Que o universo PET cresce e se especializa cada vez mais, não é novidade nem mesmo para pessoas que, como eu, não possuem nenhuma companhia animal no ambiente doméstico. No entanto, projetar a possibilidade de aplicação de piercings e tatuagens em cachorros e gatos, por exemplo, é de causar imediatamente reação de espanto, parece fugir do pensamento lógico. Por sorte, a prática não é comum no Brasil e, muitos menos, na Bahia.
Apesar de remontar para uma realidade distante, já que ocorrências do tipo vêm sendo registradas em países europeus, segundo o presidente da Associação de Tatuadores e Perfuradores do Brasil, Ronaldo Sampaio, foi protocolado na Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA), na terça-feira (6), o Projeto de Lei N° 24.146/2021. A divulgação consta na edição do Diário Oficial do Legislativo, publicado nesta quinta-feira (8).
A proposta, de autoria do deputado estadual Capitão Alden (PSL), prevê a proibição “de tatuagens em animais com fins estéticos no Estado da Bahia e dá outras providências”. O texto prevê a “perda da guarda do animal e proibição de obter guarda de outros animais pelo prazo de 5 (cinco) anos, além de multa correspondente a R$ 5 mil” para o dono do animal que for submetido a tais práticas. Em caso de reincidência o valor da multa poderá dobrar de valor.
No caso do executor da intervenção, o dispositivo prevê multa pecuniária de R$ 5 mil, assim como a “cassação da eficácia da inscrição no cadastro de contribuintes do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS)”.
A Bahia, no entanto, não está sozinha neste tipo de proposição. No último dia 3 de abril, os deputados estaduais do Rio de Janeiro aprovaram uma medida semelhante. De igual forma, o Distrito Federal aprovou a proibição da prática no dia 30 de março. No Mato Grosso do Sul, como divulgado nesta quinta-feira pela imprensa local, um texto semelhante foi protocolado na Assembleia Legislativa daquele estado. Também tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 4206/20, de autoria do deputado Fred Costa (Patriota-MG). No geral, as justificativas se baseiam na impossibilidade do animal de “escolher” passar pela dor associadas aos procedimentos invasivos.
Na justificativa, Fred aponta que “tatuagem parece ser uma tendência para pets, segundo a imprensa americana, mas não enxerga outra razão no ato a não ser satisfazer as preferências estéticas dos donos de animais”. “Além da dor, os animais tatuados são expostos a outras complicações, como reações alérgicas à tinta e ao material utilizado no procedimento, infecções, cicatrizes, queimaduras e irritações crônicas”.
Em conversa com o Bahia Notícias, Alden também citou as reações alérgicas nos animais como um dos fatores que motivou a submissão de uma versão baiana do texto. Ele relata ter recebido pessoalmente reclamações e apelos de associações de proteção aos animais e veterinários com atuação no estado. Ambos teriam relatado a recepção de ocorrências concretas.
Em contato com a reportagem, a assessoria da Secretaria Municipal de Saúde afirmou jamais ter recebido qualquer tipo de denúncia relativa à feitura de tatuagens ou outros procedimentos invasivos em animais domésticos. Responsável pela fiscalização de locais destinados à realização dos procedimentos em humanos, a Vigilância Sanitária de Salvador também desconhece qualquer tipo de denúncia ou relato sobre a prática em animais.
À frente da Associação de Tatuadores desde 2016, Ronaldo Sampaio é taxativo ao afirmar que é absolutamente condenável imaginar esse “desvio” da atividade profissional. “No final do ano 2000 tivemos relatos de que um tatuador, aqui em São Paulo, fazia tatuagem e piercing em animais e imediatamente acionamos a defesa animal. Somente esse caso. Pelo que a gente acompanha, a gente vê essa prática mais na Europa”, conta. Ele trabalha na área há 24 anos.
“A presente proposta visa tutelar os animais com o objetivo de proibir a realização de tatuagens para fins estéticos em animais no Estado da Bahia e afastar a ideia utilitarista dos animais, tendo em vista a necessidade de tratarmos como seres sencientes, que sentem dor, emoção, e que se diferem do ser humano apenas nos critérios de racionalidade e comunicação verbal”, diz Alden ao justificar a proposição.
E segue: “Além do sofrimento causado pela dor na realização de tatuagens, os animais tatuados são expostos a diversas outras complicações, como reações alérgicas à tinta e ao material utilizado no procedimento, infecções, cicatrizes, queimaduras e irritações crônica, podendo, em alguns casos, levar o animal à morte”.
“Na minha rotina e na das pessoas que conheço, isso não é comum. Posso até ouvir outros profissionais, mas acredito que não é comum. Eu nunca tive acesso a relatos e sei que assusta boa parte da população. É algo que tem cunho meramente estético e busca satisfazer ao dono do animal”, avalia o médico veterinário e membro da Comissão de Bem Estar Animal do Conselho regional de Medicina Veterinária do Estado da Bahia (CRMV), Marcos Borges.
Para ele, mesmo não fazendo parte do cenário convencional no rol de procedimentos dedicados aos animais, a proposta de lei pode ser benéfica para prevenir, deixar transparente possíveis punições antes mesmo que passem a acontecer.
Do ponto de vista clínico, Borges alerta para a possibilidade de reações adversas, já que a fisiologia animal, neste caso da pele, menos resistente que a humana, não é formatada para receber qualquer tipo de intervenção.
Diferente do humano, como destaca Borges, uma imagem desenhada em um animal doméstico pode chegar a cobrir a quase totalidade do corpo do bicho.
CURIOSIDADE
Em 30 de abril de 2013, uma publicação do Portal Terra citou a “tatuagem de cachorro” como uma nova moda do mundo pet norte-americano. De acordo com a publicação, no enanto, não era necessariamente a introdução de pigmentos na pele animal por meio do microagulhamento, tal qual as tatuagens fixas dos humanos. Tratava-se do uso de tinta com pequenos cristais, aplicada sobre os pelos do animal. As tattoos eram, na verdade, uma pintura feita com uma tinta brilhante que formavam desenhos de flores, borboletas, corações e formas variadas sobre o pelo dos cães e que não causavam reações do ponto de vista da saúde ou dor.