Apesar de serem maioria no eleitorado (53%), as mulheres estão à frente de apenas 4 dos 31 partidos políticos brasileiros.
De distintas correntes ideológicas, Gleisi Hoffmann (PT), Renata Abreu (Podemos), Heloísa Helena (Rede Sustentabilidade) e Suêd Haidar (PMB) relatam a necessidade de se impor em um universo predominantemente masculino.
Ainda que no comando dessas siglas, admitem dificuldades em conseguir ampliar a participação de outras mulheres na política e mesmo na estrutura partidária.
“A política espelha a nossa sociedade patriarcal, é um espaço dominado por homens brancos e, em consequência, predominantemente machista, na linguagem, nas práticas, até nos horários”, relata a paranaense Gleisi, 57. “É só ver os ataques que sofremos no Parlamento, nas redes sociais”, acrescenta.
Para a alagoana Heloísa Helena, 60, porta-voz nacional da Rede Sustentabilidade, há uma “cantilena machista impregnada até em algumas mulheres sobre a supremacia masculina nas instâncias de decisão e poder”.
Segundo ela, existe uma imensa desigualdade no acesso à dignidade humana para mulheres.
“Para uma mulher enfrentar a tripla jornada -família, trabalho, militância- sem estrutura financeira, sem equipamentos sociais, sem acesso à formação técnica e sem trabalho digno é missão considerada impossível, mas milhares de mulheres desafiam seus ‘destinos’ e a tornam possível no cotidiano.”
Dirigente de um partido recriado pelo tio (o PTN, hoje Podemos), a paulistana Renata Abreu, 40, também cita a dificuldade de lidar com a distância dos três filhos.
“Não é fácil quando você vem para Brasília, teu filho te abraça e fala: ‘Mamãe, não vai’. Toda semana eu ouço isso. E você tem que fazer ele dormir muitas vezes no FaceTime. Ele me liga: ‘Me bota’ para dormir?’ E eu ligo o FaceTime aqui, fazendo reunião, boto só para ele ficar me olhando e dormindo.”
A maranhense Suêd Haidar, 64, fundadora do Partido da Mulher Brasileira, diz que a participação feminina na política não é apenas uma questão de justiça social e igualdade de gênero, mas também de efetividade democrática.
“Quando as mulheres têm voz e poder na política, as decisões são mais representativas e levam em conta a diversidade e as necessidades da população como um todo.”
Apesar do nome, o PMB retratou, ao longo de sua história, uma realidade comum a outras legendas: é composto majoritariamente por homens. Em 2015, dos 20 integrantes, 18 eram homens -hoje, o partido não está representado no Congresso.
Hoje no Ministério da Ciência e Tecnologia, a pernambucana Luciana Santos, 57, é presidente licenciada do PC do B.
Ela diz que os entraves vão “desde os contextos culturais e socioeconômicos que permeiam a construção da nossa sociedade e pautam o nosso desenho institucional até uma dinâmica de proteção dos centros de poder.”
Segundo maior partido da Câmara com 68 deputados, o PT só tem 18 mulheres em sua atual bancada –entre elas Gleisi. No Podemos, dos 16 integrantes, só há duas parlamentares: Renata e Nely Aquino (MG).
No PC do B, a situação é mais equilibrada: são 4 homens e 3 mulheres. Na Rede, só o deputado Túlio Gadêlha (PE) representa o partido na Câmara –Marina Silva (SP) se licenciou para assumir o Ministério do Meio Ambiente.
DESAFIOS
Renata Abreu (Podemos): “O grande desafio da mulher na política é o emocional. A gente é muito explosiva, a gente fala o que pensa. E na política você tem que ter estratégia. Você tem que engolir sapo. O problema da mulher é que a gente não engole sapo. E na articulação você precisa engolir crocodilos”.
Suêd Haidar (PMB) : “Eu vim acompanhando anos e anos as nossas mulheres sendo usadas como laranja, sendo trapaceadas, abusadas, oprimidas e vítimas de diversos preconceitos. Encontrei muitos desafios nesse cenário político masculinizado e perverso. Tive que lidar com o sexismo e o preconceito que muitas vezes são dirigidos às mulheres na política”.
COTAS
Gleisi Hoffmann (PT): “No Congresso, apresentei emenda para aumentar essa cota para 50%. Afinal, nós mulheres somos mais de 50% da população brasileira e do eleitorado (…) O ideal seria termos paridade nas cadeiras dos legislativos, obrigando os partidos a investirem seriamente nas candidaturas femininas”.
Heloísa Helena (Rede): “Não há lógica para explicar a repetição da maioria masculina [em cargos públicos], como se apenas eles tivessem atributos para ocupação desses espaços (…) Importante também deixar claro o quanto dessa visibilidade social de mulheres nas instâncias de decisão e espaços de poder auxiliam na mudança de paradigmas, pois a presença delas já sinaliza para meninas e meninos como se divide o poder e se partilha o comando das ações”.
POLÍTICAS DE INCENTIVO
Luciana Santos (PC do B): “Além de uma dinâmica interna e cotidiana que privilegia e incentiva a participação das mulheres no cotidiano, nas eleições procuramos ultrapassar a cota estabelecida pela legislação eleitoral. Nossas candidatas têm acompanhamento e apoio específico por parte da Secretaria de Mulheres e, entre outras ações, realizamos cursos e seminários de formação, prestação de contas, comunicação para garantir apoio em todas as áreas que identificamos como mais difíceis para as campanhas delas”.
Gleisi Hoffmann (PT): “O PT foi pioneiro, em 1991, ao instituir cota de 30% para a participação das mulheres em cargos de direção. Depois, em 2017, aprovamos uma resolução no estatuto para haver paridade entre mulheres e homens nos cargos. Na Secretaria de Mulheres do PT adotamos várias medidas internas para estimular a participação das mulheres na política, como o Programa Elas por Elas, que cuida da formação das nossas militantes”.
REPRESENTATIVIDADE NOS PARTIDOS
Heloísa Helena (Rede): “No caso da Rede, em todos os estados temos dois porta-vozes, sendo uma mulher e um homem, de preferência possibilitando encontro intergeracional. Mas não quer dizer que seja sempre consenso progressivo, pois não estamos imunes ao que é impregnado nas pessoas. Temos muitos conflitos e também a necessária e dura reação para impedir que esse ridículo comportamento se fortaleça”.
Luciana Santos (PC do B): “Atualmente, temos quatro estados em que o partido é presidido por mulheres: Paraíba, com Gregória Benário; Amapá, com nossa ex-deputada Marcivânia Flexa; Roraima, com a Tatiane Cassiano; e Mato Grosso do Sul, com a Iara Gutierrez. Mas ter mulheres na presidência do partido não é uma novidade para o PC do B”.
FUNDO ELEITORAL
Renata Abreu (Podemos): “Esse também é um desafio. Toda a distribuição de fundo nos partidos leva em conta também o potencial eleitoral e histórico de voto. Esse é o desafio de todas. E o que acontece, você tem um resultado a entregar, tem uma cláusula de barreira a cumprir. Então você precisa também ter pragmatismo na distribuição de fundo”.
Suêd Haidar (PMB): “Falta financiamento adequado para as campanhas. As mulheres muitas vezes enfrentam dificuldade para obter financiamento para suas campanhas eleitorais e isso limita suas chances de eleição”. (BN)