Limitações na cobertura e reajustes excessivos são as principais reclamações de usuários de planos de saúde no Brasil. Segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), de janeiro a março deste ano foram registradas 36.621 queixas de usuários no país — uma média de 406 por dia.
Para atender clientes insatisfeitos com as operadoras de saúde tradicionais, startups de saúde — chamadas de “health techs” — lançaram planos de saúde 100% digitais em São Paulo. Em meio à pandemia, elas receberam aportes financeiros superiores a R$ 500 milhões e acumulam mais de 10 mil clientes.
Os planos digitais prometem uma gestão de saúde preventiva por meio do médico de família. É ele quem faz o acompanhamento do paciente à distância e, com uso de dados e da inteligência artificial, pode prescrever tratamentos para prevenção de doenças.
Atenção à coparticipação
É preciso redobrar atenção neste caso: algumas operadoras exigem que o paciente seja atendido primeiro pelo médico de família para depois ir ao hospital, por exemplo.
As operadoras Alice e QSaúde, por exemplo, cobram coparticipação em atendimentos no pronto socorro, se não for comprovado que houve urgência na assistência.
Mas é exatamente na hora de comprovar a urgência que conflitos são gerados. Em sites de reclamações, por exemplo, há várias queixas sobre a cobrança de coparticipação e não cobertura de internação por operadoras digitais, após a entrada de pacientes em pronto socorro sem o atendimento virtual com o médico de família.
“Na maioria dos casos, o paciente resolve o problema conosco pelo aplicativo. Se não, a gente encaminha ao especialista. Já tivemos paciente com dor no peito que foi se acalmando até o pronto socorro falando com a gente [médicos de família]”, justificou André Florence, fundador da Alice.
A QSaúde afirmou que o usuário pode ir ao hospital sem buscar o atendimento pelo aplicativo, “contanto que seja constatado pelos médicos que o caso realmente foi uma emergência”.
Na Sami, para pessoas jurídicas, não há cobrança de coparticipação, garantiu Vitor Asseituno, médico e cofundador da empresa.
A operadora, lançada em 2020, possui uma clínica própria dentro de seu principal hospital conveniado, o Benefíciência Portuguesa de São Paulo.
A Alice também possui uma clínica própria para consultas e exames: a Casa Alice, localizada em Pinheiros (SP). No mercado desde o ano passado, a operadora possui 1.700 clientes ativos em São Paulo e 30 planos disponíveis.
Para atrair o público, a empresa promete oferecer uma visão “holística” da saúde, com preparadores físicos, psicólogos e nutricionistas.
A QSaúde também adota a medicina preventiva para manter a saúde de seus 3 mil pacientes em dia e, principalmente, para reduzir custos com sinistros. Anderson Nascimento, vice-presidente da operadora, afirma que 60% dos custos de planos de saúde decorrem de doenças crônicas descompensadas.
“Quando você traz o médico de família, você devolve a pessoalidade ao cuidado com o paciente”, afirmou o executivo, que é cirurgião cardiovascular.
Tecnologia avançada
Outra característica das health techs é que, como nasceram digitais, elas adotam análise de dados e inteligência artificial para acompanhar a saúde dos pacientes e também aproveitam esses recursos para reduzir os próprios custos.
Por exemplo: se um paciente tem costuma ter a pressão normal, mas em duas consultas consecutivas esse índice variou um pouco para cima, uma alerta é emitida ao médico de família avisando que algo pode estar errado com a saúde daquela pessoa.
“Fazemos análise de curva com inteligência artificial para ver o histórico dos clientes. Para isso, temos uma equipe de cientistas de dados e especialistas em machine learning. Todas as operadoras têm dados, mas o que nós temos é uma forma diferente de usar esses dados”, afirmou o VP da QSaúde.
A Sami, operadora de saúde digital para pessoas jurídicas, também aposta na tecnologia como diferencial competitivo. Até mesmo a contratação dos planos pode ser feita pelo aplicativo e sem a intermediação de corretores.
Segundo Asseituno, essa modalidade responde por 13% das vendas da operadora. “Atendemos muitos MEIs. Eles são um público desassistido quando se trata de saúde”, disse.
Preços e coberturas devem ser analisados
Apesar de terem a tecnologia e a medicina familiar como aliadas, as operadoras de saúde digitais nem sempre oferecem planos com preços acessíveis, alerta Marlon Glaciano, planejador financeiro e corretor de saúde.
É preciso fazer simulações, avaliar diferentes coberturas e, principalmente, analisar o contrato antes de decidir por um serviço.
A Alice e a Qsaúde, que oferecem planos para pessoa física, têm uma vantagem em comum: são individuais e reguladas pela ANS. Os reajustes dos coletivos por adesão, por sua vez, não são definidos pela agência reguladora.
Para se ter uma ideia, em 2020, a média de reajuste em contratos individuais foi de 8,14%, segundo a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon-SP). Em coletivos, a variação foi entre 14% e 25%.
As mensalidades cobradas pelas operadoras variam de acordo com o plano, a cobertura e a idade dos pacientes.
- Na Alice, o valor médio para um cliente de 30 anos é de R$ 600 ao mês.
- Na QSaúde, um produto de entrada para uma pessoa de até 18 anos custa a partir de R$ 246 ao mês.
- Já na Sami, uma plano de entrada para pessoa jurídica sai por a partir de R$ 172 mensais.
Como nos planos tradicionais, os valores, na maioria das vezes, desagradam os consumidores. Nas redes sociais das empresas, há queixas de pessoas que se decepcionaram com as cotações — principalmente usuários de 40 e 50 anos que receberam propostas acima dos R$ 1.400.
“As empresas têm começado o atendimento em São Paulo e em alguns hospitais específicos. Por isso, o valor não tem sido tão em conta assim no começo”, alertou Glaciano.
Antes de fechar o contrato, o consultor aconselha os usuários a pesquisarem informações das empresas nas redes sociais e também no site da ANS (https://www.ans.gov.br/).
Na página da agência reguladora, é possível acessar o monitoramento de qualidade de atendimento e o índice de reclamações das operadoras. (G1)