“Ser mulher intersexo não me privou de direitos, mas ser mãe de um bebê intersexo, sim”, revela educadora

Fundadora da ABRAI, Thais compartilha sua jornada de descobertas e desafios como mãe de uma criança intersexo e ativista dos direitos intersexos.

Foto: Reprodução: Instagram/thaisemiliasantos

Thais Emilia de Campo dos Santos, 46 anos, psicopedagoga e fundadora da Associação Brasileira Intersexo (ABRAI), descobriu sua condição *intersexo na adolescência, após sentir-se mal durante um treino de atletismo. Apesar de nunca ter sido identificada como tal até o nascimento de seu filho, Jacob, sua trajetória tomou um novo rumo com a maternidade.

“Eu descobri que tinha alterações gonadais e comecei a tomar hormônio feminino. Fui proibida de continuar treinando”, relata Thais, em uma entrevista especial ao Terra NÓS, para o Dia da Visibilidade Intersexo, celebrado neste sábado, 26.

Desafios da Maternidade Intersexo

Após enfrentar dificuldades para engravidar e já ter dois filhos, Thais deu à luz Jacob, uma criança *intersexo, em 2016. Com o nascimento, surgiram novos desafios: o hospital não emitiu a Declaração de Nascido Vivo (DNV) de Jacob devido à ausência de uma definição binária de sexo. Os médicos sugeriram uma cirurgia para atribuição de gênero, mas Thais se opôs. “Ver seu filho tendo todos os seus direitos violados é bem complicado. Foram muitas violências”, desabafa.

Jacob enfrentou sérias dificuldades, incluindo a falta de acesso ao SUS e à licença-maternidade para Thais. “Ele não teve direito a um nome, e eu, como mãe, não pude usufruir de direitos básicos”, lembra. A condição de Thais é hormonal, enquanto Jacob nasceu com microcefalia e cardiopatia, e faleceu aos 18 meses devido a complicações.

Ativismo e Luta por Direitos

A experiência como mãe de Jacob catalisou o ativismo de Thais. “A maternidade intersexo me mobilizou para a luta pelos direitos das pessoas intersexo”, afirma. Desde 2018, Thais e outros ativistas iniciaram a regulamentação da ABRAI, que foi oficializada em 2020. No entanto, sua militância não veio sem desafios; ela enfrenta ameaças e ataques misóginos nas redes sociais.

A ABRAI tem promovido a conscientização sobre a condição intersexo, colaborando com produções de mídia, como a novela “Renascer”, que apresentou um bebê intersexo. “Foi uma militância para garantir a visibilidade dessa realidade”, explica Thais.

A Necessidade de Reformas

Thais destaca que a legislação atual é insuficiente para atender às necessidades das pessoas intersexo. “Quando nasce um bebê intersexo, ele tem direito à certidão de nascimento, mas não ao CPF. Isso impede acesso a serviços essenciais”, critica.

A ABRAI está trabalhando no Estatuto da Pessoa *Intersexo, visando garantir direitos em áreas como educação e saúde. “Precisamos acolher a diferença e esperar o tempo da criança para entender como ela percebe seu corpo”, reflete Thais, enfatizando a importância de um acompanhamento médico humanizado.

Thais Emilia continua sua luta, determinada a garantir um futuro melhor para todas as pessoas intersexo, promovendo visibilidade, direitos e dignidade.

*Intersexo é um termo que se refere a pessoas que nascem com características sexuais que não se enquadram nas normas médicas e sociais de corpos masculinos ou femininos. 

Algumas características que podem ser encontradas em pessoas intersexo são: Genitais ambíguos, Cromossomos atípicos, Produção hormonal fora do padrão, Possuir simultaneamente cromossomos XX (mulher) e XY (homem). 
google news