Do alto da MG-050, que margeia os cânions do lago de Furnas, a diarista Vera Lucia Ferreira da Silva, 53, lembrava neste domingo (9) os minutos seguintes à queda de parte de um cânion que testemunhou.
“As equipes de resgate não haviam chegado. Só havia um jet-ski ajudando a tirar o pessoal da água e colocando em um paredão. Pegaram o nosso gelo para estancar sangue [das vítimas]”, disse ela.
Por volta das 15h30, alguns turistas tomavam chuva na beira da rodovia na tentativa de acessar com os olhos o ponto exato da tragédia, algo impossível devido ao relevo.
A professora Talita Nóbrega, 33, moradora de Assis Chateaubriand (PR), disse que seu grupo já estava na lagoa há algum tempo e retornava para a região dos cânions, quando foram avisados sobre o acidente.
“Nós passamos pelo local antes. Estávamos voltando quando nos avisaram do que havia acontecido. É terrível. Arrepiador. Andar de lancha é bom, o passeio é bom, mas tem risco. [Agora] só longe dos paredões”.
O empresário carioca Carlos Storani, 52, e mais oito amigos navegariam neste domingo pelo local. “Nosso passeio era hoje, mas foi cancelado.”
Nas águas abaixo, os mergulhadores dos bombeiros localizaram mais três corpos de vítimas do acidente de sábado (8), que matou dez pessoas. Não há mais desaparecidos.
Todas as vítimas estavam na lancha Jesus. Era um grupo de nove amigos -quatro da mesma família-, além do piloto Rodrigo Alves dos Anjos, 40.
Os corpos foram encaminhados para o IML (Instituto Médico Legal) de Passos, na mesma região de Capitólio, onde as famílias das vítimas se encontravam aguardando a liberação para enterro.
Devido ao estado dos corpos, que ficaram mutilados, os médicos legistas têm encontrado dificuldade em identificar as demais vítimas, sendo necessário coletar material genético.
O primeiro corpo identificado e liberado foi do aposentado Júlio Borges Antunes, 68, que era morador da cidade.
Seu corpo chegou ao velório do cemitério de São José da Barra (MG) por volta das 16h30. Sob chuva e forte comoção, cerca de 50 pessoas da pequena cidade estiveram no local, para prestar as últimas homenagens.
Sua sobrinha, a cozinheira Valquíria Antunes, 40, chorava bastante, mas era ela também que tentava dar forças aos seus parentes e amigos dentro do acanhado cemitério.
“Ele estava feliz em encontrar o Sebastião [outra vítima], que era amigo de infância dele.”
A mulher conta que foi uma surpresa saber que o tio estava entre as vítimas, já que ele nunca havia embarcado em uma lancha.
Outro sobrinho, Felipe Antunes, 30, afirmou que seu tio adorava pescar.
O marmorista Rogelhio Francisco das Chagas, 37, afirma que quatro vítimas da tragédia eram de sua família. Segundo ele, o grupo havia deixado a cidade de Serrania (MG) para acampar.
De acordo ele, entre seus familiares mortos já identificados estão o policial militar aposentado de Minas Gerais Sebastião Teixeira da Silva, 63, e a dona de casa Marlene Augusta Silva, 52, esposa de Sebastião. O filho do casal, Geovane Teixeira da Silva, 37, e o neto Geovane Gabriel Oliveira da Silva, 14, também estavam na embarcação.
“Vieram a passeio. Estavam acampados em um sítio e resolveram andar de barco”, disse Rogelhio.
Quem também se encontrava no Posto de Perícias Integradas de Passos eram os familiares do marinheiro Rodrigo Alves dos Anjos, 40, condutor da lancha e morador de Betim (MG).
A esposa e filha estavam muito abaladas, mas a auxiliar administrativa Milena Rodrigues Alves dos Anjos, 21, disse que seu pai era um piloto experiente.
O delegado Marcos de Souza Pimenta, responsável pela investigação do caso, afirmou que “seria prematuro responsabilizar alguém por um acidente dessa magnitude”. Segundo ele, o foco no domingo era a identificação das vítimas do acidente.
Ele afirmou que uma investigação preliminar identificou que as lanchas estavam aptas a transportar passageiros. O delegado diz ainda que o clima nublado e chuvoso pode ter evitado um maior número de mortes. “Caso contrário, ali poderia ter 50 a 100 crianças nadando.”
“Precisamos de apoio de geólogos para saber se essa erosão pode ser provocada pela chuva ou pelo som das lanchas que param e fazem um escarcéu naquele local”, completou o delegado.