Lá ele? Pau Miúdo, Pau da Bandeira e Pau da Lima: conheça a origem dos nomes curiosos de lugares em Salvador

Canabrava, Rua da Forca e Beco do Gasosa integram lista de locais inspecionados

Pau da Lima / Foto: Reprodução/Portal Pau da Lima

O soteropolitano que nunca se perguntou sobre a origem dos nomes de determinados bairros e ruas de Salvador que atire a primeira pedra. Afinal de contas, não há explicação pública para o bairro Dois de Julho, que homenageia a independência da Bahia, abrigar a Rua da Forca. Outras curiosidades também não têm resposta: os moradores de Pau Miúdo eram – ou são, por motivo de força maior – desavantajados? Havia algo de especial nas árvores do Pau da Bandeira e Pau da Lima? Quem vivia na área de Canabrava abusava da cachaça, assim como quem vive no Beco da Gasosa?

A reportagem foi em busca das respostas, mas avisa, desde então, que nem todas são unânimes. Historiadores, moradores, pesquisas junto à sites da prefeitura e até estudos realizados por acadêmicos da Universidade Federal da Bahia (Ufba) contam versões que se complementam, mas não são idênticas.

A maior polêmica é quanto à origem de Pau Miúdo, que até hoje impõe aos moradores a necessidade de ter jogo de cintura para soltar um ‘lá ele’ na hora certa e se esquivar dos trocadilhos e piadas com o nome do bairro. Segundo o professor de história Adson Brito do Velho, autor dos livros ‘Salvador Tem Muitas Histórias’ e ‘Quem Tem Medo da Mulher de Roxo’, o nome da localidade surgiu por conta da vegetação que existia na região.

“Ali, tanto na Cidade Nova como em Pau Miúdo, as casas eram construídas de taipa. Eram casas bem rudimentares, feitas de barro e cobertas de palha. Então, os moradores da região tinham que descer para Baixa de Quintas para pegar pequenos gravetos e paus pequenos para reforçar essas casas de taipa. Então, quando as pessoas subiam a ladeira até lá, sempre brincavam: ‘Estou levando o pau miúdo’, daí veio o nome”, explica.

A versão de um morador da localidade, publicada em uma página do Facebook em 2012, conta uma história diferente. Segundo ele, a região que hoje contempla o bairro era morada de indígenas que, situados em um local relativamente alto da cidade, não tinham acesso vegetações grandes e densas para servir de esconderijo ou produção de matéria-prima para confecção de armas. O que tinha em abundância, por sua vez, eram finos gravetos que serviam de arma, que foram apelidados de paus miúdos, originando, depois, o nome do bairro.

Quanto a Pau da Lima, bairro que faz divisa com Sete de Abril, Vila Canária, Jardim Cajazeiras e São Marcos, existia mesmo um tal senhor de sobrenome Lima que era fazendeiro e vivia em um local repleto de paus de diferentes árvores. O nome do bairro, no entanto, não tem nada a ver com a vegetação. É que o nome do dito cujo era Paiva Lima. Em meados dos anos 50, ele chamou alguns trabalhadores para cuidarem da fazenda e eles, sim, foram responsáveis pelo batismo do bairro.

“Os moradores, que geralmente viam do interior para trabalhar nessas áreas rurais, inicialmente, diziam ‘vamos lá na fazenda de Paiva Lima’. Com o passar do tempo, essa oralidade popular prevaleceu e o local passou a se chamar Pau da Lima”, conta Adson.

Já a Rua do Pau da Bandeira, que recentemente viralizou nas redes sociais pela vista encantadora para a Baía de Todos os Santos, recebeu esse nome porque era o local estratégico – justamente pela vista que proporciona – em que hasteavam bandeiras para orientar os navegantes no antigo sítio político da colônia. A rua fica situada entre a Rua Chile e a Praça Municipal.

A poucos metros da Rua Chile, outro local que atrai curiosidade pelo nome é a Ladeira da Preguiça. No livro ‘Histórias de Salvador nos nomes das suas ruas’, o escritor Luiz Eduardo Dorea conta que a ladeira surgiu como solução a outra ladeira íngreme por meio da qual eram transportadas as mercadorias do porto para abastecimento da população.

Mesmo assim, os homens negros escravizados, que faziam subir os carretões, diziam que o trabalho “dava preguiça”. De maneira irônica, então, a população e os escravocratas batizaram o local como a Ladeira do Tira Preguiça. Depois, o nome foi suprimido e se tornou Ladeira da Preguiça. Pela convergência, desta vez do tempo, a ladeira registra pouco movimento a pé, sendo a maioria do trânsito, hoje, composto por carros e ônibus.

O que, por sua vez, não apresenta nenhuma convergência é a Rua da Forca, localizada no bairro Dois de Julho. Segundo Adson Brito, que em junho lança o livro ‘171 bairros de Salvador – origem dos nomes’, a rua ficou conhecida dessa maneira porque era ali onde ficavam os negros condenados para serem enforcados, antes de serem encaminhados para a Praça da Piedade, onde o enforcamento de fato acontecia. O nome, apesar de servir de memória para a não repetição do passado escravagista da cidade, destoa da celebração da independência que carrega a data e o bairro Dois de Julho.

Ainda no Centro de Salvador, a origem do Beco da Gasosa, no bairro de Santo Antônio, não tem explicação histórica devidamente documentada. O que os moradores e frequentadores dizem é que, bem como sugere o nome, o local é ponto certo de venda de bebidas alcóolicas, sobretudo a cachaça. O bairro de Canabrava, que também sugere no nome a forma mais baiana possível de dizer que alguém bebeu demais, também tem sua raiz em uma mentira.

“O bairro de Canabrava teve o processo de ocupação a partir da década de 70. No local, havia presença em abundância de uma espécie de cana que florescia às margens dos córregos. Era uma falsa cana [que não servia para fazer álcool] e daí, na linguagem indígena, veio o nome Canabrava, que quer dizer cana falsa”, explica o professor Adson Brito.

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