Além de ter causado milhões de mortes ao redor do planeta por sua condição agressiva ao trato respiratório e físico, a Covid-19 também gera preocupações na área de saúde mental.
Inserida em um contexto de isolamento social, desemprego, perda de renda, morte de pessoas próximas e com medo de adoecer, a população mundial apresenta, de forma geral, aumento nos casos de ansiedade, depressão, estresse pós-traumático e até mesmo demência.
Não bastasse isso, especialistas indicam que o próprio coronavírus pode penetrar no Sistema Nervoso Central (SNC) e causar distúrbios. Essa situação está sendo denominada de “quarta onda”.
“Há evidências de que o novo coronavírus pode penetrar no SNC através da via olfatória ou circulatória, bem como pode ter um impacto indireto no cérebro, devido à tempestade de citocinas (inflamação). Relatos mostram que os pacientes com Covid-19 podem apresentar manifestações neurológicas como doença cerebrovascular aguda (AVC), distúrbio da consciência, distúrbios do paladar e olfatório”, afirma o psiquiatra Lúcio Botelho, membro da Sociedade Internacional de ECT e Neuroestimulação (ISEN). Ele também é diretor-médico do mais antigo hospital psiquiátrico de Salvador, o Espaço Nelson Pires, e diretor-médico, idealizador e co-fundador da OMNI – Centro de Terapias Biológicas.
Essas alterações na consciência “costumam ocorrer durante a infecção, principalmente em pessoas vulneráveis, como idosos que já têm condição para desenvolver estado confusional”, explica o psiquiatra.
Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), com a participação de psiquiatras de 23 estados e do Distrito Federal, revela que 47,9% dos entrevistados perceberam aumento em seus atendimentos após o início da pandemia. Além disso, 67,8% dos médicos afirmaram que receberam pacientes que nunca haviam apresentado sintomas psiquiátricos antes. O agravamento de quadros em seus pacientes foi relatado por 89,2% dos entrevistados.
A principal preocupação é que essas condições causem problemas mais graves, como o suicídio. Atualmente, essa é a segunda maior causa de morte do mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), com 800 mil óbitos anuais. No Brasil, entre 2010 e 2016 a taxa de pessoas que tiraram a própria vida cresceu 7%, indo na contramão da tendência mundial, que diminuiu 9,8%.
“A gente já tem um número bastante alto. Com a quarta onda, que é essa perspectiva de aumento dos transtornos mentais, existe uma tendência de doenças e isso está relacionado ao suicídio. Há um aumento exponencial de depressão e ansiedade. Consequentemente, é possível que haja aumento no índice de suicídio, até porque as pessoas estão presas em suas casas”, lamenta Lúcio Botelho.
CUIDE-SE
Para tentar contornar esses problemas, o Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou, durante a pandemia, o atendimento psiquiátrico via telemedicina. “Foi importante porque possibilitou o acesso ao cuidado de saúde. E não só pessoas do centro urbano, mas quem mora no interior tem acesso difícil ao psiquiatra. Sem falar na assistência psicológica. A interação social com a tecnologia que temos disponível foi importante para desafogar essa angústia”, explica o psiquiatra.
Outra coisa que ajuda é ajustar a rotina para melhorar a saúde mental. “Muitas coisas que podemos fazer em casa por conta própria é um sono regular e num horário adequado, a prática de exercício físico aeróbico, se manter em contato com outras pessoas. Muitas vezes a pessoa ou tem vergonha ou não consegue quebrar a barreira do silêncio. Então conversar com outras pessoas já é ajuda, mesmo que seja com parentes e amigos próximos. Uma alimentação saudável também é essencial”, afirma Lúcio.
Segundo ele, o sono adequado varia de pessoa para pessoa. Enquanto crianças e idosos tendem a dormir menos, adultos e jovens normalmente dormem mais. O ideal é ter a sensação de estar recuperado ou recuperada após uma noite de sono. (BN)