Uma investigação sigilosa da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), entidade responsável por analisar e aprovar os estudos científicos no Brasil, constatou uma série de irregularidades no ensaio clínico que aplicou proxalutamida em pacientes com Covid-19 no Amazonas. O remédio foi utilizado em Manaus, entre 2 de fevereiro e 22 de março, e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) chegou a chamar a substância de “nova cloroquina”.
Com isso, segundo o blog de Malu Gaspar, no jornal O Globo, um relatório com os resultados da apuração deve ser enviado ao Ministério Público, à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e ao Conselho Federal de Medicina (CFM) para pedir a abertura de um inquérito para investigar suspeitas de fraude e falhas graves.
Mas, antes, a comissão deu aos organizadores do estudo uma oportunidade de fornecer informações que justificassem as falhas detectadas e esclarecessem as suspeitas dos conselheiros. No entanto, o prazo limite até o último dia 31 não foi atendido. O conselho, então, deu um novo prazo até a próxima semana.
O ESTUDO
De acordo com a publicação, quando o estudo foi apresentado, as informações divulgadas despertaram suspeitas de fraudes e falhas graves em especialistas, a exemplo da morte de um número alto de voluntários, que deveria ter levado à suspensão da pesquisa e não levou. Ao analisar o caso, o Conep identificou que todas as premissas do protocolo submetido ao conselho foram descumpridas.
O grupo de pesquisadores, liderado pelo médico Flávio Cadegiani, registrou o estudo como se ele fosse realizado em hospitais de Brasília, mas ele se procedeu em Manaus e outras cidades do Amazonas. Outra mudança em relação ao planejamento e a prática foi que o protocolo previa testar a proxalutamida em menos de 300 pacientes com Covid-19 moderada, mas os autores a aplicaram em 615 pacientes graves. Além disso, só quando submeteram os dados finais à comissão, em maio, os autores informaram a ocorrência de “mais de 200 óbitos”.
“A impressão que a gente tem é a de que eles nem sabem quantos morreram” (…) “Parece que perderam absolutamente o controle da situação”, disse um dos envolvidos na apuração. Os pesquisadores disseram à comissão que a alta taxa de mortalidade é decorrente do momento do estudo, que foi concomitante ao colapso no sistema de saúde de Manaus. (BN)