Um triângulo vermelho invertido custou à campanha eleitoral de Donald Trump a primeira ação séria da rede social Facebook contra o conteúdo divulgado pelo presidente dos Estados Unidos. A plataforma retirou na quinta-feira um anúncio no qual o presidente atacava grupos radicais de esquerda, por usar um símbolo que lembra aquele usado pelos nazistas para identificar presos políticos. Embora não seja a primeira vez que o Facebook retira conteúdo relacionado ao presidente, a decisão é significativa no contexto da campanha eleitoral de 2020 e por causa das críticas generalizadas que a empresa recebeu por sua atitude de dar amplo espaço à mentira e à desinformação no conteúdo que permite.
O anúncio em questão apareceu publicado na conta oficial de Donald Trump nesta quinta-feira. O texto diz: “Perigosas turbas de grupos da extrema esquerda correm pelas ruas, causando o caos absoluto. Estão destruindo as cidades e saqueando. É uma loucura total”. Trump pode estar se referindo às recentes manifestações antirracistas, que nos primeiros dias derivaram em alguns saques e violentos confrontos com a polícia. O presidente acusou o difuso grupo de extrema esquerda Antifa, um amálgama de ativistas desconectados que compartilham certa simbologia, de estar por trás da violência. O Antifa é uma das obsessões de Trump, que em sua conta no Twitter dá uma presença a esse grupo marginal, que, em geral não tem grande expressão na realidade dos norte-americanos.
A imagem que acompanha o anúncio é um triângulo vermelho invertido. E é aí que várias personalidades encontraram um problema. O presidente da Liga Antidifamação (um importante lobby judeu dos Estados Unidos), Jonathan Greenblat, escreveu no Twitter: “Os nazistas usavam triângulos vermelhos para identificar suas vítimas políticas nos campos de concentração. Usá-lo para atacar oponentes políticos é muito ofensivo. A campanha do presidente tem que aprender história. A ignorância não é desculpa para usar simbologia nazista”.
Os prisioneiros dos campos de concentração nazistas durante a Segunda Guerra Mundial eram classificados por diferentes insígnias costuradas na roupa que os diferenciavam de acordo com a razão de seu enclausuramento. O triângulo vermelho invertido designava inimigos políticos do regime, como comunistas, liberais, anarquistas ou maçons. Outras cores identificaram imigrantes ou homossexuais. Os judeus usavam dois triângulos sobrepostos, que formavam uma versão pervertida da estrela de Davi.
“Retiramos essas mensagens e anúncios porque violam nossa política contra o ódio organizado”, afirmou o Facebook em um comunicado. “Nossa política proíbe o uso de um símbolo que identifica presos políticos de um grupo de ódio proibido (os nazistas) sem o contexto que condene ou contribua para a discussão sobre o símbolo.”
Não é a primeira vez que o Facebook retira conteúdo relacionado com Trump. Em março, a plataforma retirou um anúncio que dava informações incorretas sobre o censo de 2020, uma questão que Trump transformou em campo de batalha político porque acredita que pode reduzir a influência dos grandes estados democratas em Washington se conseguir que os imigrantes não respondam à pesquisa nacional de população. Nesta ocasião, no entanto, o Facebook agiu diretamente contra uma mensagem de campanha, em meio a uma grande tensão por causa das manifestações recentes, e que também relacionava Trump com os nazistas.
“O triângulo vermelho invertido é um símbolo usado pelo Antifa, razão pela qual foi incluído em um anúncio sobre o Antifa”, disse Tim Murtaugh, porta-voz da campanha de Trump, em um comunicado à imprensa norte-americana. “É preciso dizer que o Facebook tem um emoji exatamente igual, por isso é curioso que ataquem somente esse anúncio. A imagem também não está no banco de dados de símbolos de ódio da Liga Antidifamação. É irônico que tenha sido necessário um anúncio de Trump para obrigar os meios de comunicação a reconhecer que o Antifa é uma organização de ódio”. Segundo a MediaMatters, o anúncio havia aparecido dezenas de vezes antes sem que o Facebook reagisse.
Apesar dos brados de Trump, a bandeira antifascista ostentada em protestos ao redor do mundo foi criada em 1932 para Ação Antifascista (Antifaschistische Aktion, em alemão), entidade filiada ao Partido Comunista. O símbolo, que já passou por adaptações ? originalmente eram duas bandeiras vermelhas ?, foi desenhado pelos artistas da escola Bauhaus Max Gebhard e Max Keilson.
O Facebook foi duramente criticado por sua política expressa de não intervir no que é publicado em sua plataforma, a maior rede social do mundo, à qual é atribuído um papel determinante no sucesso da campanha de Trump em 2016. A empresa foi ficando cada vez mais isolada nessa posição depois que o Twitter começou a marcar algumas mensagens de Trump, que publica compulsivamente, como contrárias às suas regras e perigosas por disseminar desinformação. (El Paris)