Por unanimidade, o plenário do Supremo Tribunal Federal (stf) declarou inconstitucionais leis municipais que proibiam o uso de aplicativos de transporte, como Uber, 99 e Cabify, liberando esse tipo de atividade que já é realizada, mas era alvo de contestações.
Os ministros concluíram, nesta quarta (8), o julgamento de uma ADPF (arguição de descumprimento de preceito fundamental) contra uma lei municipal de Fortaleza (CE) que proibia carros particulares de prestar serviço de transporte por meio de aplicativos.
Conjuntamente, foi analisado um recurso extraordinário contra uma lei municipal de São Paulo com teor semelhante, que visava proibir esse serviço.
A ADPF foi ajuizada no ano passado pelo PSL, que questionou a lei de Fortaleza sancionada em 2016. O partido afirmou que a lei visou proibir o trabalho de motoristas não taxistas, contrariando princípios constitucionais como o do valor social do trabalho, da livre iniciativa, da livre concorrência e da defesa do consumidor.
O advogado Rodrigo Saraiva, que representou o PSL na sessão, disse que os aplicativos de transporte possibilitam a liberdade de escolha e empregam milhares de pessoas, em especial no atual cenário de crise. Ele afirmou que a ação visa “defender a possibilidade de as pessoas escolherem para onde vão e a forma que vão”.
Já o recurso referente à lei municipal de São Paulo foi apresentado ao Supremo pela Câmara Municipal contra uma decisão do Tribunal de Justiça paulista que considerou inconstitucional a norma de 2015, liberando os aplicativos.
A Câmara afirmou ao STF que “o transporte individual remunerado de passageiros é atividade de interesse público e, por isso, sujeita a restrições nas livres iniciativa e concorrência”. Argumentou também que um serviço sem qualquer tipo de fiscalização -de antecedentes criminais e de capacidade técnica do motorista, por exemplo- põe em risco o usuário.
Ingressaram nos processos como “amici curiae” (amigos da corte, em latim) as empresas Uber, Cabify e 99 e o Sindicato dos Taxistas de Porto Alegre, cujos representantes foram ouvidos no plenário da corte.
O advogado do sindicato dos taxistas, Alexandre Camargo, destacou que há uma lei federal, aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Michel Temer em março de 2018, que delega aos municípios o poder de regulamentar o serviço de transporte por aplicativos. Para ele, se há municípios que o proíbem, é porque essa é uma demanda da sociedade local que deve ser respeitada.
Os ministros, porém, discordaram. O ministro Luiz Fux, relator de um dos processos, afirmou em dezembro passado, quando o julgamento começou, que a proibição desse serviço causaria efeito inverso ao objetivo declarado da ação, que é a defesa do consumidor.
“A evolução tecnológica é capaz de superar problemas econômicos que tradicionalmente justificaram intervenções regulatórias. Os benefícios gerais aos consumidores são documentados na literatura especializada”, disse Fux.
Relator do outro processo, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que a criação de reserva de mercado para impedir a chegada de novas tecnologias e novos atores é contrária ao princípio do livre mercado.
“Penso que temos que aceitar como uma inexorabilidade do progresso social o fato de que há novas tecnologias […]. É inócuo proibir a renovação ou tentar preservar o status quo. O desafio do Estado está em como acomodar a inovação com os mercados preexistentes, e penso que a proibição evidentemente não é o caminho, até porque acho que seria como tentar aparar o vento com as mãos”, disse Barroso.
A sessão de dezembro foi suspensa por pedido de vista do ministro Ricardo Lewandowski. Nesta quarta, com a retomada da análise, os demais ministros votaram e todos acompanharam Fux e Barroso.
Nesta quinta-feira (9), os ministros vão fixar a tese referente ao julgamento, que deve dizer quais os limites da atuação dos municípios na regulamentação do serviço.
Três questões de interesse das empresas nesse ponto são: 1) se os municípios podem interferir no preço do serviço, 2) se podem exigir que só circulem em seu território carros com placas locais e 3) se podem estipular uma idade máxima para a frota.
Em nota, a 99 classificou a decisão do STF de positiva. “Ela traz segurança jurídica, ao reafirmar a competência da União para legislar sobre trânsito e transporte. Ou seja, deixa claro que os municípios não podem proibir ou restringir a atuação dos motoristas nem o transporte remunerado privado individual de passageiros intermediado pelas empresas de aplicativos de mobilidade”, afirmou a empresa.