O deputado federal David Miranda (PSOL-RJ) enviou à Procuradoria-Geral da República (PGR) uma representação contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por causa de discurso feito pelo mandatário durante a Assembleia-Geral da ONU nesta terça-feira (21).
O parlamentar afirma que Bolsonaro proferiu falas “revestidas de falsidades e ilegalidades” ao abordar temas como corrupção, meio ambiente, o chamado “tratamento precoce” e as manifestações bolsonaristas no 7 de Setembro.
“A fala do senhor presidente, quando diz que ‘estamos há 2 anos e 8 meses sem qualquer caso concreto de corrupção’, não se coaduna com a verdade dos fatos”, diz o deputado, que cita as suspeitas de corrupção envolvendo a vacina Covaxin e nomes do entorno de Bolsonaro que são investigados em outros casos.
“O desmatamento descontrolado nos biomas brasileiros, em especial na Amazônia, gera queimadas. E, sobre estas, os dados são alarmantes e desencontrados do discurso falacioso do ora representado [Bolsonaro]”, diz ainda na representação.
Miranda afirma que houve ofensa a princípios constitucionais e pede que sejam tomadas providências administrativas, civis e penais cabíveis contra o presidente.
O presidente Jair Bolsonaro usou o discurso de abertura da Assembleia-Geral da ONU para fazer um relato distorcido da situação do Brasil, em um aceno a sua base radical.
Havia a expectativa de que o líder brasileiro atendesse aos apelos da ala moderada do governo e fizesse um discurso de caráter mais diplomático e conciliador, o que não ocorreu. O tom de campanha prevaleceu, pontuado por dados falsos ou distorcidos —e por ataques à imprensa.
“Venho aqui mostrar um Brasil diferente daquilo publicado em jornais ou visto em televisões”, disse o presidente, já no início de sua fala.
A CPI da Covid, instalada há cinco meses, apura ações e omissões do governo federal na pandemia, além de repasses federais a estados e municípios. A equipe que trabalha na comissão já levantou momentos em que Jair Bolsonaro propagou um discurso negacionista que atrapalhou o combate à crise sanitária e que teria capacidade de reunir elementos para um processo de impeachment.
Há ainda o caso das “rachadinhas”, esquema em que era recolhida parte dos salários dos funcionários de gabinete no Legislativo. Inicialmente, a prática foi identificada no antigo gabinete do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Mais recentemente, porém, surgiram indícios de que o próprio Bolsonaro, quando deputado federal, tinha uma atuação concreta no esquema.
Na ONU, o presidente também afirmou que no dia 7 de setembro o Brasil teve a maior manifestação de sua história. Outras ocasiões, porém, como a campanha das Diretas Já (1984), os protestos de junho de 2013 e os atos pelo impeachment de Dilma Rousseff reuniram uma quantidade muito maior de manifestantes.
“O Brasil tem um presidente que acredita em Deus, respeita a Constituição, valoriza a família e deve lealdade a seu povo”, disse Bolsonaro em Nova York. “Isso é muito, é uma sólida base, se levarmos em conta que estávamos à beira do socialismo.”
Com esse tom, o presidente deixou evidente que seu discurso, apesar de proferido na reunião de mais de cem lideranças mundiais, tinha, na verdade, o objetivo de alcançar o público doméstico. (BN)