Santo Antônio de Jesus 139 anos: professor relata um pouco da história do município

Professor de História Alex Costa / Foto: Reprodução / Facebook

O professor de história e pesquisador Alex Costa, concedeu uma entrevista ao repórter do Voz da Bahia, Marcus Augusto, para falar a respeito da história de Santo Antônio de Jesus, município que completa hoje, 29 de maio de 2019, 139 anos de emancipação política.

Marcus Augusto: 139 anos de emancipação política de Santo Antônio de Jesus, o senhor poderia expor um pouco sobre a sua pesquisa na qual buscou relatar a história desta cidade?

Alex Costa: O livro é uma coletânea de textos não só minha, mas de outros colegas e professores daqui e de fora da cidade. Pesquisamos sobre a história social do nosso município, não apenas da sua fundação, como de todo transcorrer até os tempos mais recentes. Temos uma história bastante interessante, se trata de uma cidade que foi dividida de Nazaré, a qual contemplava toda essa região até próximo à Amargosa e Lage, que com o tempo foi perdendo esses territórios o que foi motivo de muita briga. Antes da emancipação, a cidade de Nazaré resistiu durante muitos anos, até por que ela já tinha perdido outro território (São Miguel das Matas) tão importante para ela. Toda essa região era fornecedora de farinha de mandioca em que Nazaré se abastecia e isso foi um dos motivos para que a cidade resistisse a aceitar a emancipação que causaria perdas na sua receita econômica. Poucas pessoas conhecem a luta promovida pelas autoridades municipais da época para que Santo Antônio de Jesus pudesse ganhar o título de emancipação.

Antiga feira de Santo Antônio de Jesus era na Praça Padre Mateus

Marcus: A população santoantoniense sempre foca na Praça Padre Mateus, o que de importante a Praça trouxe há época e para a atualidade, é possível dizer que a mesma beneficiou o comércio do município?

Alex: A Praça vai ganhando importância com o passar do tempo. No período da fundação da cidade e durante um longo tempo essa Praça não tinha grande importância para a cidade, pois o comércio estava restrito à área onde a linha de trem circulava que vem desde o São Benedito, passando pela atual Praça Renato Machado e a Félix Gaspar, onde existia a estação de trem. Ali estava situado um grande comércio, que atendia aos frequentadores da cidade, aos passageiros que estavam em viagem em direção à outras regiões como Amargosa e Jequié que era até onde o trem chegava. Com o passar do tempo e com o desligar da linha de trem deixando de ser a base de transporte da região, vai acontecendo esse deslocamento para a Praça Padre Mateus. Outra região bastante importante para o comércio é a localidade das 4 Esquinas, que antes era chamada de Rua dos Nazarenos, pois era aonde estava situado o grande comércio de pessoas oriundas da cidade de Nazaré. Essas pessoas vieram migrando de Nazaré, que estava perdendo espaço comercial para Santo Antônio de Jesus (por volta de 1910 a 1920), época em que nossa cidade ganha uma força comercial muito grande e os comerciantes de Nazaré acabam se deslocando de lá para cá. Dali em diante, o comércio começa a se estender até chegar à Praça que desde o meado do século XIX, com a fundação da cidade e construção da Igreja Matriz, estava situado um comércio mais popular, uma feira livre ao fundo da Igreja, a qual ficava praticamente no meio da Praça. Ao longo do tempo ela vai ganhando importância com o deslocamento da feira para a atual Praça Duque de Caxias, que foi motivo de muita reclamação, pois as pessoas achavam longe e a região era alagadiça. Era, na verdade, uma fazenda que foi adquirida pela prefeitura e transformada em Praça para o consumo popular de alimentos. Com o deslocamento da feira livre, demolição da antiga Igreja Matriz e construção da atual, a Praça vai ganhando novos ares, as demais lojas comerciais vão se deslocando para lá e o comércio popular se desloca para a feira livre. Depois disso o Padre Mateus ganhou uma nova estrutura e uma centralização importante para cidade. Ela se tornou um cartão postal de Santo Antônio de Jesus, a vitrine do município.

Marcus: É verdade que a Praça do Rio Branco era o antigo cemitério da cidade?

Alex: É verdade, a Praça funcionava como um cemitério e isso era motivo de angústia para a população no início do século XX nos ideais de modernização copiados das grandes cidades, que se tentava alargar as ruas, tirar casas antigas, construir casas modernas, fazer vias mais largas e urbanizadas, entre outras mudanças. Justamente por ali passava a linha de trem, as pessoas se queixavam de que quando chegavam à cidade a primeira impressão que tinham era de um cemitério em seu centro. Sem falar que era considerado um ambiente não muito agradável por conta de se ter medo das doenças que poderia provocar às pessoas. Isso forçou ao deslocamento do cemitério da região da antiga Praça do Rio Branco para aonde hoje está situado o atual cemitério. Na última reforma que a Praça passou foram encontrados alguns restos mortais lá.

Praça Félix Gaspar

Marcus: Como surgiu a ‘força do comércio de Santo Antônio de Jesus’, de que forma essa cidade chegou a ponto de se expandir neste ideário?

Alex: São diversos fatores que ajudam a cidade a crescer comercialmente, um deles é a linha de trem. O único lugar que tinha possibilidade de um contato mais fácil e rápido com Salvador era em Nazaré, por isso é que para lá era dirigida toda economia regional e de lá era revendido para Salvador, por isso Nazaré foi uma cidade que por muito tempo concentrou a economia desta região inteira. Com a linha do trem, ou seja, possibilidade de essa economia não ficar mais restrita à Nazaré, certamente isso influenciou bastante para que o comércio de lá enfraquecesse. Esse comércio teve que se deslocar acompanhando a linha de trem, outras regiões foram se desenvolvendo e entre elas Santo Antônio de Jesus, Amargosa e Jequié onde era o final da linha do trem. Com o término da estrutura ferroviária da região e com a construção das BR’s nossa cidade novamente será privilegiada, pois passam a BR-101 à sua frente e depois é construída a BA que conduz até a ilha de Itaparica passando por Nazaré. Então são duas estradas que já no século XX vão facilitar a comunicação do nosso município com outras cidades, isso promove, ajuda e fortalece, sem dúvida, o seu comércio, mas não podemos esquecer que tudo começa no final do século XIX quando esses comerciantes de Nazaré vêm e criam na cidade um comércio mais desenvolvido. Fazendo com que Santo Antônio de Jesus chegue a superar Amargosa, sendo que na época, Amargosa era um pouco maior. A cultura da produção de tabaco estava espalhada por toda região, não apenas concentrada em Santo Antônio de Jesus, esta teve diversos armazéns que fizeram circular a economia. A cultura do fumo sempre foi vista como a cultura do pequeno produtor, isso era importante para a época em que as pessoas não tinham condição de desenvolver grandes propriedades e precisavam se manter com baixo custo, o fumo era uma dessas condições em que o pequeno produtor ganhava seu dinheiro e conseguia manter suas famílias. Toda essa região em volta da cidade mandava sua produção para aqui, onde era comercializada para Salvador.

Área do transbordo

Marcus: Quem foi Idelfonso Guedes?

Alex: Foi um político bastante importante para a cidade. Ele foi prefeito de Santo Antônio de Jesus que, com sua capacidade de articulação, conseguiu formar um grupo político importante para a sua época. Foi considerado o primeiro prefeito do município após a década de 1930 e depois ele emendou com um segundo mandato de 1935 a 1938. Foi dele a ideia de criar o jardim da Praça do Rio Branco substituindo o cemitério e foi ele quem criou o Cata-vento que até hoje é um dos símbolos da nossa cidade. Infelizmente muitas pessoas não prestigiam, mas servia como instrumento para retirar água da região e abastecer as casas daquela região.

Marcus: E o famoso padre Mateus, existiu, ou era uma lenda?

Alex: Para muitas pessoas foi uma figura fictícia, mas na verdade ele teria sido um padre que não se sabe se era de alguma ordem religiosa ou não, mas esteve pregando por toda a região e se fixou em Santo Antônio de Jesus, onde o mesmo teria realizado casamentos e batizados. Possuía um pedaço de terras onde cultivava mandioca. Segundo pesquisas, ele chegou a ter alguns escravos, o que era comum para a época do início do século XIX. Alguns pesquisadores dizem que somente os mais miseráveis não tinham escravos. Registros mais concretos da passagem de Padre Mateus estão na Igreja de Nazaré onde ele teria realizado diversos batizados e após ter deixado essa região foi lá que teria celebrado a sua missa de corpo presente na ocasião do seu falecimento. Ele teria morado na Rua Barão de Melo em Nazaré e com sua morte, ele foi enterrado na mesma cidade. Sua importância para Santo Antônio de Jesus é por que através dele foi se concretizando uma pequena vila na qual havia um oratório em homenagem a Santo Antônio. Era comum nas estradas terem esses oratórios, nos quais os viajantes paravam e pediam proteção. Com o passar do tempo algumas pessoas começaram a se fixar ali, por isso credita-se ao Padre Mateus como fundador da cidade de Santo Antônio de Jesus. A história está aí como prova para nós, espero que ela possa ser preservada e valorizada, independente do grupo político que esteja no poder. O conselho municipal de educação municipal tem aprovada uma resolução, obrigando as escolas municipais a ensinarem a história da cidade, vamos valorizar isso para que não caiamos no erro de falar ou escrever coisas que a história não contou.

Marcus: Foi falado que seu livro que conta um pouco dessa história do município possui uma coletânea de textos de outros professores, quem são eles?

Alex: O livro não é meu, mas da cidade e do povo. Está disponível nas escolas municipais e foi escrito por mim e mais seis colegas professores da cidade e região. São eles: Denílson Lessa, Edilma Oliveira, Ana Maria Carvalho, Carla de Quadros, Eliane Menezes, Maitê Rangel e Amilton Rodrigues. Organizamos uma coletânea de textos cujo título é: Uma cidade, várias histórias: Santo Antônio de Jesus nos séculos XIX e XX. Temos também um segundo livro organizado pelo professor Wilson Roberto de Matos e Suely Santana, chamado: Trilhas do tempo e Trilhas da História. Este também está disponível nas escolas municipais e até em alguns particulares. Tivemos diversas contribuições, como Cristina Assis, Rosineide Gomes, Mércia, Miguel Cerqueira e Omar Ribeiro. Esses livros servem de estímulo para os nossos professores e população, quem não tiver acesso a ele poderá procurar na biblioteca da UNEB (Universidade do Estado da Bahia) Campus V, pois temos disponível para consulta.

Marcus: Obrigado professor por esse relato.

Alex: Obrigado a você Marcus por querer promover e divulgar um pouco da história de uma cidade pulsante e viva. Isso me deixa muito feliz, e parabéns também ao Voz da Bahia por ser esse canal de divulgação de informações precisas, verdadeiras e sérias.

Santo Antônio de Jesus na atualidade 2019 / Foto: Reprodução

Reportagem: Voz da Bahia

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