Acarajé doce feito com goiabada e açúcar divide opiniões na Bahia

Acarajé doce feito com goiaba e açúcar é criado em Feira de Santana — Foto: Reprodução/Jornal da Manhã
Acarajé doce feito com goiaba e açúcar é criado em Feira de Santana — Foto: Reprodução/Jornal da Manhã

Uma vendedora de Feira de Santana, a 100 quilômetros de Salvador, criou uma receita de acarajé doce. A massa tradicional, que é preparada com feijão fradinho, passou a levar goiabada e açúcar.

“Sobrou uns bolinhos fritos [de acarajé] e o pessoal já tinha enjoado de comer o tradicional. Tive a ideia de colocar uma goiabada que tinha em casa, passei açúcar e deu certo”, contou a microempreendedora Daniele Paiva.

A criação, que está há um mês sendo vendida no bairro Sobradinho, dividiu opiniões entre o público.

“Eu acho que não combina e o nome não deveria ser acarajé, até porque é uma receita tombada e tem toda uma história na religião”, disse a administradora Milena Rhumas.

“Eu acho estranho, não pode chamar de acarajé, mas tudo evolui e é uma boa inovação, quem sabe dá certo”, disse a estudante Natalia Mirante.

O bolinho que tradicionalmente é feito com feijão fradinho, cebola e sal, foi tombado como patrimônio cultural imaterial em 2004 pelo Instituto Federal da Amazônia (IFAM).

Rita Santos, presidente da Associação Nacional de Baianas de Acarajé (ABAM), é contra a inovação e contou que há uma certidão dada pelo IFAM que consta como a receita tradicional é feita. Segundo Rita, mudar a forma de fazer é não valorizar a história.

“A gente tem que guardar nossa história, tem que preservar e cuidar, principalmente quem é baiano”, explicou Rita.

O pesquisador, Vagner Rocha, que fez um trabalho de mestrado sobre acarajé, também não concordou com a alteração.

Ele explicou que diante das descaracterizações das vendas de acarajé, há um ofício das baianas que leva em consideração a forma de preparo, os quitutes que compõem o tabuleiro e as vestes típicas.

“É uma comida que traz um legado e uma marca da resistência africana no Brasil”, contou o pesquisador.

Assossiação Nacional das Baianas do Acarajé (ABAM) — Foto: Reprodução/Jornal da Manhã
Assossiação Nacional das Baianas do Acarajé (ABAM) — Foto: Reprodução/Jornal da Manhã

Mesmo com as opiniões divididas, a microempreendedora explicou que a mudança na receita foi uma releitura da original.

“Eu acho que é uma releitura de um prato típico que, na verdade, é o carro chefe daqui. Mas, hoje, para se recolocar no mercado, a gente tem que inovar um pouco para trazer um público novo. É só uma reinvenção mesmo, mas com todo respeito à nossa tradição”, contou Daniele.

Vagner também explicou que o acarajé era vendido puro, no máximo com pimenta, por volta do século XVIII e XIX. Mas com o passar dos anos, foram acontecendo adaptações de outras comidas que fazem parte das receitas de matrizes africanas.

“O acarajé, assim como várias comidas, sofreu efeito da globalização, tanto que algumas pessoas chamam de acarajé hambúrguer-nagô, porque é cortado e tem complementos. O acarajé entrou nessa onda de fast-food também, não vende só nos tabuleiros das baianas, vende também em restaurantes, delicatessens e até acarajé delivery”, contou o pesquisador.

Além disso, há outras variações do bolinho, chamado de acarajé de oxalá e o iansã balé, que é frito no azeite de oliva. (G1)

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