia consideravelmente maior, havendo relatos de perdas na casa das dezenas de milhares de reais. Outra armadilha é a clonagem do aplicativo de WhatsApp, pelo qual os criminosos instalam o perfil de usuário da vítima em um aparelho diverso, passando a chamar os contatos de parentes e amigos pedindo transferências de dinheiro. Para que haja a clonagem, o criminoso precisa de um código, enviado para o celular original da vítima. Então, é importante não informar códigos ou outras informações sobre o seu WhatsApp, mesmo se for para um conhecido — pode ser um criminoso se passando por ele.
Há quem tente responsabilizar as instituições financeiras por esses prejuízos. Contudo, cabe relembrar que os bancos não têm como impedir a realização de transações realizadas voluntariamente pelo consumidor, ainda que decorrente de golpes. Os bancos não têm obrigação contratual de contatar cada cliente a cada transação realizada, mesmo que estas tenham se afastado do perfil de operações. O Código de Defesa do Consumidor determina, em seu artigo 14, §3º, que o fornecedor de serviços bancários não será responsabilizado quando provar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, o que é exatamente o caso desses golpes. Os tribunais têm seguido o CDC e não condenam os bancos a ressarcirem qualquer quantia nos casos em que o consumidor realiza a transferência voluntariamente, ainda que mediante engano, por ter contribuído ativamente para a concretização do golpe.
O que todos esses golpes têm em comum é que somente são concretizados após o criminoso ganhar a confiança da vítima e fazer com que esta voluntariamente transfira o dinheiro ou forneça informações confidenciais. Portanto, a única forma de garantirque não haja esse tipo de prejuízo é educar-se para garantir a proteção patrimonial, não acreditar em promessas de ganho fácil e não compartilhar dados bancários e informações pessoais em hipótese nenhuma. Nenhuma aplicação traz retorno rápido e milagroso, e qualquer investimento deve ser feito apenas em instituições financeiras sérias e regularmente credenciadas no Banco Central. (JP)