A crise econômica dos últimos anos empurrou 7,4 milhões de brasileiros para a pobreza entre 2014 e 2017, segundo cálculo feito pela Folha a partir de um documento divulgado nesta quinta-feira pelo Banco Mundial e da base de dados da instituição.
Isso representou um salto de 20,4% – de 36,5 milhões para quase 44 milhões – no número de pessoas vivendo com menos de US$ 5,5 por dia. O valor representa a linha oficial da pobreza usada pelo organismo multilateral e é expresso em paridade do poder de compra (PPC), que reflete diferenças no custo de vida dos países. Com base na cotação atual entre o real e o dólar, seria o equivalente a cerca de R$ 637 por mês.
O Banco Mundial trabalha ainda com a definição dos que são considerados extremamente pobres, precisando sobreviver com menos de US$ 1,90 (em PPC) por dia, o equivalente a R$ 220 a preços de hoje.
A conta feita pela reportagem a partir da base de dados da instituição com foco nesse outro recorte revela um lado ainda mais perverso da crise brasileira. O total de brasileiros vivendo abaixo da linha da extrema pobreza saltou de 5,6 milhões para 10,1 milhões entre 2014 e 2017. Ou seja, houve um acréscimo de 4,4 milhões de brasileiros considerados miseráveis no período.
O relatório divulgado pela instituição apresenta uma análise dos principais fatores que provocaram mudanças nos indicadores sociais da América Latina nas últimas décadas e alerta os governantes para a grande vulnerabilidade da chamada pobreza aos sabores do ciclo econômico que, na região, é muito sujeito a variações nos preços de commodities.
No caso brasileiro, o Banco Mundial mostra que 54% da queda na pobreza entre 2003 e 2013 se deveu ao impacto favorável da conjuntura – marcada por forte demanda externa por produtos básicos – sobre a renda per capita.
Embora os cálculos da instituição indiquem que o ciclo econômico teve grande peso na América do Sul como um todo, o efeito desse movimento sobre a redução da pobreza no Brasil foi maior do que em nações vizinhas como Chile (31%) e Peru (28%).
Já as políticas para a redistribuição de renda, como o Bolsa Família, explicaram 33% da diminuição na parcela de pobres na população brasileira na chamada “década de ouro”. Apenas 13% do movimento de redução da pobreza no Brasil se deveu a mudanças estruturais – e, portanto, mais sustentáveis – na composição da renda per capita.
Essa análise ajuda a explicar a reversão na tendência de queda da pobreza no Brasil após a eclosão da recessão de 2014.
O Banco Mundial afirma que, como o Brasil abriga um terço da população da América Latina, os movimentos do indicador no país têm forte peso sobre o da região como um todo. A instituição ressalta que, excluindo o Brasil da amostra, em média, a pobreza caiu na América Latina após 2014.
No entanto, a mensagem principal do relatório é um alerta aos governantes da região de que uma análise acurada do progresso social deveria ser pautada muito mais em indicadores que mostrem a evolução do acesso da população a serviços básicos, como moradia, saneamento, educação e saúde, do que em dados da chamada pobreza monetária.
“A mensuração do sucesso na luta contra a pobreza usando indicadores sociais com muitos componentes cíclicos pode ser enganosa”, ressalta o documento.
Ao contrário do que ocorre com a pobreza expressa em fatias da população vivendo abaixo de certo patamar de renda e da taxa de desemprego, que variam muito de acordo com o ciclo econômico, indicadores da satisfação de necessidades básicas são mais estáveis, segundo o Banco Mundial.
O relatório menciona que a fatia de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza de US$ 5,5 aumentou três pontos percentuais entre 2014 e 2017, mas não entra em detalhes sobre os movimentos de indicadores sociais do Brasil e de outros países da região.
Uma consulta à base de dados do Banco Mundial revela, porém, que, no caso brasileiro, o indicador passou de 17,9% para 21% do total da população. No mesmo período, a fatia de brasileiros vivendo abaixo da linha de extrema pobreza saltou de 2,8% para 4,8%. (Folhapress)