Assim como a impressão digital, cada pessoa tem uma voz única. Pode até ser parecida, nunca igual. Mas isso não impede que dubladores e imitadores emprestem suas identidades vocais a personagens de séries televisivas, desenhos animados e filmes de cinema. Neste ano, a identidade vocal é o tema do Dia Mundial da Voz, data celebrada nesta sexta-feira (16) e criada há 18 anos.
Entre aqueles que “burlam” a natureza estão os dubladores Fátima Mourão e Isaac Bardavid, cujas vozes fazem parte do entretenimento audiovisual. Ao longo da entrevista com Fátima, quem também aparece é a princesa She-ra e Olívia Palito. Na vez de conversar com Isaac, o ranzinza Wolverine (X-Men) e o saltitante Tigrão (Ursinho Pooh) disputam espaço com o veterano.
Aos 90 anos e aposentado “há uns 40 anos, mas não da dublagem”, Isaac muda o tom apenas para falar sobre as diferenças de reconhecimento entre dubladores norte-americanos e brasileiros. “Lá eles enriquecem”, afirma, taxativo. Mas suas queixas são poucas: nem mesmo o problema de audição que surgiu com a idade diminui a empolgação quando fala sobre sua companheira de profissão – a voz, responsável por dublar mais de 40 mil filmes, na conta do próprio.
“[…] é muito divertido dublar, sabia? Mesmo aquelas dublagens mais complicadas, mais difíceis. É sempre com grande prazer que você as faz e quando você termina, a alegria de ter feito é muito grande.”
Isaac é ator, dublador e poeta (ou escritor de sonetos, como frisou). Seu maior sucesso televisivo foi o tirano feitor Seu Francisco, na novela Escrava Isaura (1976). Dublador de personagens como o computador K.I.T.T., do seriado A Super Máquina, e do vilão Esqueleto, do desenho He-man, sua voz deixou marcas em diferentes gerações brasileiras ao ser usada para dublar Wolverine, personagem praticamente imortal das histórias em quadrinhos, e que ganhou o mundo do desenho animado e do cinema. “A minha voz é imortal na medida em que seja imortal a lembrança do Wolverine (e de outros personagens)”, explica.
Sem aceitar a vaidade de ser um bom locutor e estar há 24 anos interpretando a voz do mutante no Brasil, Isaac considera que não foi sua voz que fez sucesso, mas sim o personagem. “É claro que eu tive algum mérito nisso. Mas qualquer outro dublador com alguma sensibilidade, e nós temos muitos, se fizessem o Wolverine, fariam o mesmo sucesso”, acredita.
Essa visão é compartilhada pela diretora de dublagem Fátima de Mourão, que tem no currículo filmes como O Vento Levou e o desenho animado She-ra. Ela explica que, apesar de um certo apego natural, não é incomum a troca de dubladores. “Eu fiz alguns filmes logo no começo da (carreira da atriz) Julia Roberts, mas depois que me mudei, foi natural que outras amigas queridas continuaram fazendo um belíssimo trabalho dublando-a”, conta. Contudo, Fátima ressalta que é preciso manter uma conduta ética de buscar chamar os mesmos dubladores quando disponíveis na praça.
Antes de dublar, Fátima atuava no teatro. Meio ao acaso, participou de um teste na Peri Filmes, a convite de Mário Monjardim (voz do Pernalonga), onde deveria gravar uma galinha. Ela conta que, literalmente, “soltou a franga”, fazendo com que a voz esganiçada e o sincronismo impressionassem os presentes. Depois disso, fez outras atuações, até que passou no teste para ser a voz da Olívia Palito.
Foi surpreendente quando me deparei com a dublagem. Eu vi o potencial da minha voz. Me redescobri como profissional.
Na sua trajetória junto aos estúdios de dublagem Herbert Richard (que fechou as portas em 2009), ela interpretou a voz da mãe da criança protagonista do filme ET, o Extraterrestre. A película, dirigida por Steven Spielberg, obrigou o estúdio brasileiro a atualizar a tecnologia da época, inferior às exigências do diretor e de Hollywood. (Fonte: Agência Brasil)