Menos de cinco meses depois da eleição para as presidências da Câmara e do Senado, um grupo de parlamentares avalia, nos bastidores, a possibilidade de apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para permitir reeleições ao comando do Legislativo, sem qualquer limitação. Três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já foram consultados reservadamente e deram aval à iniciativa, sob o argumento de que se trata de uma questão interna do Parlamento.
Atualmente, a Constituição proíbe que presidentes da Câmara e do Senado sejam reconduzidos ao cargo na mesma legislatura. Isso quer dizer que, em 2021, nem o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), nem o do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), poderão concorrer à reeleição, se essa regra – também contida no regimento das duas Casas – não for alterada.
“Não estou sabendo de nenhuma articulação nesse sentido e sou contra”, disse Maia ao Estado. A reportagem apurou que a ideia partiu de Alcolumbre, mas, por meio de sua assessoria, ele negou qualquer manobra para se manter à frente do Senado.
Para que uma PEC seja aprovada, é necessário o apoio de 308 deputados e 49 senadores, em duas votações, placar considerado difícil de ser obtido, mesmo porque não há consenso sobre o tema. Maia está no comando da Câmara desde julho de 2016. Foi eleito para um “mandato-tampão” depois que o então presidente da Casa, Eduardo Cunha (MDB-RJ), renunciou. Em 2017, conquistou novo mandato, após vencer polêmicas jurídicas sobre a candidatura. Repetiu a dose em fevereiro, já na nova legislatura, quando Alcolumbre também se saiu vitorioso no Senado.
Enquanto não há acordo sobre reeleição no Congresso, os partidos do Centrão e também o PSL do presidente Jair Bolsonaro se movimentam para escolher potenciais candidatos à sucessão na Câmara, em fevereiro de 2021. Com o provável racha do Centrão na disputa, o PSL avançou uma casa no jogo e tenta construir uma candidatura própria à cadeira de Maia.
O governo tem interesse em emplacar aliados na cúpula do Congresso e já começa a fazer “prospecções” sobre possíveis postulantes nas fileiras da centro-direita.
Sem nomes fortes para a próxima disputa, o DEM corre o risco de perder as duas Casas um ano antes do fim do mandato de Bolsonaro. A portas fechadas, integrantes da oposição e de partidos do Centrão observam ainda que, com tantos problemas na política e na economia, Bolsonaro também pode até cair antes do término do mandato.
Em um cenário de impeachment, quem toma posse é o vice, mas, se a chapa toda for cassada na primeira metade do mandato, o presidente da Câmara assume o cargo para convocar novas eleições. Nesse caso, ele também pode ser candidato.
Na prática, em qualquer situação, o presidente da Câmara – que é o segundo cargo na linha sucessória, depois do vice – tem papel estratégico para o Palácio do Planalto. É dele o poder de arquivar ou dar prosseguimento a pedidos de impeachment e também de definir quais projetos de lei devem ir à votação.
Maia e Bolsonaro vivem uma relação marcada por confrontos. Apesar dos percalços, no entanto, o presidente conta com o deputado para aprovar a agenda econômica. Recentemente, Maia chegou a dizer que, embora o governo seja “uma usina de crises”, o Congresso está “blindado” e vai votar a reforma da Previdência. Trata-se de mais um movimento para fazer um contraponto ao Executivo.
Visto como uma espécie de primeiro-ministro, Maia não se aliou, porém, aos colegas senadores que querem emplacar agora uma PEC para instituir o parlamentarismo no Brasil. “O presidente tem direito à reeleição”, disse ele, ao Estado, no início do mês. “Não adianta tentar esse caminho sem a gente fazer uma coisa muito simples: convencer a população de que o sistema parlamentarista é mais estável do que o presidencialista.”