Um estudo realizado com indivíduos de 17 países indica que as pessoas costumam prestar mais atenção em notícias negativas, e o Brasil é um dos países em que há evidências mais claras desse comportamento.
Segundo o estudo, publicado na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences, a tendência de reagir mais fortemente a notícias de conteúdo negativo é um fenômeno global.
Os pesquisadores mediram reações fisiológicas dos participantes e concluíram que, ao redor do mundo, as pessoas são mais “ativadas” por notícias com conteúdo negativo do que por histórias positivas.
“Nós usamos várias medidas [fisiológicas] diferentes para examinar o viés negativo [na reação às notícias]”, diz à BBC News Brasil o principal autor do estudo, Stuart Soroka, professor de Estudos da Comunicação e Ciência Política e do Instituto para Pesquisa Social da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos.
“E na maioria dessas medidas o Brasil produziu resultados estatisticamente significativos. Isso não ocorreu em todos os países, em alguns países os resultados não foram tão significativos estatisticamente”, ressalta Soroka, que realizou o estudo com a colaboração de pesquisadores do Canadá e de Israel.
Como o estudo foi feito
Os resultados são baseados em sessões experimentais com 1.156 pessoas em 17 países. Os pesquisadores analisaram as respostas fisiológicas dos participantes ao conteúdo noticioso apresentado.
Além do Brasil, participaram indivíduos de Canadá, Chile, China, Dinamarca, Estados Unidos, França, Gana, Índia, Israel, Itália, Japão, Nova Zelândia, Reino Unido, Rússia, Senegal e Suécia.
Em todos os países, os participantes — de diferentes idades, níveis de educação e preferência ideológica — assistiram a sete reportagens em vídeo da BBC em um laptop, enquanto usavam fones de ouvido com cancelamento de ruídos e sensores nos dedos para capturar a atividade elétrica na pele e a frequência cardíaca.
Segundo os pesquisadores, essas medidas fisiológicas conseguem capturar reações subconscientes ao conteúdo apresentado.
As reportagens foram ordenadas aleatoriamente. No Brasil, onde a pesquisa foi feita em 2016, duas notícias apresentadas foram sobre assuntos locais: uma positiva, sobre uma companhia de dança para bailarinos com deficiência, e outra negativa, sobre um incêndio em uma boate. As cinco restantes foram notícias internacionais.
Os resultados mostram que, em média, os participantes exibiram maior variação na frequência cardíaca e maior atividade elétrica na pele durante a exibição das notícias negativas do que durante aquelas com conteúdo positivo, o que é interpretado como maior atenção e excitação durante essas histórias.
Espaço para notícias positivas
“Preocupações com a cobertura jornalística tipicamente focam o lado da oferta, ou seja, as escolhas de jornalistas e editores. Mas o lado da demanda também é importante. Apesar de as pessoas dizerem que querem notícias mais positivas, elas sistematicamente escolhem as notícias mais negativas”, diz o estudo.
Os pesquisadores observam que a natureza e a qualidade do conteúdo noticioso “são centrais para a natureza e a qualidade da democracia representativa”, e que esse conteúdo é “sistematicamente inclinado para informação negativa”, em parte devido a forças de mercado, em razão da demanda por esse tipo de notícia.
De acordo com os pesquisadores, a natureza majoritariamente negativa do conteúdo noticioso pode levar os cidadãos a apatia, desmobilização e a um conhecimento político incorreto ou inadequado. “O tom do conteúdo noticioso tem sido citado como uma fonte de deficiências sistemáticas no que os cidadãos sabem sobre seus governos e sobre o mundo”, diz o estudo.
Mas apesar de os resultados apontarem para um viés negativo em todos os países incluídos na pesquisa, foi observada grande variação dentro de cada país na maneira como cada pessoa reage. Para Soroka, isso indica que há potencial para notícias de conteúdo mais positivo.
“Ainda que, em geral, a tendência seja de os espectadores darem mais atenção e reagirem com mais excitação a conteúdos negativos, parece haver um bom número de indivíduos com preferências diferentes ou mutáveis”, diz o estudo.
Soroka diz que a grande variação nos resultados em nível individual pode ser motivada pelas circunstâncias em que a pessoa se encontra naquele momento, como situação econômica, posição política, até mesmo o ambiente em que a pessoa consume as notícias.
“A preferência por notícias negativas versus positivas talvez não seja estática, pode variar ao longo do tempo, dependendo do contexto em que a pessoa se encontra. Isso nos leva ao argumento de que pode haver espaço para notícias que sejam menos sistematicamente negativas”, conclui o pesquisador.
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