O registro de nascimento como direito humano fundamental não foi apenas tema da redação deste ano do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Dias antes da avaliação dos estudantes do ensino médio, a acessibilidade à documentação básica como expressão do exercício da cidadania foi objeto de oficina virtual promovida pelo Núcleo de Registro Civil na DPE/BA em Vitória da Conquista para servidores da área psicossocial da Instituição em todo o estado.
Criado em 2019, o Núcleo vem compartilhando experiências e iniciativas adotadas no âmbito da 2ª Regional da DPE/BA no que se refere ao assunto. Com apresentação da servidora e assistente social Deborah Santana e da defensora pública, recentemente aposentada (abril/2021), Marta Almeida, a oficina que ocorreu na última quinta-feira, 19, tratou dos caminhos extrajudiciais na obtenção de documentos, em especial do registro de nascimento tardio.
“Em pleno século XXI, nós temos um déficit muito grande de brasileiros e brasileiras invisibilizados para o Estado de Direito. O registro de nascimento é o documento originário para provar a existência jurídica de uma pessoa e sua ausência implica em total exclusão das políticas públicas. Políticas de saúde, educação, habitação, entre outras” comentou Marta Almeida, que segue lecionando Direito na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.
De acordo com a defensora aposentada e ex-coordenadora do Núcleo, com a missão da promoção dos direitos humanos e da defesa do Estado Democrático de Direito, as Defensorias precisam atuar nesta questão de forma contundente. Isso porque o perfil da pessoa sem documento é ultra vulnerável e, de modo a garantir este direito elementar, as Defensorias devem estar capilarizadas para recepcionar e enfrentar o problema.
Prerrogativa de requisição
A certidão de nascimento tardia não é emitida por um procedimento arbitrário onde bastaria ao interessado designar-se um nome, indicar suposta filiação, data e local de nascimento. Assim, é necessária uma pesquisa cuidadosa que requer a solicitação de diversas certidões e informações a várias entidades. Isso para que se possa oferecer à pessoa não apenas o registro em si, mas também uma religação com o passado.
Nesse sentido, o resultado do julgamento do STF quanto à constitucionalidade das leis que garantem a prerrogativa de requisição das Defensorias é fundamental. As Defensorias necessitam desta prerrogativa para alcançar informações, documentos, certidões, sem a qual os procedimentos de averiguações como estes seriam sempre judicializados.
“Sem a prerrogativa de requisição não poderemos mais realizar este tipo de procedimento. Por estatística é possível demonstrar que a prerrogativa é fundamental para obter êxito, entre outros pontos, nestas questões de registro tardio. É um exemplo típico de que se a Defensoria não tiver poder de requisição não poderá atender estas pessoas e o processo será moroso. Tudo será judicializado para que o juiz requisite estes documentos e comprovações”, explicou Marta Almeida.
Experiência de Conquista
São muitas as razões que levam pessoas a não terem os próprios documentos, desde situações que as façam perder ainda jovens contato com suas origens, a problemas de saúde, assim como também a ausência desde sempre de registro. Não possuir um documento revela ainda o desconhecimento da população sobre seus próprios direitos. Entre outros aspectos, o primeiro registro de nascimento é gratuito. Nos tempos atuais é menos comum que pessoas deixem de ser registradas, mas em condições de grande falta de assistência isso pode seguir ocorrendo.
Em Vitória da Conquista, o Núcleo de Registro Civil na DPE/BA realizou uma articulação com o juízo de registros públicos e com um cartório de registro civil, de modo que foi instalada uma unidade para registro na própria maternidade pública (Hospital Esaú Matos). Além disso, a Defensoria estabeleceu um canal de comunicação com os cartórios de registro civil que permite que qualquer requisição seja atendida celeremente e independente de ação judicial aberta.
“Foi justamente a importância do tema e as dificuldades enfrentadas pelas assistentes sociais e psicólogas dos diversos Núcleos de Atenção Psicossocial da DPE/BA que deram relevância a esta oficina. Ficamos satisfeitos com nossa contribuição, uma vez que a cidadania é resgatada com a busca da sua identidade e em como a Defensoria Pública colabora imensamente neste processo”, comentou o defensor público e coordenador da 2ª Regional da DPE/BA, com sede em Vitória da Conquista, José Raimundo Campos. (DP-BA)