Biógrafo de Moreira César critica troca de rua para homenagear Paulo Gustavo: “Apagamento da história”

Foto: reprodução capa de livro Treme Terra

No último dia 20 de maio, a prefeitura de Niterói fez uma homenagem ao ator Paulo Gustavo, morto no auge da carreira, aos 42 anos. O comediante, vítima da Covid-19, recebeu uma rua com seu nome na cidade onde nasceu, na região metropolitana do Rio de Janeiro.

A troca, no entanto, foi desaprovada por historiadores, escritores e pesquisadores das mais diversas partes do Brasil. O antigo nome era Rua Coronel Moreira César, uma deferência a um dos principais nomes do exército brasileiro, morto quando liderava, em 1897, a terceira expedição contra o Arraial de Canudos, no interior da Bahia.

Autor da principal biografia publicada sobre o personagem histórico — chamada o “Treme-Terra: Moreira César, a República e Canudos” —, o historiador e escritor baiano Oleone Coelho Fontes é um crítico ferrenho da mudança. “Deveriam homenagear o ator com o nome de um teatro, um espaço que estivesse à altura dele. Mas substituir Moreira César é apagar uma parte importante da nossa história. Com certeza, quem propôs essa mudança não sabe a importância que Moreira César teve no início da República brasileira”, pontua.

Nascido em Pindamonhangaba, interior de São Paulo, Antônio Moreira César alcançou o posto de coronel da infantaria do exército. Foi governador de Santa Catarina, nomeado pelo presidente Floriano Peixoto (1839-1895), para suprimir a Revolução Federalista no estado. Antes, em 1891, na Bahia, participou da derrubada do governador José Gonçalves da Silva, passando a ocupar o cargo de secretário da segurança pública do estado. Com mão de ferro característica sufocou, também à pedido de Floriano, uma revolta armada na Marinha brasileira, no Rio de Janeiro.

“Moreira César está nestes momentos decisivos do país, condecorado com um especialista em resolver questões delicadas nos estados. Ele ganhou o epíteto de ‘Treme-Terra’ pela força com que sufocava estes movimentos. Ele era cotado, à época, para ser presidente do Brasil”, diz Oleone.

Em 1897, então com 46 anos, o coronel foi convocado para comandar a terceira expedição no interior da Bahia contra o grupo de sertanejos liderados por Antônio Conselheiro. As duas expedições estaduais anteriores haviam fracassado e o presidente Prudente de Morais assumiu a questão como um problema nacional. Havia o rumor que Conselheiro era um monarquista e disseminava ideias para derrubar a recém-gestada República brasileira.

Apesar da enorme vantagem tática do exército, com um efetivo de 1.300 homens e seis canhões Krupp, Moreira César não resistiu e tombou em combate em Monte Santo.

“Ele foi com toda empáfia e arrogância achando que iria massacrar o Arraial de Canudos. Ele teria tido que iria ocupar a área sem disparar nenhum tiro, apenas na imposição do exército. Achava que seria um massacre diante daqueles sertanejos miseráveis. Mas ele que morreu em combate e a terceira expedição foi destruída”, diz o escritor José Bezerra Lima Irmão, também estudioso do tema.

Bezerra Lima e Oleone Coelho afirmam que, ao defenderam a permanência do nome original, não fazem uma defesa de quem foi Moreira César, mas ressaltam a importância de manter viva a menção a figuras históricas. “A gente não conta nossa história direito e, por isso, as pessoas conhecem muito pouco os fatos decisivos do nosso país. Se o pouco que a gente tem for apagado, vamos nos tornar um povo sem memória, completamente vazios”, diz Oleone. (Fonte: Metro 1)

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