Enquanto uma multidão se divertia na folia do Rei Momo em Salvador, em Maragogipe, no recôncavo, a população passava sufoco. Na semana passada o município decretou estado de emergência devido à estiagem que assola a região, e a homologação do decreto foi publicada nesta quinta-feira (14) no Diário Oficial do Estado. A falta d’água é tamanha que as aulas precisaram ser suspensas e tem bairros há 30 dias na seca.
A população ficou esperançosa quando viu as primeiras nuvens de chuva surgirem no horizonte, no início do verão, mas a água que caiu do céu foi pouca. Em janeiro, a situação da barragem que abastece os quase 50 mil habitantes do município deixou a prefeitura preocupada. O nível estava abaixo no normal, uma situação que não era vista desde 2002.
Segundo o secretário de Governo, Jiomar Mendes, a primeira solução foi contratar carros-pipa para ajudar no abastecimento do centro e dos cinco distritos da cidade. “Foi uma despesa que a gente não esperava. O município tem apenas um carro-pipa, com capacidade para 2 mil litros, e contratou outros por R$ 500 cada para ajudar no atendimento à população”.
No dia 26 de fevereiro, às vésperas da folia, o abastecimento foi racionado pela Embasa, na tentativa de atender a todos os moradores. Mas alguns distritos penaram. De acordo com o secretário, tem bairros que estão sem água há mais de 30 dias.
“Essa é uma questão climática, a gente sabe disso. A barragem que abastece a cidade foi construída na década de 1960 para atender a 20 mil habitantes, hoje temos o dobro de moradores. Ano passado não tivemos muitas chuvas e esse ano praticamente não choveu. Isso, mais o desmatamento, afetaram o abastecimento da barragem”, contou Mendes.
Segundo a Embasa, o rio Cachoeirinha, principal manancial da região, também está baixo. A empresa disponibilizou oito carros-pipa para atender à população e entregou cerca de 30 reservatórios coletivos com 5 mil litros, cada, para serem instalados em pontos e bairros estratégicos da cidade.
A medida ajudou, mas, segundo o município, ainda é insuficiente. Moradores fazem filas enormes para conseguir um balde com água e a situação pode ficar ainda pior se não chover nos próximos 10 dias.
Prioridades
A água que chega através dos carros-pipa está sendo destinada primeiro para os 12 postos de saúde e para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA 24h). A água usada na limpeza da cidade também foi racionada e os mais de 6,5 mil alunos da Rede Municipal ficaram sem aulas na segunda e terça-feira desta semana, por falta d’água.
Um decreto publicado no Diário Oficial do Município determinou que as atividades nas escolas só seriam retomadas na próxima semana, mas foi revogado e os estudantes voltaram para as salas de aula na quarta-feira (13). São 49 escolas e 5 creches, sem contar as instituições estudais e particulares.
O funcionamento das repartições públicas ainda não foi afetado, mas a prefeitura não descarta a possibilidade de ter que ajustar os horários. Por enquanto, os servidores foram orientados a economizarem ao máximo o consumo de água. O município pretende inaugurar ainda este ano uma maternidade, mas está preocupada com a falta d’água.
A situação está deixando os ânimos exaltados. Esta semana moradores dos distritos de Nagé e Coqueiro fizeram piquetes para obrigar os carros-pipa a abastecerem primeiro os reservatórios da região e, somente depois, segui para o centro da cidade.
A costureira Elizabete Lima, 65 anos, contou que está usando a água da cisterna de um vizinho para lavar roupa, limpar a casa e tomar banho. Ela contou que desde que a água parou de cair na torneira teve que substituir o filtro pelo garrafão de água mineral, que custa R$ 8 cada.
“Tem oito dias que a água foi embora e, desde então, é meu vizinho quem está me ajudando. Uso a água da cisterna para fazer as coisas de casa, mas tenho que comprar água mineral para beber, e às vezes até para tomar banho. Nesse calor, a gente consome muita água. O prejuízo está sendo grande”, contou.
A idosa disse que no bairro do Cajá, onde ela mora, não tem reservatório coletivo nem carro-pipa. Quando não é possível usar a cisterna do vizinho a solução é pagar para um rapaz carregar os baldes com água do reservatório mais próximo até a casa dela. “Nunca passei por uma situação dessas”, afirmou.
A prefeita de Margogipe, Vera Lúcia (PR), está em Brasília (DF) discutindo com a bancada baiana no Congresso, entre outras demandas, a situação da estiagem na região. A esperança do Município é de que após a homologação do estado de emergência, ocorrida nesta quinta-feira (14), o processo para contratação da empresa que fará a construção de uma adutora na cidade seja acelerado.
Já a Embasa informou que a construção será realizada. Está prevista, para os próximos 60 dias, a conclusão da implantação, em caráter emergencial, da adutora. Ela terá 23 quilômetros para levar água da estação de tratamento de Muritiba, também no Recôncavo, até Maragogipe.
Estado de emergência
Maragogipe foi o único município do Recôncavo a decretar estado de emergência por conta da estiagem até o momento, mas outras 189 cidades do estado estão na mesma situação. Alguns, em condição mais grave, já falam de seca.
Segundo a Superintendência de Proteção e Defesa Civil do Estado (Sudec), o processo de Maragogipe já foi encaminhado para a Defesa Civil Nacional para o Reconhecimento Federal.
Na terça-feira (12), representantes da Embasa se reuniram com lideranças políticas e comunitárias de Maragogipe depois que os moradores fizeram uma manifestação na porta do órgão, no Centro Administrativo da Bahia (CAB), em Salvador.
Em nota, a Embasa informou que ficou acertado que a cobrança de água e esgoto ficará suspensa a partir de 26 de fevereiro, quando começou o racionamento, até a situação ser normalizada.
“Sobre esta decisão, é importante ressaltar que, nos próximos dias, haverá a entrega das contas relativas ao fornecimento de água pela rede distribuidora antes do dia 26/02 e com vencimento no mês de março”, diz a nota. (Correio 24 horas / Por Gil Santos)